Gerard Piqué nasceu no dia 2 de fevereiro de 1987. Nesse mesmo dia, há mais de 35 anos, o Barcelona ganhou mais um sócio. Amador Bernabéu era amigo pessoal de Cruyff, fez parte de várias direções catalãs, foi vice-presidente de Joan Gaspart no início do século XXI e assumiu uma enorme esfera de influência durante décadas — pelo meio, era também avô do recém-nascido Gerard Piqué. O recém-nascido que se tornou sócio do Barcelona assim que nasceu.

Este sábado, em Camp Nou e contra o Almería, Piqué terminou a carreira de jogador profissional de futebol enquanto titular, com a braçadeira de capitão, com uma vitória (2-0) e depois de ter entrado no estádio com os filhos pela mão. Todos os jogadores catalães atuaram com a inscrição “Sempr3” na camisola, uma referência ao número do espanhol, e este despediu-se sob uma enorme ovação quando foi substituído a cinco minutos do fim. Despediu-se do Barcelona, do estádio onde viveu as maiores alegrias, dos adeptos para quem é um herói e um ídolo e do relvado onde cumpriu os próprios sonhos e os sonhos que o avô sempre teve para ele. Entrou nas camadas jovens aos 10 anos, no final dos anos 90 e enquanto médio defensivo; e sai aos 35 como central, depois de ganhar tudo e de se tornar muito mais do que um atleta.

Ao longo das últimas 15 temporadas, já depois da passagem pelo Manchester United e do empréstimo ao Zaragoza, Piqué conquistou oito ligas espanholas, sete Taças do Rei, seis Supertaças espanholas, três Ligas dos Campeões, três Supertaças Europeias e três Mundiais de Clubes. Ou seja, foi titular indiscutível e líder absoluto durante o período mais bem sucedido da história recente do Barcelona, ombreando com Messi, Xavi e Iniesta e sendo o elo de ligação com uma geração que agora inclui Pedri, Gavi e Ansu Fati.

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Mais do que isso, Piqué termina a carreira como o arquétipo do jogador de futebol moderno — ou seja, alguém que se estende para lá dos relvados, que investe o que ganha e que decide espalhar o próprio nome para lá das costas das camisolas. Nos últimos anos, através da empresa Kosmos Holding que fundou e que lidera, chegou a uma parceria milionária com a Federação Internacional de Ténis para reformular a Taça Davis e comprou o modesto Andorra, lançando ainda uma equipa de e-sports no final do ano passado.

O mais elegante dos centrais diz adeus aos relvados – começará agora o processo de Piqué rumo à presidência do Barça?

Entre as polémicas relacionadas com a Federação Espanhola de Futebol, onde terá tentado exercer uma influência pouco saudável junto do presidente Luis Rubiales, a verdade é que o central é hoje em dia um empresário de sucesso. Mais: a verdade é que, no último ano, o central foi muito mais um empresário de sucesso do que um jogador de futebol. Algo que ficou claro com as declarações de Xavi, tanto no início da temporada como esta quinta-feira e na sequência do anúncio de Piqué, quando referiu que sempre foi honesto com o antigo colega de equipa e que nunca lhe escondeu que seria complicado encontrar espaço e minutos dentro do onze inicial.

Em resumo, e tal como fica cada vez mais notório, Gerard Piqué decidiu terminar a carreira numa altura em que já não é uma opção desportivamente viável para o clube, em que está a passar um período difícil a nível pessoal e em que optou por se dedicar por inteiro aos negócios que lidera há vários anos. O futuro, provavelmente, vai passar por uma candidatura à presidência do Barcelona — quando ele quiser, quando achar que é correto e quando pensar que pode ganhar. Para o presente, o que importa por agora, fica uma certeza: bem mais do que jogador de futebol, Gerard Piqué foi jogador do Barcelona.