Andrés Vicente, CEO da Ericsson Ibéria, esteve em Portugal para um evento da companhia, que teve como objetivo demonstrar o potencial do 5G, a quinta geração de redes móveis, e alguns estudos de caso sobre o que pode fazer. Da indústria à logística, sem esquecer o entretenimento, o responsável da empresa de equipamentos para infraestrutura de rede sublinha que Portugal não pode correr o risco de ficar para trás no 5G.

“Portugal é parte da Europa e a Europa está a ficar para trás em relação ao resto do mundo na implementação do 5G. A Europa está bastante atrasada”, diz, em conversa com o Observador. “A Europa está atrasada devido a muitas razões, a principal é que está fragmentada do ponto de vista da regulação”, contextualiza. Além disso, o facto de haver um elevado número de operadores de telecomunicações no Velho Continente, especialmente em comparação com mercados como Estados Unidos ou a China, também dificultam o processo, defende este responsável.

“Isso significa que o investimento está bastante fragmentado na Europa e o retorno de capital das operadoras de telecomunicações é muito mais baixo do que noutras áreas. Isso é um ponto-chave e acho que é intrínseco ao modelo de negócio e à regulação na Europa”, explica Andrés Vicente. E puxa dos números para referir os níveis mais elevados de implementação do 5G noutros mercados: enquanto a União Europeia e o Reino Unido têm níveis de implementação de 20%, os EUA contam com 65% da população coberta por 5G, enquanto na Austrália os números são também mais elevados, na ordem de 75%. E, neste último caso, Andrés Vicente realça que nem é “um país com longa história de tecnologia”.

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Em Portugal, o atraso surge “provavelmente porque o leilão do 5G se prolongou e agora se tenta acompanhar a implementação [de outros países].” “Mas a realidade é que a infraestrutura que vai ser possível e os casos de uso vão mudar o mundo e a economia. Isso é necessário e estamos atrasados. É essa a resposta direta.”

“O 5G devia estar mais alto na agenda política”

Andrés Vicente diz que o “Governo tem de reavaliar a relevância do 5G.” “No perfil do país, o 5G devia estar mais alto na agenda política”, vinca o responsável da Ericsson. “Está a ser posto num patamar mais elevado noutras economias que vão competir com Portugal — e isso é relevante. E estar mais alto [na lista de prioridades] quer dizer que é preciso fazer ainda mais coisas”, alerta.

A Ericsson estima que o 5G pode ter um impacto significativo no PIB português. “O impacto que a Ericsson — mas também a maioria dos analistas — calcula para o 5G em Portugal no PIB é de mais de 10%, daqui até 2030. Se se implementar de forma eficaz, a economia pode crescer 10%. Caso isso não aconteça, então perde-se a posição de competitividade contra outras economias que vão tentar a implementação. E isso é relevante. Temos de ter esse sentido de urgência e dizer ‘isto vai mudar o mundo, vai mudar a forma como se é apelativo para o mundo ou não’”.

Numa altura em que a Europa se vê a braços com uma guerra, o responsável da Ericsson em Portugal e Espanha destaca que há “realidades diferentes” na forma como as empresas estão a olhar para os investimentos no 5G – mas que há uma compreensão do potencial desta tecnologia. “Quando se fala de segmentos como grandes empresas — elas já sabem que isto vai mudar o mundo, já estão a implementar [o 5G].”

“E essas empresas vão investir sozinhas, têm o financiamento para o fazer, percebem os benefícios do aumento incremental da produtividade e que têm de investir para alavancar a inovação.” “Mas há outra realidade, que é comum à Europa — não só em Portugal mas também Espanha e Grécia, que é o facto de a maioria das empresas serem de média dimensão. E essas vão precisar de ajuda”, adianta.

“Acho que vamos ter de dar o primeiro passo” e “alocar algum financiamento para promover a evolução digital que é precisa, porque é o papel da administração pública que quando se está em diferentes ciclos é preciso estimular a economia”, diz Andrés Vicente. “A única coisa que quero sublinhar é que esta não é uma tecnologia como as anteriores — é uma tecnologia transformadora. Não é evolução, é transformação.

A empresa de equipamentos de telecomunicações tem projetos com as três operadoras portuguesas. Andrés Vicente diz que a relação com os operadores é “muito boa”. “São todos nossos clientes, com serviços diferentes”, explica. “Temos uma longa parceria com todos eles e acho que estamos muito habituados a trabalhar uns com os outros.” Mas também tem “muita consciência dos desafios que têm pela frente.”

Eles têm sido muito vocais sobre isso: a inflação, a energia, a subida de preços, o contexto macroeconómico desfavorável ou novos concorrentes a chegar ao mercado. Mas são dinâmicas que são conhecidas nesta indústria e tenho bastante certeza de que vão encontrar uma forma de lidar com as obrigações para desenvolver a infraestrutura e que vão fazê-lo.”

E, aqui, diz que a Ericsson quer ter um papel, nomeadamente com iniciativas que demonstrem o potencial do 5G, “para mostrar os usos que ajudem a monetizar” a quinta geração de redes móveis. “O 5G é uma nova conectividade, algo diferente que vai permitir coisas novas. E para isso tem de haver um retorno do investimento”, garante.

“O 5G vai criar um tipo de conectividade diferente, uma conectividade que vai ter usos que nunca foram testados antes — carros conectados, voos autónomos de drones, indústria 4.0”, exemplifica. Mas, para isso acontecer, é preciso que haja “uma implementação real de cobertura”. “No final do dia, não é possível expandir de forma alargada. É uma infraestrutura que se não estiver pronta não é possível ver todos os benefícios e usos que estão associados.”

Alguns especialistas referem que, depois da implementação, existem algumas dúvidas sobre como é que os operadores podem monetizar o 5G. Andrés Vicente reconhece que, para as empresas, é “muito claro o retorno do investimento”. “Investem e ganham produtividade.” Já para os operadores, a questão poderá passar por ofertas mais personalizadas, à medida de cada perfil de consumidor. “Já há alguns segmentos que têm um caminho claro, como o gaming, por exemplo. A latência nos jogos é crítica”, refere o responsável da Ericsson Ibéria. “Os jogadores estão dispostos a pagar um pouco mais por isso. A outra grande coisa que vai surgir com o 5G é a economia do metaverso. É preciso uma latência super baixa para recriar a perceção real de imersão e quando uma pessoa se mexe é suposto ter o mesmo tipo de movimento que na vida real.”

Andrés Vicente acredita que os consumidores de determinados perfis “vão pagar um pouco mais por este valor” do 5G. “É uma abordagem de um para um no mercado, em vez de ser de um para muitos. Todos temos internet, isto já aconteceu com o 4G. Agora precisamos é de pôr o serviço certo à pessoa certa com o 5G”.

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