Um homem acusado de ter levado 14 pessoas para explorações agrícolas em Espanha e de as ter escravizado começou esta quarta-feira a ser julgado, no Porto, tendo negado todas as acusações e defendido que “tudo era feito nos conformes“.

Segundo a acusação, o arguido, que garantiu não saber ler nem escrever, é acusado de, entre 2011 e 2016, ter levado para Espanha (para La Rioja e Léon), para trabalhar em explorações agrícolas, pelo menos 14 pessoas que terão ficado alojadas em armazéns, num curral ou numa pocilga, tendo-lhes sido fornecido alimentação “nutricionalmente pobre“.

Os trabalhadores foram ainda obrigados a trabalhar mais de 13 horas por dia e agredidos quando tentavam fugir.

A mulher e um dos filhos do casal estão também acusados dos mesmos crimes, 19 crimes de escravidão, mas o tribunal “não os conseguiu notificar“, pelo que não serão julgados ao mesmo tempo do que aquele arguido, disse à Lusa fonte judicial.

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A acusação refere ainda que aos trabalhadores eram impostas “grandes restrições à movimentação” e que “não lhes era permitindo entrar e sair do alojamento quando quisessem, ou mesmo regressar a Portugal se lhes apetecesse”.

Confrontado com aquelas acusações, o arguido negou: “É totalmente mentira. O acordado era receberem 30 euros por dia, mais alimentação, que era de qualidade. Trabalhavam no máximo oito horas por dia e eu dava-lhes três cervejas de manhã e mais três de tarde, além de vinho ao almoço e ao jantar”, disse.

O arguido explicou que “mal chegavam a Espanha iam à polícia para terem os papéis necessários para trabalhar” e que “tudo era feito nos conformes”.

Sobre a limitação de circulação imposta aos trabalhadores, o homem garantiu que estes “podiam ir aonde quisessem e até iam todos os dias ao café beber um bagaço ou dois“, com dinheiro dado por si.

Questionado sobre a alimentação, que segundo a acusação era constituída por “arroz, massa e batatas cozidas, com ossos de frango e rabos ou barbatanas de bacalhau”, o arguido afirmou que “nunca lhes deu barbatanas de bacalhau” e que comprava “caixas de carne e peixe”, alimentos a que os trabalhadores “tinham fácil acesso”.

À acusação de que escolhia pessoas fragilizadas “pela sua situação pessoal, por debilidade intelectual, dependência, falta de retaguarda familiar ou carência económica”, para as poder sujeitar a trabalho escravo, o arguido respondeu ser mentira.

Não, isso é totalmente mentira. Não se notava nada“, disse, reconhecendo, porém, que algumas das pessoas apontadas como vítimas “gostavam de um copito e embebedavam-se”.

O arguido negou também ter ficado a dever dinheiro aos trabalhadores, explicando que “pagava sempre no final da campanha [vindimas ou poda] e que acertava o que adiantava”, para cervejas e tabaco, sendo que reconheceu que cobrava cinco euros pelos maços de tabaco, que custavam 4.95 euros, “para arredondar e não para ganhar dinheiro”.

Perante as acusações de agredir as vítimas para as impedir de fugir, o homem voltou a negar, garantindo que “nunca, nunca” fez “tal coisa”.

A sessão continua à tarde com o início da audição das testemunhas.