Os partidos defenderam esta quinta-feira uma resposta mais abrangente do parlamento ao relatório sobre os abusos sexuais de menores na Igreja Católica, com o PS a pedir, antes de mudanças na lei, regras obrigatórias para organizações que lidem com crianças.

O tema foi trazido ao debate no parlamento pelo deputado único do Livre, Rui Tavares, que se mostrou disponível para apresentar e acompanhar iniciativas legislativas em áreas como a revisão e alargamento dos prazos de prescrição para crimes de abuso sexual, em particular de menores, ou a criação de mecanismos de apoio psicológico e acompanhamento “aos sobreviventes destes crimes”.

Defenderemos a criação de uma comissão análoga, multidisciplinar, para alargar o trabalho agora iniciado aos abusos sexuais de menores na comunidade e, sobretudo, à sua prevenção”, defendeu Rui Tavares, que sublinhou a importância da educação sexual como ferramenta preventiva para que as crianças saibam identificar abusos.

Quanto à Igreja Católica, o deputado do Livre apontou que é responsabilidade do parlamento fiscalizar se todas as denúncias ainda não prescritas são enviadas para o Ministério Público e se há evoluções no direito canónico “que protejam os menores e combatam e previnam os abusos”.

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Aquilo que, acredito, esperamos todos agora é consequência contra o silenciamento e a impunidade”, disse, defendendo que “o mínimo” seria a constituição de um fundo por parte da Igreja, “para indemnizações, para apoio psicológico, para ações de prevenção”.

Nos pedidos de esclarecimento, a deputada do PS Cláudia Santos defendeu que a primeira resposta “não deve ser apenas mudar a lei para garantir que, daqui a muitas décadas, as vítimas possam levar os agressores a julgamento”.

O que em primeira linha nos deve preocupar é o que podemos fazer para evitar que milhares de crianças podem voltar a ser vítimas de crimes destes. E, se acontecerem, como podemos fazer para que sejam descobertos depressa e não haja crianças a serem abusadas meses ou anos”, disse.

Para tal, a deputada defendeu uma leitura atenta das recomendações do relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica, divulgado esta semana, sobre deveres de denúncia, manuais de boas práticas ou o fim de espaços físicos fechados enquanto locais de encontro e prática religiosa.

Queremos, exigimos que este parlamento pondere futuros programas de cumprimento normativo que sejam vinculativos para organizações que lidem com crianças. Este parlamento não pode bastar-se com respostas fáceis, mas de eficácia questionável”, defendeu.

Pelo PSD, a deputada Paula Cardoso concordou que o que se “impõe é evitar” que estes abusos se repitam e salientou que “para as vítimas o crime nunca prescreve”.

Quanto à Igreja, tirem as suas conclusões e façam a reparação devida às vítimas, mesmo àquelas que não podem ver os crimes tratados em tribunal”, apelou.

A deputada do Chega Rita Matias considerou que os mais de 4.000 casos identificados pela comissão serão “apenas a ponta do icebergue”, dizendo que pode haver “mais de 100 mil casos” de abusos de menores na sociedade portuguesa.

Estão verdadeiramente preocupados em combater este crime abjeto? Alarguem as comissões independentes a todo o tipo de instituições: IPSS, escolas e clubes desportivos e só assim saberemos se estão preocupados em colocar fim a violência sexual”, disse, lembrando que o seu partido defende a castração química para quem praticar este crime.

Alma Rivera, pelo PCP, considerou que o relatório agora divulgado exige “uma intervenção imediata a decisiva” da Igreja Católica e apuramento de todas as responsabilidades que ainda possam ser tratadas na justiça “de forma rápida”.

Não é hábito do PCP apresentar alterações da legislação penal a quente, mas tal não significa uma recusa em equacionar qualquer alteração legislativa para o futuro”, afirmou.

Também o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares considerou que o melhor caminho não será “haver um concurso de prazos ou de propostas” nesta área.

As propostas da comissão independente estão bastante ponderadas, temos inteira disponibilidade para trabalhar sobre essa base”, referiu.

No final do debate, Rui Tavares concordou que a primeira resposta do parlamento “não passa por mudar a lei, mas por algo mais abrangente”.

O Estado ganhará autoridade moral se alargar a comissão para organizações em que há relações entre adultos e crianças”, disse.

O relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja recebeu 512 testemunhos validados, o que permitiu a extrapolação para a existência de, pelo menos, 4.815 vítimas, tendo sido enviados 25 casos para Ministério Público.