O presidente da Associação Sindical de Chefias do Corpo da Guarda Prisional (ASCCGP) disse esta quinta-feira no Parlamento “não ter dúvidas de que vai acontecer alguma coisa grave” no sistema prisional caso os problemas do setor não sejam rapidamente resolvidos.

Ouvido na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Hermínio Barradas disse que a ASCCGP não pretende ser “alarmista”, mas advertiu que os vários problemas por resolver nas prisões, quer relativamente às condições de detenção dos reclusos, quer em relação à falta de chefes e guardas prisionais, potencia que alguma “coisa grave” possa acontecer.

Em sua opinião, o recente incidente no Estabelecimento Prisional da Polícia Judiciária, que obrigou à presença durante várias horas no local do Grupo de Intervenção dos Serviços Prisionais para acalmar e conter os protestos dos reclusos ali detidos, “foi um sinal” do que pode vir a acontecer noutras cadeias.

A este propósito, referiu que o EP da PJ tem capacidade para 116 reclusos, mas já chegou a albergar 189. Falou ainda das dificuldades dos chefes da guarda prisional em lidar com a chegada súbita de dezenas de detidos de uma só vez, como aconteceu no passado em relação a uma claque de um clube de futebol e a um grupo ‘motard’ acusado da prática de vários crimes.

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“Não fazem ideia do esforço que fazemos para levar as coisas a bom termo”, enfatizou Hermínio Barradas, apelando aos deputados para que “olhem para a situação dos guardas prisionais”, uma profissão que “está envelhecida”, mal remunerada, com a carreira estagnada e para a qual “já ninguém quer vir”.

Nas palavras do presidente da ASCCGP, tudo isto “são sinais preocupantes” para o futuro do sistema prisional e da guarda prisional que, disse, é a terceira maior força de segurança do país.

Na audição parlamentar, Hermínio Barradas aludiu aos “problemas sistémicos”, sobretudo de carreira, que atingem a classe, observando que atualmente “não há chefes” suficientes, pelo que muitas das funções destes têm que ser delegadas em guardas prisionais sem o estatuto de chefe, apontando como exemplo paradigmático aquilo que sucede no Estabelecimento Prisional (EP) de Ponta Delgada.

Durante a sessão, a deputada Sofia Matos (PSD) recordou a visita efetuada pelos deputados ao EP de Ponta Delgada, considerando que a mesma foi “um murro no estômago” de todos os presentes, devido à falta de condições prisionais e a outros problemas detetados.

Quanto à situação dos reclusos nas diversas cadeias do país, Hermínio Barradas chamou a atenção para a existência de “infraestruturas degradadas”, “alojamentos coletivos que não respeitam as regras internacionais”, bem como para problemas de “segurança, humidade, frio, calor” e más condições sanitárias e de saneamento nas instalações que acolhem os presos.

O dirigente sindical criticou ainda o sistema prisional por misturar jovens com idosos, reclusos doentes e com doenças infecto-contagiosas com outros saudáveis, reclusos com penas curtas com outros com penas longas”, num caldo penitenciário que dificulta o trabalho da guarda prisional em garantir a segurança e a pacificação de conflitos.

Hermínio Barradas disse ainda, em resposta a perguntas dos deputados, que a reinserção social “não está a ser cumprida”, sendo prova de que está a falhar a elevada taxa de reincidência dos reclusos, muitos deles a entrarem pela quarta e quinta vez na cadeia com um longo historial penitenciário.

O dirigente sindical alertou também que nos próximos anos mais de mil efetivos estão em condições de se aposentarem, o que irá agravar a já tão conhecida falta de chefes da guarda prisional, os quais são diariamente submetidos a situações de “grande tensão emocional e física” em cadeias, algumas delas com sobrelotação de reclusos.

O mesmo responsável indicou que a Direção-Geral dos Serviços Prisionais tem disfarçado o problema da sobrelotação, aumentando administrativamente a lotação das cadeias, conforme ocorreu na Carregueira que, de repente, passou de uma lotação de 732 para cerca de 900 reclusos.

O presidente da ASCCGP reconheceu que o “contexto dramático” que se vive nas prisões a que se chegou é o resultado de mais de duas décadas de políticas de sucessivos governos, concordando com a deputada Sofia Matos (PSD) que o sistema prisional é “o parente pobre do parente pobre de todas as áreas da governação”.