Com um Governo que o Presidente da República “pôs a prazo”, o novo líder da IL, Rui Rocha, considera que o primeiro-ministro “já desistiu do país”, mas também os portugueses estão a desistir de António Costa, incluindo a função pública.

“O que nós queremos mesmo é que, depois de uma próxima eleição, o país tenha condições para se tornar um país diferente porque o modelo que temos de governação de António Costa, o modelo de sociedade, o modelo de economia está esgotado e vemos até que António Costa já desistiu do país e o país também está a desistir de António Costa”, afirma, em entrevista à agência Lusa, Rui Rocha, eleito presidente da IL há duas semanas numa convenção eletiva muito dividida e crispada.

Na análise de Rui Rocha, esta desistência está patente no núcleo essencial do apoio de António Costa quando se vê “professores na rua ou médicos a marcar greves”, ou seja, uma “grande contestação” ao chefe de executivo “vinda de dentro das suas bases naturais de apoio, nomeadamente na função pública”.

“Acho que os próprios funcionários públicos estão a perceber que este modelo de gestão vai contra os seus próprios interesses”, disse, antecipando por isso “ventos de mudança”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Depois de no discurso de encerramento da convenção ter passado uma espécie de “certidão de óbito” a um Governo “completamente esgotado e politicamente morto”, o novo presidente da IL reitera que há sinais de “degradação rápida” no executivo socialista, mas recusa fazer futurologia.

“A maioria absoluta não serve para nada de útil para o país, mas pode servir para António Costa se agarrar ao lugar muito para lá do prazo de validade das suas soluções políticas”, admite.

Rui Rocha faz questão de referir que o próprio Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, “pôs este Governo de maioria absoluta a prazo, colocando 2023 como um ano em que é preciso apresentar a obra”.

“O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa falou de uma maioria que não tem sido de obra e dá esta última oportunidade ao Governo António Costa, no ano de 2023, para se tornar uma maioria absoluta de obra. Creio que o Presidente da República é um bocadinho mais otimista do que eu”, afirma, insistindo que este governo e o seu primeiro-ministro “não são reformáveis”.

Depois de na moção de estratégia global que levou à convenção, o líder liberal ter sido muito crítico da atuação de Marcelo Rebelo de Sousa no último ano, Rui Rocha aponta que “o Presidente da República ainda não desistiu de António Costa porque o põe a prazo, mas claramente tem uma visão já menos benévola daquilo que é o exercício governativo”.

“Tal como o primeiro-ministro disse, o Governo pôs-se a jeito e eu creio que o Presidente da República finalmente percebeu isso”, afirma.

Questionado sobre a solução governativa encontrada depois das legislativas de 2015, a chamada “geringonça”, o líder da IL defende que esta “foi um expediente utilizado por António Costa na altura para conseguir ir para o poder”.

“Vimos claramente, apesar das promessas, que António Costa, quando agora teve maioria absoluta, tinha dito que ia envolver os partidos da geringonça nessas soluções, creio que não o tem feito. Pelo menos o PCP e o Bloco de Esquerda têm-se queixado muito disso”, acrescenta.

Voto na IL é o único que garante que PS sai do poder e que Chega não entra

O novo presidente da IL defende que o voto nos liberais é “o único” que “garante que o PS sai do poder e que o Chega não entra” e desafia o PSD a abrir o jogo sobre entendimentos pós-eleitorais.

Em entrevista à agência Lusa duas semanas após ter sido eleito presidente da IL numa convenção tensa e dividida, Rui Rocha assume que a “imagem do partido beneficiaria se, em alguns momentos, a discussão tivesse sido um pouco mais ponderada”, apesar de considerar que não é num fim de semana que se define o partido, mas sim em todo o trajeto já feito e na ação política futura.

