Firmadas numa “cápsula do tempo”, as assinaturas de António Costa e Isaltino Morais ficaram juntas num auto de consignação da obra de construção de habitação, em Carnaxide, no âmbito do PRR. Juntou-se cimento e atiraram-se pedras, literais e não só. O autarca de Oeiras já estava a avisar que tinha “recados” para Costa e eles chegaram na intervenção onde lhe pediu para alterar a lei dos solos que prejudica quem quer construir. Sem isso, o país corre o risco de ter na habitação, “a médio prazo, uma catástrofe social”. E Costa anuiu, apontando uma nova lei para “este trimestre”.

A lei alterada em 2014 (era o PSD Governo e o ministro responsável Jorge Moreira da Silva) determinou que os terrenos classificados nos planos diretores municipais como “solos urbanizáveis” passassem a designar-se por “solo rústico”, o que teve um impacto direto na capacidade de construção. Essa alteração é, para Isaltino, a origem de quase todos os males na Habitação.

A alteração à lei dos solos “gerou uma aliança perversa entre os mais conservadores liberais à direita com os mais populistas do politicamente correto à esquerda”, lamentou Isaltino. “Ao terminarmos com a classificação dos solos urbanizáveis e elevarmos à sacrossanta o investimento agrícola, protegemos os investimentos dos ricos e os agrícolas, mas não as pessoas”, descreveu o autarca com o primeiro-ministro a ouvi-lo na primeira fila da apresentação do parque habitacional do Alto da Montanha, em Carnaxide.

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Esta é uma velha reivindicação do autarca, que defende que a lei possa libertar mais terrenos para a construção, travando a especulação para a qual acredita que a alteração contribuiu. “Se não interviermos na lei dos solos, o assunto da habitação continuará a agravar-se porque o esforço de habitação pública não será suficiente para resolver o problema de habitação em Portugal”, disse mais uma vez.

No lançamento da obra esteve o primeiro-ministro e a ministra da Habitação, Marina Gonçalves. E depois do cerimonial do arranque e da insistência de Isaltino sobre os solos, o autarca lá ouviu o primeiro-ministro prometer mexer nesse capítulo em breve. Na intervenção que fez, António Costa atirou uma resposta para a lei da habitação que conta ter pronta no primeiro trimestre.

No final do evento, em declarações aos jornalistas, Costa acrescentou que pretende que a “lei responda à necessidade de mais solos urbanos”, que tinha acabado de ser pedida por Isaltino Morais. Isto além de prometer mecanismos que permitam “pôr no mercado da habitação fogos retirados desse mercado e criar um regime fiscal” para incentivar isso mesmo.

“Temos de aumentar a oferta e agilizar o processo de licenciamento e ter um regime fiscal mais eficiente que penalize mais as casas não acessíveis a arrendamento”, afirmou o primeiro-ministro apontando para essa alteração legislativa que o Governo está a preparar.

Concordou também com Isaltino quando este descreveu as “condições únicas” e “irrepetíveis” que Costa tem para alterar este panorama. A obra em causa, cujo investimento ultrapassa os 18 milhões de euros, tem uma comparticipação financeira do PRR na ordem dos 16 milhões. Vão ser construídas 92 casas em três edifícios a concluir até 2024. Bem dentro do prazo que aperta o Governo na execução do PRR: 31 de dezembro de 2026.

Isaltino “não tira o sono” a Costa quanto ao cumprimento dos prazos, pela “larga experiência que tem”. O primeiro-ministro avisou, mais uma vez, que com atrasos na obra e sem cumprir prazos, “o dinheiro não vem e temos de ser nós a pagar”. “O tempo está a contar, as 24 horas do 31 de dezembro de 2026 podem parecer distantes, mas são já depois de amanhã”, notou o primeiro-ministro.