Mais de metade das 15 albufeiras que foram alvo de restrições ao uso da água em outubro já atingiram a reserva estratégica estabelecida pelo Governo para acautelar a segurança do sistema elétrico, num quadro de seca extrema que afetava então todo o continente.

De acordo com informação prestada ao Observador pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), cerca de 53% das albufeiras já atingiram a cota objetivo “pelo que a sua exploração acima desta cota está em regime livre”. A cota em causa foi fixada a título de reserva estratégica de água em 15 barragens — Alqueva, Baixo Sabor, Caniçada, Paradela, Lagoa Comprida, Santa Luzia, Salamonde, Venda Nova, Alto Rabagão, Alto Lindoso, Cabril, Castelo de Bode, Vilar Tabuaço, Vilarinho das Furnas e Gouvães — e determinou a suspensão temporária do uso de recursos hídricos a partir de 1 de outubro. A suspensão deveria durar até serem alcançadas cotas mínimas da sua capacidade útil.

Entretanto, e em resultado da chuva que caiu desde outubro, as albufeiras de Paradela, Venda Nova, Salamonde, Vilarinho das Furnas, Caniçada, Gouvães, Lagoa Comprida e Santa Luzia, já atingiram esse patamar mínimo de água armazenada. A APA indica que o volume acima desta cota pode ser explorado, do ponto de vista de produção de energia, “sem qualquer restrição, não podendo, no entanto, o regime livre de exploração colocar em causa a manutenção da reserva hídrica definida, nem os usos prioritários nem a garantia dos caudais ecológicos”.

O Observador questionou a EDP sobre se tinha retomado a exploração hidroelétrica nas barragens que tiveram o seu uso restringido. A elétrica informou que a “atividade nessas barragens continua condicionada, cumprindo as orientações das entidades competentes”. A Agência Portuguesa do Ambiente acrescenta ainda que durante o próximo mês de dezembro será feita uma avaliação trimestral da medida.

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Governo manda suspender produção em 15 barragens até criar reserva estratégica para abastecimento de eletricidade

A maioria das barragens com a produção condicionada foi concessionada à EDP, sendo que algumas das albufeiras com maiores índices históricos de geração elétrica como o Alto Lindoso ainda não recuperaram o suficiente para atingir a tal cota mínima. Também o Alto Rabagão permanece abaixo do limiar referido pela Resolução de Conselho de Ministros. Isto não obstante, nas bacia dos rios Lima e do Cávado (Alto Minho), ter sido preciso fazer “acertos para continuar a garantir encaixe e evitar inundações”, ainda de acordo com a informação prestada pela APA.

As bacias do Lima e do Cávado no Alto Minho foram das mais afetadas pela situação de seca extrema que começou com um inverno excecionalmente seco nos meses de janeiro e fevereiro que não permitiu recuperar as descargas feitas para a geração hidroelétrica nos meses anteriores. As barragens na bacia do Rio Lima — Alto Lindoso e Alto Rabagão — estiveram mesmo entre as primeiras a ver a produção hidroelétrica suspensa logo em fevereiro.

O caráter excecional desta seca naquela região do país foi sempre destacado pelas autoridades que gerem os recursos hídricos e a distribuição geográfica da intensidade da chuva caída nas últimas semanas parece confirmar que alguma “normalidade” em termos hidrológicos está a ser reposta na faixa litoral norte do país. As albufeiras na qual ainda não foi atingida a reserva estratégica de água — Baixo Sabor, Alto Rabagão, Alto Lindoso, Vilar Tabuaço, Cabril, Castelo de Bode e Alqueva — ficam no interior.

A APA indica que nestas barragens a “precipitação até agora ocorrida não foi significativa pelo que o aumento da cota, apesar das restrições, é ainda baixo”. Segundo o IPMA (Instituto Português do Mar e Atmosfera) no final de outubro, menos de 10% de Portugal continental estava em seca severa, 17,9% em seca moderada e 34,3% em seca fraca, dados que ainda não refletem as chuvas de novembro.

O contributo da produção hidroelétrica, que é historicamente a principal fonte de energia renovável em Portugal (ainda que a eólica nos últimos anos tenha conquistado muito peso), está a num nível nunca visto nas últimas décadas.

Até outubro, foi menos de 10% da produção total do sistema elétrico nacional e representou 8% do consumo. A exceção foi a geração em regime de bombagem (o uso de bombas que permitem movimentar a água de cima para baixo e vice-versa gerando eletricidade, mas que é um processo que acaba por consumir mais energia do que a que produz, ainda que esta tenha um valor de mercado superior). O impacto da situação de seca obrigou a recorrer mais a centrais a gás natural num ano em que os preços deste combustível atingiram recordes por causa da guerra na Ucrânia.

Foi para reforçar a segurança do abastecimento elétrico que o Governo e a APA determinaram a constituição de uma reserva estratégica de água em 15 barragens para produzir eletricidade, nomeadamente num cenário de rutura de abastecimento de gás no inverno, cenário esse que o Governo tem afastado.

Além da segurança do abastecimento, a fraca injeção de energia com origem hídrica contribui para o aumento do preço da eletricidade nos mercados grossistas. Isto porque a produção a gás natural, mais cara, é chamada a fechar o preço em mais horas, elevando o custo de toda a energia vendida nessa hora.