Sobre eventuais coligações pós-eleitorais, o novo líder da IL enfatiza a importância da clareza e da “lealdade democrática”, defendendo que os liberais têm sido claros no seu posicionamento: uma via de entendimento com o PSD mas sem “qualquer participação de partidos extremistas”.

“Aquilo que resulta é que, neste momento, com as posições conhecidas, o voto na Iniciativa Liberal é o único voto que garante que o PS sai do poder e que o Chega não entra no poder”, defende.

Rui Rocha explica que tem tido preocupação de ser “muito claro” desde já sobre “quais são os pontos essenciais para um possível entendimento” depois das eleições com o PSD e que por isso mesmo será preparado “nos próximos tempos um caderno de encargos” com as condições dos liberais.

Desse caderno de encargos com as “matérias decisivas para um eventual entendimento”, adianta o liberal, fará parte o sistema eleitoral, a redução da carga fiscal, a redução da despesa pública em percentagem do PIB, as questões constitucionais, a liberdade de escolha na saúde e na educação, e a desburocratização.

“Nós também tivemos, na semana que termina, um congresso em que o Chega disse que quer lugares no Governo para apoiar algum tipo de entendimento com o PSD. E, portanto, há aqui desde logo uma diferença: nós situamo-nos nas ideias, outros situam-se nos cargos, independentemente das ideias. Não é essa a forma de fazer política da Iniciativa Liberal”, compara.

A clarificação de alguns, segundo Rui Rocha, coloca duas perguntas no sistema político português, a primeira das quais ao PSD: “o que é que faz? O que é que vai fazer relativamente a possíveis entendimentos?”

“Mas há também uma pergunta muito importante a fazer ao PS: se vai ou não, se for esse o caso, fazer entendimentos com o PCP, com um partido que tem uma posição, nomeadamente do ponto de vista dos direitos humanos, da guerra da Ucrânia, absolutamente indefensável, para além de uma visão de democracia que é precisamente antidemocrática”, questiona.

Segundo o também deputado da IL, o partido “não descarta idas para o Governo num determinado contexto”, mas considera que esse não é o ponto essencial.

“O que nós queremos é mesmo transformar o país e, portanto, queremos que as ideias de transformação, o tal caderno de encargos de que falamos, seja o centro da discussão política que vamos ter num cenário de eventual entendimento”, explica.

Se depois, “para assegurar a implementação dessas ideias, for melhor para o país que a Iniciativa Liberal esteja no governo”, o partido assumirá as suas responsabilidades, assegura Rui Rocha.

“Se isso não for um tema determinante, se para o país for melhor outro tipo de solução também cá estaremos para assumir as nossas responsabilidades”, refere.

Tendo já feito criticas ao PSD na moção de estratégia global e desafios a Luís Montenegro no discurso de encerramento da convenção, o presidente da IL afirma que “os portugueses reconhecem historicamente o PSD como um partido que, lá atrás, chegou a ser um partido reformista”.

“O problema é que está cada vez mais lá atrás e aquilo que eu tenho dito é que a Iniciativa Liberal é um partido que vai ter, como tem tido, a coragem e a audácia de apresentar aos portugueses uma visão de país completamente diferente. Não vamos esperar por ninguém. Gostaríamos que o PSD fizesse esse caminho de retomar essa sua visão reformista, mas é uma questão sobre a qual eu só posso fazer desafios, não posso fazer mais do que isso”, disse.

JMJ: Rui Rocha contra “obras faraónicas de utilidade duvidosa” pede “bom senso” na gestão

Rui Rocha pede “bom senso” na gestão da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) e lembra que está em causa o dinheiro dos contribuintes, defendendo que “obras faraónicas de utilidade duvidosa” não fazem sentido.

“O Presidente da República, quando se soube que a Jornada Mundial da Juventude vinha para Portugal, fez uma declaração efusiva e disse ‘Conseguimos. Lisboa, Portugal, conseguimos’. Eu diria que agora olhamos para isto e dizemos “Lisboa, Portugal, esbanjamos'”, responde Rui Rocha, em entrevista à agência Lusa, quando questionado sobre a polémica em torno da organização da JMJ.

