Pode parecer quase uma coincidência. Uma obra do acaso, um capítulo do destino. Spoiler alert: não é. E quando se pensa nos objetivos a breve e médio prazo da V Sports há uma letra comum aos seus estados: no passado, tudo começou com a compra do Aston Villa que estava na Premiership e subiu entretanto à Premier League; no presente, o objetivo é garantir 46% do capital social da SAD do V. Guimarães (que só depende da autorização dos sócios do conjunto minhoto); no futuro, a ideia é criar uma nova equipa da Major League Soccer, a Liga de futebol nos EUA, com o nome de Las Vegas Villains. No entanto, as ligações entre os três projetos não se resume a uma questão alfabética e aquilo que foi feito pelos ingleses é também o que está projetado para a formação portuguesa que ocupa nesta fase o quinto lugar da Primeira Liga.

Fundo que detém o Aston Villa com acordo para comprar 46% da SAD do V. Guimarães

Em resumo, a operação que será votada a 3 de março é relativamente simples: a V Sports paga 5,5 milhões de euros ao V. Guimarães, o V. Guimarães cede 46% do seu capital social à V Sports e tem uma injeção que permite não só debelar antigas dívidas (a começar pelo anterior acionista Mário Ferreira, empresário sul-africano que chegou a ter a maioria da SAD através da MAF mas que vendeu à anterior Direção liderada por Miguel Pinto Lisboa 56,84% de ações por um total de 6,5 milhões de euros pagos em tranches que ainda estão a ser liquidadas) como ter dinheiro para aliviar a tesouraria. No entanto, a empresa liderada por Nassef Sawiris e Wesley Edens pode ter maior intervenção caso o plano seja aprovado em Assembleia Geral.

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Um dos pontos em cima da mesa, e que será explicado em várias sessões de esclarecimento aos sócios do V. Guimarães nas próximas duas semanas, está relacionado com apoio para desenvolvimento de infraestuturas num total de dois milhões de euros. No Aston Villa, por exemplo, além da injeção de dinheiro para melhorar a competitividade da equipa rumo a uma subida de divisão que traria ao conjunto de Birmingham muito mais receitas diretas (direitos de transmissão televisiva ou merchandising) haverá também investimentos de monta no estádio com aumento de lotação de 42.682 para 50.000 lugares e uma zona comercial que permita ir amortizando as cerca de 100 milhões de libras (cerca de 112,5 milhões de euros) do projeto. A isso junta-se ainda a possibilidade de abertura de uma linha de crédito limitada mas com juros vantajosos.

Os contactos, como refere o The Athletic e confirmou o Observador, começaram sem sucesso antes da pandemia quando Miguel Pinto Lisboa era presidente do clube minhoto, sendo que o plano de crescimento da V Sports aponta também para outros projetos a médio prazo nos EUA, no Egito (de onde Sawiris é originário) e no Senegal. Além do projeto em si, os proprietários do grupo entendem que o V. Guimarães é o clube ideal para acolher jovens promessas sul-americanas e africanas que por norma se adaptam bem ao nosso país e que assim poderiam “fintar” as limitações regulamentares que existem por exemplo em Inglaterra. Foi com o novo líder, António Miguel Cardoso, que o processo retomou após um momento de aparente desinteresse e entrou numa fase decisiva até ao acordo com intermediação de mais pessoas.

Houve um ponto importante que foi garantido pelo atual quinto classificado da Primeira Liga: mesmo com a venda de 46% do capital social, o V. Guimarães vai continuar a ter a maioria da SAD tendo em conta que o resto de açõs dispersas equivale a pouco mais de 3%. É também nessa base que a verba final ficará pelos 5,5 milhões de euros, com três administradores indicados pelo clube e apenas dois pela V Sports. A decisão passará agora pelo Pavilhão da Unidade Vimaranense e pelo veredicto dos associados dos minhotos.

