Um militar da Marinha brasileira tem divulgado vídeos e áudios onde incita à violência contra apoiantes de Lula da Silva e diz, inclusivamente, que o Presidente eleito não “vai subir a rampa” do Planalto, o palácio presidencial brasileiro, para a tomada de posse, que se prevê acontecer logo no início de 2023. As palavras estão a ser interpretadas como uma ameaça contra a integridade física de Lula. O caso é ainda mais grave na medida em que o militar, Ronaldo Ribeiro Travassos, está atualmente a exercer funções precisamente no palácio, no Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. O PT já pediu o afastamento do militar das suas funções.

Nas mensagens, a que a Folha de S. Paulo teve acesso, o militar chega mesmo a defender que se dê um “tiro na cabeça” de quem “faz o ‘L'”, o símbolo com as mãos com a inicial do nome de Lula da Silva, usado para demonstrar apoio ao Presidente eleito. Confrontado com as frases e discurso de ódio contra o Presidente Lula da Silva, num primeiro momento Ronaldo Travassos recusou comentar as suas próprias declarações e disse ter dúvidas sobre se seria a sua voz. Mas num segundo momento, já depois de os jornalistas da Folha de S. Paulo terem encaminhado os ficheiros, o militar deixou de responder aos pedidos de esclarecimento do jornal.

Ronaldo Travassos foi também um dos participantes nas manifestações frente aos quartéis militares, no início do mês de novembro, depois da vitória de Lula da Silva na segunda volta das eleições brasileiras, que pediam a intervenção militar para que Jair Bolsonaro se pudesse manter no poder.

O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, onde o militar está colocado, disse em comunicado não ter competências “para autorizar a participação em qualquer manifestação” e que as declarações “são da responsabilidade do autor, pessoalmente e fora do horário de trabalho.”

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Certo é, para já, que a Polícia Federal tomou a decisão de excluir o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República da transição do governo, no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, e, segundo o Estado de Minas, tem também evitado que os elementos daquele gabinete participem na cerimónia da tomada de posse de Lula.

Sobre a ameaça de Lula da Silva não tomar posse — “não subir a rampa” –, Travassos cita outro militar do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), o general Joaquim Brandão, assessor do chefe do GSI, Augusto Heleno.

“O general Brandão perguntou lá no gabinete: ‘Marujo, o que acha? Acho, não, tenho a certeza, o ladrão [falando de Lula da Silva] não vai subir a rampa’. ‘Porque diz isso?’, ‘Porque eu confio no povo que está no Quartel Geral, em todos os quartéis pelo Brasil fora, confio nos camionistas e nos índios. Se as Forças Armadas não fizerem nada, nós vamos fazer‘”, afirmou num áudio o militar da Marinha.

Convicto de que haverá “uma guerra civil” no país, Travassos diz que “defenderia qualquer patriota” — como se denominam os apoiantes de Jair Bolsonaro –, mas que “daria um tiro na cabeça do próprio irmão se fizesse o ‘L'”. “Não digo a brincar, não. É a sério. Quem faz o ‘L’ é terrorista. Tem que morrer mesmo. Ou mudar ou morrer, porque não faz sentido uma pessoa dessas”, disse o militar num dos áudios.

PT pede afastamento e investigação a Ronaldo Travassos

Na resposta à divulgação dos áudios de Ronaldo Travassos, o partido de Lula da Silva, o PT, já pediu o afastamento do homem que tem publicamente defendido que o Presidente eleito não irá tomar posse, o estalar de uma “guerra civil” e ainda a possibilidade de “dar um tiro na cabeça” a quem apoia Lula.

Paulo Teixeira, deputado do PT, confirmou que irá pedir o afastamento do militar: “Temos aqui pelo menos dois problemas: incitação ao crime e crime contra as instituições eleitorais. Por isso, além do afastamento vamos pedir também que esse militar seja investigado.”

O pedido foi submetido ao Supremo Tribunal Federal pelos deputados Paulo Teixeira, Reginaldo Lopes, Henrique Fontana e Alencar Santana, acrescenta a Folha de S. Paulo.

Além do pedido de afastamento de Ronaldo Travassos, os deputados querem ainda que Augusto Heleno preste esclarecimentos sobre a situação no Parlamento.