Na opinião do novo líder da IL, “tem faltado genericamente é bom senso”. O dirigente liberal considera que, tal como acontece noutros grandes eventos, “nada é preparado atempadamente”, criticando “uma displicência na gestão” de todo o processo.

“Há um défice de gestão, há um défice de bom senso naquilo que são estes eventos e, em geral, na gestão das atividades públicas e do dinheiro público que no final do dia é dinheiro dos contribuintes. Isso é a preocupação que nós temos”, enfatiza.

Apesar de as coisas não terem sido acauteladas antes, Rui Rocha defende que agora é “preciso tomar decisões” porque senão é a própria JMJ que “fica em causa” e seria “um vexame que Portugal não deveria correr o risco de passar”.

“Creio que depois de uma discussão inicial, todos estamos de acordo que obras faraónicas de utilidade duvidosa, no mínimo, não fazem sentido e, portanto, o princípio do bom senso deve impor-se na gestão destas questões”, afirma.

A entrevista à agência Lusa acontece duas semanas depois de ter sido eleito novo presidente da IL naquelas que foram as primeiras eleições internas disputadas para escolher o sucessor de João Cotrim Figueiredo.

Precisamente a questão da não eleição de João Cotrim Figueiredo, no início da legislatura, para a vice-presidência da Assembleia da República foi um dos pontos abordados, depois do desafio feito esta semana pelo PS no parlamento para que a IL apresentasse num novo nome ao cargo.

Reiterando que é um tema da competência da bancada parlamentar, Rui Rocha recorda que a decisão então tomada foi que o partido “reavaliaria eventualmente essa situação se houvesse uma mudança de circunstâncias”.

“Nós temos uma clarificação do PS, mas não temos uma clarificação do PSD. É preciso, para além disso, que haja um deputado da IL que tenha o desejo de concorrer à vice-presidência, mas falta uma clarificação daquilo que justificou a não aprovação do João Cotrim Figueiredo e isso é fundamental para considerarmos que há uma alteração de circunstâncias”, defende.

Na convenção de 21 e 22 de janeiro, o deputado Rui Rocha foi eleito o novo presidente da IL, tendo a moção apresentada pela sua lista à comissão executiva alcançado 51,7% dos votos, enquanto a lista da deputada Carla Castro teve 44% dos votos e a do conselheiro nacional José Cardoso 4,3% dos votos.

Depois da crispação e divisão patente na convenção, o novo líder diz ver um partido unido, assegurando que a IL vai “dia a dia, passo a passo, a partir de agora, demonstrar” que associa coragem à irreverência.

“E essa irreverência também tem a ver depois com a discussão interna. Nós não podemos querer o melhor de dois mundos. Não podemos querer um partido amorfo internamente que depois seja capaz de fazer um combate político como nós queremos fazer”, justifica.

Sobre a revisão estatutária, processo que será aberto no Conselho Nacional de final de fevereiro e com o qual se tinha comprometido durante a campanha interna, o novo presidente refere que essas decisões serão tomadas pelos membros numa convenção para o efeito que espera que decorra até ao fim deste ano.

“Aquilo que nós identificamos na moção de estratégia e vamos, portanto, respeitar, são dois pontos fundamentais. Um tem a ver com a questão das inerências, ou seja, da presença da Comissão Executiva no Conselho Nacional, e será um ponto que vamos sugerir, e o segundo ponto tem a ver com as regiões autónomas da Madeira e dos Açores, em que há necessidade de, com a expansão que se prevê para a IL, depois ter algum tipo de estrutura que possa representar a IL junto dos governos regionais”, elenca.

Sobre as inerências, há matérias que, na opinião de Rui Rocha, a presença deve ser reduzida e outras em que não deve existir, como é o caso do orçamento e das contas.