O mecanismo ibérico introduzido no mercado grossista da eletricidade por Portugal e Espanha não provocou um aumento do consumo de gás natural por parte dos produtores de energia. A garantia foi dada esta terça-feira pelo ministro do Ambiente durante uma audição na comissão parlamentar em que Duarte Cordeiro  reafirmou o interesse de Portugal em prolongar no tempo o modelo que permitiu reforçar a proteção aos consumidores face a preços altos.

O mecanismo ibérico, que desliga o preço do gás da formação do preço da eletricidade, “não incentiva o aumento do consumo de gás natural”, afirmou Duarte Cordeiro em resposta ao deputado Hugo Carvalho do PSD, lembrando que o mesmo erro foi cometido pela Comissão Europeia numa avaliação inicial ao funcionamento da exceção ibérica que entrou em vigor em maio do ano passado. É um “erro comum”, assinalou o ministro que adianta ter sido explicado em várias reuniões com os serviços de Bruxelas.

O ministro do Ambiente e a homóloga espanhola deslocam-se esta quarta-feira a Bruxelas para submissão do pedido de renovação do mecanismo ibérico para limitar o preço do gás para produção de eletricidade.

O aumento da procura de gás natural por parte do setor elétrico em Portugal é explicado, sublinhou o ministro, pelo período de seca que se viveu durante os meses do verão e que obrigou o sistema elétrico ibérico a recorrer mais ao gás para produzir a energia que não era entregue por fontes renováveis como as grandes hídricas. A prova disso, acrescentou, foi o mês de dezembro em que graças à subida da produção hidroelétrica, a necessidade de gás foi menor, o que conduziu a um menos custo de ajustamento deste mecanismo que é passado para os clientes que dele beneficiam.

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Duarte Cordeiro referiu ainda que este custo não é um subsídio ao gás natural, mas sim a garantia de que esta tecnologia continua a receber o preço do mercado. Quem não recebe o preço de mercado (mais caro quando é fixado pelas centrais a gás) são os produtores que têm custos muito inferiores, nomeadamente os que usam fontes renováveis.

Teresa Ribera tinha anunciado que Espanha ia solicitar o prolongamento até ao final de 2024 do mecanismo para limitar o preço do gás adquirido para produção de eletricidade em Portugal e Espanha. Madrid vai apresentar o pedido para “extensão da exceção ibérica além de maio de 2023, enquanto durar esta crise”, sustentou na altura a ministra espanhola, entrevista à televisão espanhola Antena 3. “Gostaríamos que [o preço máximo do gás para gerar eletricidade] ficasse no valor mais baixo possível, 45 ou 50 euros o megawatt por hora, e que se possa prolongar até pelo menos o final de 2024”, acrescentou.

Portugal acompanha Espanha na ambição de estender o mecanismo ibérico para além de maio de 2023.  Apesar de beneficiar menos do que o país vizinho, porque o mercado nacional tem um nível de maior proteção dado pelas tarifas reguladas e por contratos a prazo de compra de energia abaixo do preço de mercado, Portugal também teve benefícios, afirmou Duarte Cordeiro porque ele permitiu estender a proteção a consumidores que estavam expostos à volatilidade do mercado.

Poupanças de 20% ou 489 milhões em 2022

“Desde que entrou em vigor e até ao final do ano passado, o mecanismo [ibérico] permitiu, segundo as estimativas provisórias do regulador, uma redução do preço final de 49 euros por megawatt-hora (MWh), ou seja, uma redução de 20% face ao preço que ocorreria sem a medida, gerando um benefício de cerca de 489 milhões de euros neste período, para quem está exposto ao mercado”, disse o ministro do Ambiente e da Ação Climática.

Já em dezembro, no que diz respeito ao preço médio diário do mercado grossista de eletricidade, a poupança foi de 74 euros/MWh, o que representou um decréscimo de 36% face ao preço sem a aplicação da medida. Segundo o governante, tal deveu-se, essencialmente, “a um maior peso das renováveis e à evolução dos preços do gás no mercado internacional”. “Para terem uma ideia do efeito do mecanismo, o preço médio obtido em Portugal em dezembro foi menos de metade do preço em França, Grécia ou Itália (283,61 euros/MWh) e 54% do preço praticado na Alemanha”, apontou Duarte Cordeiro.

Daí que a posição portuguesa seja a de salvaguarda do modelo. “Temos interesse em que seja continuado porque produz efeitos que entendemos serem positivos. Temos mais maior proteção. Entendemos que o mecanismo estendeu esses benefícios”.

Sobre o debate europeu de reforma da estrutura do mercado marginalista na eletricidade — onde o preço de toda a energia é fixado pela última tecnologia (e mais cara) a entrar para responder à procura — Portugal defende que sejam criados incentivos à contratação a prazo. Ao mesmo tempo considera essencial a correção de anomalias de preços e a manutenção de mecanismos de proteção dos consumidores.