Continua a ser estranho, continua a soar estranho, continua a parecer estranho. Ainda assim, é uma realidade que já nem sequer está totalmente isolada: o Qatar é dono do PSG. O Qatar — um país, um Estado, uma nação — é proprietário de um clube de futebol. O Emir do Qatar, através de um fundo de investimento, é o responsável pelos franceses. O principal clube de França pertence a outro país.

A ideia foi inovadora em 2011, embora tenha replicado de certa forma o projeto dos Emirados Árabes Unidos com o Manchester City que tinha começado uns anos antes, e entretanto já sofreu uma nova reformulação com a Arábia Saudita e o Newcastle. A ligação umbilical do PSG ao Qatar, embora nunca tenha sido esquecida, foi recordada e sublinhada nos últimos meses e na antecâmara do Campeonato do Mundo. De repente, as voltas e reviravoltas do futebol internacional fizeram com que um Mundial fosse atribuído a um país que é dono de um dos maiores clubes de futebol do mundo. De repente, as circunstâncias fizeram com que este parecesse o Mundial do PSG.

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As competições internas foram interrompidas numa altura em que, na Ligue 1, o PSG é líder isolado da classificação com mais cinco pontos do que o Lens. E foram interrompidas numa altura em que os quatro melhores marcadores da equipa de Christophe Galtier são Mbappé, Neymar, Messi e Hakimi — todos eles figuras de proa no Campeonato do Mundo, todos eles presentes nos quartos de final, e à exceção do brasileiro, com três elementos presentes também nas meias-finais. Se Neymar foi um dos protagonistas do Mundial ao ir do céu ao inferno, mostrando magia em lances como o do golo contra a Croácia mas sendo a cara do novo falhanço do Brasil na corrida pelo hexacampeonato, os três colegas de equipa continuam à procura de uma presença na final.

Esta terça-feira, Lionel Messi vive mais um capítulo da possível e provável última grande história da carreira. No Qatar, o argentino tem a derradeira oportunidade para conquistar o único degrau que lhe falta, o Campeonato do Mundo, depois de ganhar tudo a nível individual e de clubes e de ter finalmente alcançado a Copa América no ano passado. Frente à Croácia, numa meia-final em que Luka Modric também pode viver os últimos minutos em Mundiais, Messi reencontra o adversário contra quem apontou o primeiro golo pela Argentina, em março de 2006 e num encontro particular: uma coincidência que só torna ainda mais especial um eventual apuramento para a decisiva final do próximo domingo.

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Depois, Kylian Mbappé. Com apenas 23 anos, o avançado francês corre o extraordinário risco de disputar a segunda final consecutiva de um Mundial — e de conquistar o segundo Mundial no espaço de quatro anos depois do sucesso na Rússia, em 2018. Esta quarta-feira, contra Marrocos, França procura não repetir os erros de Bélgica, Espanha e Portugal e eliminar a surpreendente seleção africana. Para isso, naturalmente, conta com o contributo do jogador do PSG: que atualmente é o melhor marcador da competição, com cinco golos.

Por fim, Achraf Hakimi. O capitão marroquino, que tem estado ao mais alto nível no PSG depois de já ter impressionado no Borussia Dortmund e no Inter Milão, tem sido o líder incontestado da equipa de Walid Regragui que já fez história ao tornar-se a primeira seleção africana a chegar às meias-finais de um Mundial. Com apenas um golo sofrido no Qatar — um autogolo, contra o Canadá –, Marrocos tem em Hakimi um natural ativo ofensivo mas também um elemento fulcral na movimentação defensiva. Tão fulcral que Mbappé, que compartilha o balneário da seleção com Pavard e Koundé, defende que o marroquino é “o melhor lateral direito do mundo”.

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Ao contrário do que acontece com Messi e Neymar, com quem o avançado francês tem relações de simples parceria profissional, Mbappé é amigo próximo de Hakimi. Tão próximo que, na segunda-feira da semana passada e depois da vitória francesa contra a Polónia nos oitavos de final, o avançado aproveitou o dia livre para visitar o marroquino na concentração dos africanos em West Bay, Doha. Esta quarta-feira, no Estádio Al Bayt e no país que lhes paga os milionários salários, vão estar em lados opostos da barricada.