Idas sem voltas são permanências. Permanências são estagnação e o crescimento tem uma relação íntima com a deambulação por lugares onde se pode aprender. O Canadá não ia ficar no Qatar por nada do que se pudesse passar no Estádio Al Thumama. É uma seleção em crescimento que teve neste Mundial um espaço para mostrar que estão no caminho certo rumo à evolução. Para os canadianos o bilhete de regresso a casa estava comprado, mas, mesmo que fossem poucos os pontos de interesse que tinham neste jogo, os Canucks continuavam a perseguir a primeira vitória de sempre em Mundiais. O consolo que podia advir do cumprimento desse objetivo não foi recebido com empatia para uma seleção marroquina que estava fidelizada a compromissos de maior gabarito, tais como chegar aos oitavos e até, quiçá, alcançar o primeiro lugar do grupo. Cedo Marrocos retirou ao Canadá o pouco que lhe sobrava como motivação. 

Ainda não estava estabelecida uma tendência no jogo e Milan Borjan já fazia asneiras. Steven Vitória atrasou para o guarda-redes canadiano e este, ao tentar sair a jogar com os pés, assistiu… Hakim Ziyech (4′) que picou a bola para uma baliza deserta e fez o golo de Marrocos. A resposta não tardou. Cyle Larin (15′) arrancou em potência pela direita, fez um bom cruzamento, mas faltaram centímetros a Buchanan para chegar à bola e nem de carrinho lá foi. A exposição ofensiva não adiantava se, atrás, o Canadá continuava vulnerável. En-Nesyri (23′) fez uso da passada larga para atacar a profundidade e rematou com potência incontrolável para mais um golo. Se os Canucks  não conseguiam marcar, tiveram que encontrar quem o fizesse por eles. O canadiano Adekugbe cruzou pela esquerda, Aguerd tentou o corte, mas acabou por enviar a bola para dentro da baliza (40′). Marrocos sofreu o primeiro golo no Mundial. Não estava a ser um diz feliz para Aguerd. Pouco depois, o defesa do West Ham foi apanhado em posição irregular, o que levou à anulação do bis de En-Nesyri (45+3′).

O selecionador inglês do Canadá, John Herdman, foi fazendo substituições, mas a seleção demonstrou os mesmos problemas dos jogos anteriores. Apesar de ser uma equipa com um comportamento tático organizado, revela algumas dificuldades em criar espaços em ataque prolongado. Sabendo disso, a seleção marroquina, treinada por Hoalid Regragui, baixou o bloco e viveu confortável com o jogo posicional canadiano. Só de bola parada o Canadá conseguiu ameaçar o empate. Hutchinson (72′) cabeceou à barra e foi necessária a tecnologia da linha de golo para ter a certeza de que, no ressalto, a bola não tinha entrado.

Com o 2-1 no marcador e o destino traçado, o guarda-redes canadiano quis emendar o erro que cometeu na primeira parte e subiu à grande área contrária. A única coisa que conseguiu foi quase ter sofrido novamente. A cada segundo que passava, confirmava-se que a história do jogo foi a história que já estava escrita: Marrocos segue em frente e o Canadá fica pelo caminho sem lembranças para levar para casa.

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A pérola

  • A bola dorme melhor almofadada nos pés de Hakim Ziyech. Cada vez que o marroquino lhe toca é um embalo que deixa os defesas ensonados e chama os colegas para a diversão de uma noite de festa em que o motivo das celebrações são os golos. O jogador do Chelsea esteve em ótimo plano a associar-se com os colegas sobre a direita.

O joker

  • Sofyan Amrabat é um armário sem portas, mas com a mesma força. Todos os que lhe tocam acabam no chão, tal a dimensão do médio defensivo nos contactos físicos. Aliado a isso, não compromete com bola, mesmo que, diante de si, no 4-3-3 marroquino, tivesse a qualidade técnica de Sabiri e Ounahi para fazer o meio-campo funcionar.

A sentença

  • O Canadá já sabia que não tinha quaisquer possibilidades de seguir em frente e falhou também a hipótese de conseguir a primeira vitória de sempre em Mundiais, mas, ao invés, nem um ponto somou. Marrocos partia para a última jornada em segundo lugar, mas beneficiou do 0-0 entre Croácia e Bélgica para assegurar o primeiro lugar do grupo F com um total de sete pontos e um assinalável registo de quatro golos marcados e um golo sofrido. Os marroquinos ficam a aguardar pelo desfecho do grupo E para saberem quem vão defrontar nos oitavos de final.

A mentira

  • Bélgica e Croácia partiam como favoritos para a vitória e para o apuramento no grupo F. Sorrateiramente, uma seleção africana deu uma lição a quem se baseia no historial e numa visão europeísta para fazer previsões e passou-lhes a perna. É a primeira vez que uma equipa africana passa em primeiro do grupo desde 1998. Os Leões do Atlas alcançam os oitavos pela segunda vez na história.