Tudo começou com uma escuta. Ao contrário do que é habitual nas investigações judiciais que envolvem membros da máfia em Itália, a captura de Matteo Messina Denaro, um dos maiores “Padrinhos” da Cosa Nostra, não envolveu confissões de antigos membros. Foi pura investigação criminal tradicional.

Os Carabinieri andavam a interceptar as chamadas telefónicas dos membros da família de Denaro em liberdade há três meses quando, de acordo com o Corriere della Sera, ouviram algumas referências das irmãs de Denaro a cancro do fígado, quimioterapia e duas cirurgias (uma ao tumor em causa e outro a doença de Crohn), em Marsala e Palermo.

Com a suspeita de que Denaro estivesse doente com cancro, partiram para a investigação na base de dados nacional do Ministério da Saúde. Aí, limitando a busca por tipo de cancro, idade, sexo e naturalidade, elaboraram uma lista de suspeitos. E foi nessa altura que um nome saltou à vista: Andrea Bonafede, de Campobello di Mazara.

Isto porque Bonafede é sobrinho de Angelo, um conhecido capo que trabalhou vários anos para “O Padrinho” Denaro. Só que no dia da operação na clínica Maddalena, em Palermo, Bonafede estava, na verdade, em casa. Foi a peça que faltava para que os investigadores concluíssem que aquelas informações diziam respeito, na realidade, a Matteo Messina Denaro, que estava a ser tratado a um cancro do cólon e a metástases no fígado resultantes da doença.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Denaro era já presença assídua na clínica Maddalena ao longo dos últimos dois anos, onde tinha sido hospitalizado seis vezes. De tal forma que, segundo revela o La Repubblica, trazia habitualmente presentes para os funcionários da clínica.

Um “cemitério” de vítimas, uma criança morta em ácido nítrico e 30 anos de fuga. Quem é o líder da máfia siciliana que foi detido?

Em dezembro, por estar a piorar, regressou para fazer uma ressonância magnética. Esta segunda-feira, tinha novo exame marcado e uma sessão de quimioterapia na clínica, conta o La Stampa. Com essa informação, os Carabinieri prepararam uma operação para o apanhar. Quando chegou acompanhado de um colaborador, o produtor de azeite Giovanni Luppino, tinha à sua espera dezenas de agentes. Tentou fugir, mas não teve hipótese. Um agente perguntou-lhe diretamente o nome e respondeu sem hesitar: “Sou Matteo Messina Denaro”.

De acordo com o relato do Il Messaggero, a detenção foi feita ao som de aplausos não apenas dos agentes, mas também de dezenas dos pacientes e familiares presentes na clínica.

Foi o culminar de uma investigação de anos, como resumiu na conferência de imprensa que se seguiu à detenção Pasquale Angelosanto, comandante da polícia.

O período mais recente ocorreu durante o Natal, com o nosso pessoal a trabalhar nos gabinetes e a juntar detalhes todos os dias”, ilustrou, destacando o “sacrifício” dos seus agentes.

E, apesar de estar a ser tratado para um cancro, Denaro tem condições de saúde para ser sujeito a julgamento, creem os investigadores. “Ele estava com bom aspeto, bem vestido, usava roupas de luxo e isso leva-nos a concluir que as suas condições económicas neste momento eram boas”, acrescentou o procurador Paolo Guido, que destacou que “O Padrinho” trazia consigo um relógio que valia mais de 30 mil euros.

“Obviamente, será tratado com todos os direitos que qualquer cidadão tem”, assegurou.