O homem que subiu ao palco de um evento em Nova Iorque e esfaqueou o escritor Salman Rushdie foi formalmente acusado de tentativa de homicídio em segundo grau e de agressão em segundo grau contra o autor de “Versículos Satânicos”, apesar de se ter dado como inocente. A informação foi confirmada este sábado em comunicado pelo procurador-geral do condado de Chautauqua, Jason Schmidt. Hadi Matar, de 24 anos, não pode sair sob fiança.

O jovem americano de origem libanesa foi presente a um juiz do Estado de Nova Iorque, perante o qual se declarou “inocente” de “tentativa de homicídio” do escritor. Salman Rushdie permanece hospitalizado em estado grave, mas já não está ligado a um ventilador e no sábado à noite já foi capaz de dizer algumas palavras. Salman Rushdie foi hospitalizado na sexta-feira em Erie, Pensilvânia, localidade situada na margem do lago que separa os Estados Unidos do Canadá.

Numa audiência processual no tribunal de Chautauqua, Hadi Matar, 24 anos, acusado de “tentativa de homicídio e agressão”, compareceu com roupa de preso às riscas pretas e brancas, algemado e mascarado, e não disse uma palavra, de acordo com o jornal New York Times e fotografias da imprensa local.

Segundo a acusação, o ataque ocorrido na sexta-feira num centro cultural em Chautauqua, onde o escritor britânico iria dar uma palestra, foi premeditado. O intelectual de 75 anos foi atacado no palco e apunhalado pelo menos dez vezes no pescoço e abdómen. O suspeito, que vive em Nova Jersey, declarou-se “inocente” através do seu advogado e irá comparecer novamente em tribunal em 19 de agosto.

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Salman Rushdie foi esfaqueado entre 10 e 15 vezes momentos antes de iniciar uma intervenção num discurso em Nova Iorque. Um homem subiu ao palco da Instituição Chautauqua — que no verão organiza tertúlias literárias — às 10h47 locais locais (eram 15h47 em Portugal Continental) e atacou Salman Rushdie com recurso a uma arma branca. Um dos golpes atingiu o escritor no pescoço.

O moderador que ia conversar com o escritor também foi atacado. Henry Reese, que detém uma organização que presta apoio na obtenção de exílio para escritores perseguidos, sofreu ferimentos na cabeça, foi encaminhado para o hospital, mas recebeu alta poucas horas depois.

“Que idiota apunhala um escritor?”. As reações ao ataque a Salman Rushdie

Ainda não há confirmação sobre quais foram as motivações do atacante. Enquanto o escritor era acudido, um polícia de plantão imobilizou o atacante, que foi imediatamente detido e retirado do anfiteatro. As imagens captadas logo depois do ataque mostram Salman Rushdie deitado no palco onde iria discursar, com as pernas a serem erguidas por um dos presentes, e com um grupo de pessoas em seu redor a estancar as feridas.

Salman Rushdie é autor de obras como “Grimus”, em 1975, “Os Filhos da Meia Noite” — que lhe valeu o Booker Prize, em 1981, o Booker of Books, em 1993, e o Best of the Booker, em 2008 — e “Versículos Satânicos” (1988), com que ganhou maior popularidade. O livro foi considerado uma afronta “contra o Islão, o Profeta e o Alcorão” pelas autoridades iranianas.

A 14 de fevereiro de 1989, Salman Rushdie soube pela comunicação social que tinha sido condenado à morte pelo aiatolá Khomeni. Desde então que vive na clandestinidade, mudando regularmente de país. O conteúdo dos seus livros têm-lhe valido várias ameaças de morte ao longo da carreira. Salman Rushdie tem origem muçulmana indiana (nasceu em Mumbai) e tem nacionalidade britânica.

Um ano depois de “Versículos Satânicos” ter sido considerado um livro “blasfemo” no Irão, que o baniu em 1988, o aiatolá Ruhollah Khomeini emitiu uma fátua a apelar à morte de Salman Rushdie. Quem tirasse a vida ao escritor receberia uma recompensa de quase 3,2 milhões de euros — um valor que foi atualizado em 2012 em relação aos 2,7 milhões que se praticavam até essa altura.

Em 1991, o tradutor japonês de “Versículos Satânicos” foi esfaqueado até à morte por causa desta fátua, que se estende a todos os que trabalhavam com Salman Rushdie neste livro. O tradutor italiano e o editor norueguês da obra também chegaram a ser atacados, mas sobreviveram.

Salman Rushdie tem uma visita agendada à Livraria Lello, no Porto, a 17 de setembro para conversar com a jornalista Isabel Lucas.