A Renamo, principal partido da oposição em Moçambique, e o MDM, terceiro partido, consideraram esta quinta-feira a exclusão e a partidarização do Estado uma ameaça à paz, assinalando que a reconciliação nacional continua uma “miragem”.

A paz que o Acordo Geral de Paz, assinado em 1992, simboliza “pode não estar garantida, enquanto os valores fundamentais que enformam o Estado de Direito Democrático não prevalecerem e não forem respeitados por todos”, afirmou Viana Magalhães, chefe da bancada da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) na Assembleia da República.

Magalhães falava durante o discurso de abertura das sessões plenárias do parlamento, que recomeçaram esta quinta-feira após a tradicional pausa.

Numa intervenção marcada pela alusão ao 30.º aniversário do Acordo Geral de Paz, celebrado no dia 4, o chefe da bancada parlamentar do principal partido da oposição acusou a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder, de colocar permanentemente a estabilidade política e social em perigo, através de uma alegada intolerância, exclusão, partidarização do Estado, fraudes eleitorais e violação dos direitos e liberdades fundamentais.

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“No Moçambique real, ser da oposição é assinar a sua própria sentença de exclusão e de morte, quem se atreve a ser da oposição tem de aceitar ser discriminado e ser privado da sua cidadania”, acusou Viana Magalhães.

Magalhães defendeu que a recusa do gozo dos direitos económicos e sociais às camadas da população não filiadas à Frelimo cria descontentamento e coloca os jovens numa situação de propensão para a violência armada.

Apontou o recrutamento de jovens por grupos extremistas na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique, como resultado da marginalização.

O chefe da bancada parlamentar da Renamo acusou a Frelimo de manipular os órgãos eleitorais para a prática de fraudes, visando a manutenção do poder e a recusa da alternância política.

A atual polémica sobre a escolha do novo diretor do Secretariado Técnico da Administração Eleitoral (STAE), prosseguiu Viana Magalhães, é exemplo de que os órgãos eleitorais são manietados pela Frelimo.

“Urdir fraude eleitoral” deve ser considerado algo que é “inimigo da paz”, observou.

Por outro lado, Viana Magalhães defendeu que o combate aos grupos armados no norte de Moçambique não deve ser feito apenas através da via militar, impondo-se o ataque às causas sociais e económicas por detrás da adesão de jovens aos grupos armados.

O líder da bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango, também considerou que a exclusão social, económica e política constitui uma ameaça à paz.

É um erro pensar que a paz é apenas o calar das armas. A paz pressupõe o bem-estar, a partilha das riquezas nacionais e uma democracia mais inclusiva e participativa”, declarou Simango.

A primazia à filiação partidária no acesso às oportunidades económicas e profissionais no Estado e no setor privado tornam a reconciliação nacional uma miragem, acrescentou.

O chefe parlamentar do MDM também abordou a violência no norte de Moçambique, advogando igualmente que a solução militar não deve ser o único caminho, porque sozinho será ineficaz.

Os conflitos de natureza militar cíclicos devem ser resolvidos de raiz e com conhecimento das causas e motivações. Soluções militares para problemas domésticos, ignorando as causas e motivações dos mesmos, é simplesmente tapar o sol com a peneira”, observou.

O debate no parlamento prossegue na sexta-feira, com a Tabela Salarial Única (TSU) na agenda, um instrumento com o qual o Governo pretende harmonizar os critérios de cálculo de salários na Administração Pública e corrigir os desequilíbrios da matriz remuneratória do setor.

A ordem de trabalhos dos deputados inclui ainda, até dezembro, o debate das propostas de lei da comunicação social e radiodifusão, a revisão da lei sobre o regime jurídico dos cidadãos estrangeiros em Moçambique, debate da lei cambial e da lei que estabelece o regime jurídico da conta bancária.

A informação do chefe de Estado sobre o estado da nação, informação do provedor de Justiça, sessões de perguntas ao Governo e o debate do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado de 2023 contam também da agenda parlamentar.

A Assembleia da República é dominada pela Frelimo com uma maioria qualificada de 184 dos 250 assentos do hemiciclo.

A Renamo tem 60 deputados e o MDM detém seis assentos.