O presidente do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição), Rui Semedo, classificou esta terça-feira como “desastrosa” e “insustentável” a situação dos transportes aéreos e marítimos no arquipélago, criticando o “silêncio” do governo sobre o tema.

A situação é de tal gravidade que, pela primeira vez em Cabo Verde, ao longo da sua história de país independente, se anunciou o cancelamento de todos os voos por falta de aparelhos para garantir as operações. Foi um verdadeiro blackout de transporte aéreo”, afirmou Rui Semedo.

O dirigente partidário referia-se à situação da avaria das duas aeronaves com que a companhia BestFly opera as ligações aéreas no arquipélago, ocorrida no fim de semana, apesar de o movimento de passageiros (aéreo) já se ter aproximado nos últimos meses dos valores anteriores à pandemia de Covid-19.

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Em conferência de imprensa realizada na Praia, para fazer o balanço da reunião da comissão política do PAICV, o presidente do partido explicou que o tema dos transportes foi alvo de análise, tendo em conta “a crise” nas ligações aéreas e marítimas (que também foram afetadas em julho por avarias de navios, tendo registado em agosto um movimento recorde superior a 180 mil passageiros), classificando a situação como “insustentável”, com “grandes prejuízos para os passageiros e para qualquer cabo-verdiano que queira realizar o direito de se deslocar de uma ilha para outra”.

Já nem mesmo os pilotos, que são normalmente muito tolerantes, suportam o desgoverno do setor dos transportes aéreos, com impactos altamente penalizadores na sua vida pessoal, profissional e familiar e lançaram um ultimato ao governo, exigindo medidas urgentes para um tratamento digno, sério e responsável e para uma gestão profissional e competente”, acusou Rui Semedo.

Acrescentou que a “situação é tão desastrosa que não se entende o silêncio do primeiro-ministro e do vice-primeiro-ministro”, que acusa de terem “procurado fugir desta temática desconfortável para se refugiarem em anúncios, novas promessas e algumas vezes em poemas e divagações”.

A comissão política deliberou, por isso, no sentido de exigir do governo todas as informações necessárias sobre a real situação e a tomada de medidas consentâneas com a importância do setor dos transportes para a vida das pessoas e para a economia deste país”, disse Rui Semedo.

Segundo o presidente do partido, o órgão máximo entre congressos também “passou em revista a situação da segurança” em Cabo Verde e “chama atenção ao governo pelo caos que se vive nos bairros e pela intensificação de assaltos“.

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“Que atormentam as pessoas de bem que correm cada vez mais riscos de serem assaltadas até dentro das suas próprias casas. Não vale a pena continuar a insistir que a situação é boa enquanto todos os dias se aumentam as situações de agressões e casso bodes (assalto armado na via pública) que tendem a banalizar-se e a aumentar o sentimento de medo e de impotência perante a criminalidade”, acusou, reclamando “medidas urgentes” para “restituir aos cidadãos o direito de se circularem livremente”.

A comissão política do maior partido da oposição analisou igualmente os impactos da crise que o país atravessa “na vida das pessoas e famílias”, tendo exortado “mais uma vez” o Governo “a tomar medias para socorrer todos aqueles que passam por níveis extremos de dificuldades”.

A comissão política estranha o facto de o governo ter anunciado a abertura das frentes de trabalho e, ao mesmo tempo, não ter feito nenhuma diligência para a materialização na prática dessa medida, deixando as pessoas a sofrerem até ao limite das suas capacidades”, apontou.

A estrutura partidária “lembra ao governo que governar é, antes de mais, servir as pessoas e que, por isso, o executivo deve passar de anúncios fantasiosos e trabalhar, de facto, para dar respostas às necessidades das pessoas, das famílias e das empresas”, concluiu Rui Semedo.

O arquipélago enfrenta uma profunda crise económica e financeira, decorrente da forte quebra na procura turística — setor que garante 25% do Produto Interno Bruto (PIB) do arquipélago — desde março de 2020, devido à pandemia de Covid-19.

Em 2020, registou uma recessão económica histórica, equivalente a 14,8% do PIB, seguindo-se um crescimento de 7% em 2021 impulsionado pela retoma da procura turística.

Para 2022, devido às consequências económicas da guerra na Ucrânia, nomeadamente a escalada de preços, o governo cabo-verdiano baixou a previsão de crescimento de 6% para 4%.