Madonna, Geena Davis, Rosie O’Donnell, Lori Petty, Tom Hanks e Bill Pullman são algumas das caras que recordamos de “Liga das Mulheres” (1992), a maravilhosa comédia – e não só – de Penny Marshall em volta de uma liga de basebol feminina durante a Segunda Guerra Mundial. Trinta anos passaram e volta-se a falar do filme, um dos raros casos em que desporto e cinema combinam muito bem, a propósito de uma das melhores séries deste verão, “A League Of Their Own”. Oito episódios que estrearam há dias na Prime Video — e, de certeza, virão muitos mais no futuro. Will Graham e Abbi Jacobson, responsáveis por esta nova adaptação, construíram uma base sólida na primeira temporada.

O sentimento de urgência da série sente-se logo a partir da primeira cena, quando se vê a personagem de Abbi, Carson Shaw, a correr desenfreadamente para apanhar um comboio para Chicago. Tal como no filme – e na vida real –, a história é da equipa Rockford Peaches, do estado de Illinois. A série arranca em 1943, o ano da formação desta liga de basebol feminina que serviu para estancar os problemas do desporto no masculino.

Em tempos de guerra – e pós-guerra –, concretamente entre 1943-1954, existiu a All-American Girls Professional Baseball League, uma liga de basebol composta por mulheres que serviu para estancar a ausência de homens – porque foram para a guerra – e manter as audiências interessadas. Nos melhores anos conseguiram ter mais de 900 mil espectadores numa época inteira. E, no período em que existiu, houve uma equipa que dominou. Não custa adivinhar qual, claro, Rockford Peaches.

[O trailer oficial de “A League of Their Own”]

Carson Shaw está a correr, portanto. Pensamos que é para apanhar o comboio, para ir jogar basebol. Há quem lhe diga que ela tem um talento sobrenatural – e tem –, mas percebemos mais à frente no primeiro episódio que ela está também a fugir da sua vida, da vida com o marido, que em breve voltará da guerra. Numa fuga para a frente, Carson vê a oportunidade de mudar de vida, de ser alguém, de não ser apenas uma mulher em casa à espera do seu marido. Vê uma oportunidade de ser ela própria. É nesta toada de afirmação, de personalidade, de existir, que a série acontece. “A League Of Their Own” não é só uma comédia de um retrato muito específico.

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Tal como “Glow”, a série injustamente cancelada na Netflix sobre uma liga de wrestling feminino criada nos 1980s (GLOW é acrónimo de Gorgeous Ladies of Wrestling), o retrato não é apenas de época. “Glow” pegava no tema e dava-lhe um jeito de emancipação feminina, com um retrato da misoginia da época bem defendido à época que foi transmitido. “A League Of Their Own” continua esse legado e, tal como a série da Netflix, não se concentra apenas no feminino, mas também nas questões raciais e sexuais. Ou seja, é uma série completamente do seu tempo.

Regresso à corrida de Carson Shaw. Se conhece Abbi Jacobson de “Broad City”, torna-se intuitiva a perceção de que ela está a interpretar a mesma personagem num local e épocas diferentes. Se à primeira isso parece uma limitação da atriz, rapidamente faz todo o sentido, à medida que ela começa a confraternizar com outras personagens e a existir no contexto de “A League Of Their Own”. Quando a conhecemos, está a fugir da vida que tem e, enquanto o faz, é julgada – numa caricata cena em que uma vizinha a vê com o soutien à mostra. Foge para um lugar desconhecido, com a promessa de ir aos treinos de captação para uma equipa de basebol feminino. Pode resultar, pode dar para o torto. Sente-se essa pressão e sente-se que está sozinha. A partir do momento em que começa a interagir com outras personagens, percebemos que não é a única a fugir. E, a partir desse momento, deixa de estar tão sozinha.

© A League of Their Own

Eis o código do segredo do sucesso de “A League Of Their Own”, apresenta a maioria das suas personagens através dos treinos de captação e, a partir de momentos muito breves, diz-nos quase tudo o que precisamos de saber sobre as personagens. Não é tão simples quanto parece, mas nas entrelinhas – e isto é o que se percebe nos restantes episódios – está mais do que um grupo de mulheres que quer jogar basebol. É um grupo de mulheres que está a correr para a frente, para a frente do seu tempo, metendo o pé no aqui e agora e na mudança.

“A League Of Their Own” é emancipada sem jogar isso na cara. Tudo acontece no território da subtileza e com um conjunto de atrizes que o fazem de forma celebratória: além de Abbi, Chantè Adams, D’Arcy Carden, Roberta Colindrez e Kelly McCormack. E isto acontece sem nunca esquecer o divertimento/entretenimento, se tem boas memórias do filme original, vai adorar este upgrade, trinta anos depois. Se não o conhece, salte imediatamente para esta série, porque é daqueles raros momentos em que desporto e comédia funcionam perfeitamente, com o acrescido facto de que “A League Of Their Own” acontece com o presente a pulsar, mesmo que tudo acontece num mundo distante, de há oitenta anos. E, ao contrário de “Glow”, esta liga de basebol teve um peso histórico que vale a pena lembrar. Para ver de rajada e esperar ansiosamente pela segunda temporada.