Mudam-se os tempos, mudam os jogadores, seleccionadores e patrocinadores, mas mantém-se a bebida. Indissociável do ambiente de festa que rodeia qualquer competição futebolística de grande dimensão, a cerveja tem sido mais falada que bebida no Qatar, pelo simples facto de o consumo desta que é a terceira bebida mais popular do mundo, logo a seguir à água e ao café, não ser permitido dentro dos estádios e nas imediações destes. Mas tempos houve em que até os autocarros que transportavam as selecções dos diferentes países brindavam os ocupantes com um “extra” especial: uma bela torneira de onde jorrava cerveja fresquinha. Isso e um cinzeiro nas costas de cada banco, o que permitia deslocações mais fumarentas, mas potencialmente mais descontraídas.

Há 48 anos, o cinzeiro até nem surpreendia, mas a Mercedes surpreendeu a jogar em casa. Se agora é a Hyundai a patrocinadora automóvel do mundial do Qatar, em 1974 esse papel foi assumido pela marca da estrela, que não perdeu a oportunidade de fazer um brilharete com o O 302, o autocarro que tinha por missão deslocar cada uma das 16 selecções que se enfrentaram no Campeonato do Mundo de Futebol de 1974, realizado na Alemanha. Eventualmente para garantir níveis de hidratação dentro de certos limites, o Mercedes O 302 preparado para servir as equipas de cada nação, colocava cerveja ao dispor dos atletas. Algo que hoje, certamente, chocaria qualquer catari.

O autocarro da Mercedes que “animou” os futebolistas do Mundial de 74 tinha por base um modelo que começou a ser produzido em 1965 e de que foram fabricadas mais de 32.000 unidades. Nenhuma das 16 (uma para cada selecção) que foi decorada a rigor para o Campeonato do Mundo de Futebol na Alemanha perdurou, na medida em que, quando a competição terminou, regressaram ao serviço de transporte habitual. Ou seja, já sem os nomes dos jogadores a identificar o respectivo banco ou a inscrição WM74, de Weltmeisterschaft 74 (Campeonato do Mundo 1974, em alemão) no vidro de trás. Aí também surgiam as mascotes do Mundial, os pequenos Tip e Tap abraçados e a acenar, para passar a imagem de que a bola unia a Alemanha de Leste e a Ocidental.

Interessada em recuperar esse fragmento da sua história, a Mercedes tratou de fazer a réplica que ilustra este artigo. O “beer bus” – se é que o podemos chamar assim – está exposto no museu da marca, exibindo a decoração criada para a selecção germânica, com a identificação da equipa na frente e na lateral, bem como as cores bandeira do país – dois elementos que variavam de autocarro para autocarro. De resto, as emissões ainda não eram consideradas um problema, pelo que a viagem ficava entregue a um motor a gasóleo, com potências entre 126 e 240 cv.

Na altura, a cassete era outra e a música tocava num rádio Blaupunkt, porque as centrais multimédia ainda estavam longe de aparecer. E a cerveja de desaparecer (da festa entre adeptos)…

A título de curiosidade, a Hyundai acordou com a FIFA promover uma mobilidade mais sustentável, pelo que está em peso com modelos 100% eléctricos como o Ioniq 5, o Genesis G80 e G70 EV, e os híbridos Sonata, Tucson e Kauai (lá Kona). Estas são as viaturas ao dispor dos elementos da FIFA e dos vips, enquanto os jornalistas são transportados nos autocarros a bateria Elec City. Mas quem verdadeiramente tem a fatia de leão, no transporte de passageiros com zero emissões, é a chinesa Yutong, a quem o Qatar encomendou nada menos que um milhar de autocarros eléctricos, dos quais 741 já foram entregues. Garantidamente, sem a tal torneirinha…

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