“É um passo importante para a expansão global da V Sports. A V Sports visa criar sinergias entre os clubes do seu grupo que encorajará a partilha de redes mundiais de scouting, metodologias de treino nas academias, melhores práticas e estratégias de desenvolvimento de academias de jovens em toda a Europa e África”, comentou a empresa que detém o Aston Villa. “A V Sports tem o prazer de ser sócia do Vitória Sport Clube. As negociações, que estão em curso há quase dois anos, progrediram graças aos passos positivos dados pela nova equipa de gestão liderada por António Miguel Cardoso, cuja energia e visão tem sido uma componente crucial para se chegar a este acordo”, realçou um dos sócios da V Sports, Nassef Sawiris. “Desde a primeira reunião descobrimos que o senhor Nassef Sawiris é um homem de sérios compromissos e disponível para ser o parceiro certo que o Vitória precisa neste momento importante da nossa história”, resumiu o presidente do conjunto minhoro, António Miguel Cardoso.

Mas quem são então as duas figuras centrais da V Sports que fizeram as diligências para este acordo? Empresários, milionários, com interesses no desporto e um deles até antigo atleta (neste caso de esqui).

Nassef Sawiris, de 62 anos, é considerado pela revista Forbes a pessoa mais rica do Médio Oriente e tem estado mais ligado ao novo projeto do V. Guimarães, marcando presença no Estádio Dom Afonso Henriques no encontro com o Desp. Chaves que teve um final eletrizante com triunfo dos vitorianos entre dois golos nos descontos. Filho mais novo de Onsi Sawiris, estudou no Cairo e foi depois para a Universidade de Chicago, onde se formou em economia. Segundo a Forbes, lidera empresas como a OCI (uma das maiores produtoras de fertilizantes de nitrogénio do mundo) ou a Orascom Construction (engenharia e construção), tendo em paralelo participações noutras gigantes como a Lafarge Holcim ou a Adidas, onde adquiriu cerca de 6% das ações. No desporto, e além da supracitado Aston Villa, tem mais de 5% da Madison Square Garden Sports, proprietária da equipa da NBA dos New York Knicks e da equipa da NHL dos New York Rangers.

Wesley Edens, de 61 anos, é um bilionário norte-americano que quando era mais novo ainda tentou fazer carreira no esqui antes de se dedicar mais aos estudos e formar-se em Finanças e Administração de Empresas na Universidade de Oregon State. Foi um dos co-fundadores da Fortress Investmen Group (que quando foi aberta ao público tornou-o bilionário) e fundou também a New Fortress Energy, entre outros projetos mais pessoas como o hotel Caldera House ou a estância de esqui de Jackson Hole, no Wyoming. A nível de desporto, e mais uma vez além do Aston Villa, Wesley Edens é, a par de Marc Lasry, um dos proprietários dos Milwaukee Bucks, equipa que se sagrou campeã da NBA em 2021 com a estrela Giannis Antetokounmpo. O empresário tem um negócio onde é sócio de um dos maiores atletas de sempre, Michael Jordan: a Cincoro Tequila. Wyc Grousbeck, Jeanie Buss e Emilia Fazzalari são os outros donos.

Agora, a bola está do lado dos sócios do V. Guimarães, sendo que as sessões de esclarecimento que o líder do clube fará nas próximas duas semanas poderá ajudar a clarificar ainda mais a ligação em causa com a V Sports. “Prefiro estar na posse de todas as informações para depois comentar. Irei solicitar à SAD esclarecimentos sobre um possível negócio mas se os termos do acordo forem aqueles que foram divulgados pelos jornais, então será um negócio à Vitorinha”, comentou António Pimenta Machado, antigo presidente dos vitorianos durante mais de duas décadas (1980-2004), em declarações ao jornal A Bola.

Para mais tarde poderá ficar um outro problema, neste caso recordado pelo Financial Times citando um relatório sobre o futebol europeu da UEFA. “O aumento dos investidores com vários clubes tem o potencial de representar uma ameaça real à integridade das competições europeias de clubes, com um risco crescente de ver dois clubes com o mesmo proprietário ou investidor a defrontarem-se em campo”, advogava o referido texto. Mas esse é outros dos objetivos da V Sports: catapultar o Aston Villa de novo para posições de acesso às competições europeias… que são todas as temporadas uma das metas do V. Guimarães.