A comissão de acompanhamento do PRR considerou, nos investimentos que verificou ao detalhe, dois casos críticos na sua execução. Um deles tem a ver com a capitalização das empresas, que inclui o fundo de capitalização e resiliência. O outro é o metro ligeiro Odivelas-Loures. Há vários outros que têm um selo de execução preocupante. No conjunto de 69 investimentos analisados (de um conjunto de 83 programados), 13 ficaram com o selo de preocupantes e dois em estado crítico no seu desenvolvimento. Mais 21 necessitam de acompanhamento. Só 33 estão alinhados com o planeamento.
Mas além da evolução dos projetos, a comissão fez um conjunto de recomendações para melhorar a transparência dos investimentos, mas também de avaliação. A comissão de acompanhamento, que expressou, em conferência de imprensa, que não lhe compete a auditoria e controlo, revelou também desconhecer o estudo do gabinete do Ministério das Finanças citado pelo primeiro-ministro de que cada euro investimento tem um efeito multiplicador na economia de 5,3 euros.
“Não lemos estudo e não nos pronunciamos”, declarou Pedro Dominguinhos, presidente da comissão na conferência de imprensa para revelar o relatório de acompanhamento anual, referente a 2022. “Quando tivermos acesso poderemos fazer análise”, reforçou, dizendo, no entanto, que parte das recomendações da comissão passa precisamente perceber o potencial impacto que tem em termos de resultados e impactos. “É urgente desde já definir agenda de avaliação dos potenciais impactos e efeitos transformadores”, afirmou o mesmo responsável. A recomendação da comissão vai mesmo no sentido de ser fundamental saber os resultados e os impactos na sociedade, na economia nacional e nos territórios.
A comissão fala, ainda, da questão de comunicação e transparência na divulgação das componentes do PRR. Dá um exemplo: “Não compreendemos que os resultados da avaliação pelo Banco do Fomento [em relação ao fundo da capitalização] não sejam publicados”.
Carlos Farinha Rodrigues, que está na comissão responsável pelas questões sociais, reforça que “a avaliação dos impactos é central no PRR”, lembrando que, no entanto, a Comissão Europeia controla as metas mas “não é a mais interessante avaliação do PRR. Para termos avaliação temos de ver a sua capacidade de transformação, ainda pouco é feito”, e daí a recomendação de criação de indicadores de transformação. Uma das recomendações é mesmo a de, “apesar do reforço da informação no portal Mais Transparência, deve reforçar-se o investimento na sua usabilidade, apresentação gráfica e criação de dashboards e indicadores de execução”. A própria Comissão de acompanhamento pretende lançar um website para a disponibilização de informação.
Em particular nas agendas mobilizadoras, o programas que destina maior volume de investimento às empresas privadas, a comissão fala da necessidade de definir um modelo de acompanhamento. Aliás, nos critérios de avaliação aos projetos, as agendas mobilizadoras receberam da parte da comissão o selo de “necessário acompanhamento”. O relatório concretiza, em particular neste caso, a necessidade de simplificação dos processos administrativos para conseguir um ritmo de execução e pagamentos mais céleres. Mas Pedro Dominguinhos não esconde a necessidade de agilizar processos e garantir, ao mesmo tempo, mecanismos de controlo e monitorização. Admitiu ainda assim, na conferência de imprensa, que até se pode equacionar a extensão de algumas via verdes para os projetos PRR a outro tipo de investimento. Mas não vê que estas regras facilitadas estejam a levar a um facilitismo, até porque, salienta, há organismos que, apesar das regras, não as utilizam, optando por uma “gestão cautelosa”. Também recorda que a tramitação legal passa por um conjunto de entidades mesmo que os projetos financiados pelo PRR tenham ficado libertos da aprovação em conselho de ministros, conforme avançou no Público, na análise à lei de execução orçamental publicada para o Orçamento para 2023.
Uma das propostas para agilizar os processos é ter uma curta (10 dias por exemplo) consulta pública sobre os avisos de abertura dos concursos, antes de serem abertos.
Assim, e conforme divulgou em conferência de imprensa, os aspetos a melhorar e algumas das recomendações feitas pela comissão de acompanhamento passam por:
- Acelerar os processo de decisão de avaliação das candidaturas;
- Agilizar processos de autorizações administrativas e legislativas e promover maior cooperação entre entidades públicas;
- Introdução de mecanismo de consulta pública na preparação dos Avisos;
- Aumentar percentagem de reembolso dos adiantamentos;
- Reforçar e melhorar processo de comunicação;
- Melhoria dos tempos de resposta e reforço da interoperabilidade das plataformas;
- Reforçar a informação territorial dos investimentos e harmonização nos conceitos de reporte por parte dos beneficiários diretos e beneficiários intermédios;
- Definir modelo de acompanhamento das Agendas Mobilizadoras;
- Apesar do reforço da informação no Portal Mais Transparência, deve reforçar-se o investimento na usabilidade, aspeto gráfico e criação de indicadores e dashboard;
- Atendendo ao processo de reprogramação em curso, sugere-se a recalendarização de alguns investimentos, o reforço financeiro, bem como algumas metas;
- Definição de programa e reforço de atividades dirigido à atração de recursos humanos;
- Definição de uma Agenda de Avaliação do PRR, com incidência nos resultados e nos impactos;
- Concretizar a execução do website da CNA-PRR
Dois investimentos em estado crítico
A comissão de acompanhamento classificou dois investimentos em estado crítico. “Em relação ao Metro Ligeiro de Superfície Odivelas-Loures considera-se o andamento dos trabalhos como crítico, sendo necessário intervenção da tutela”, diz a comissão que explica este alerta com a necessidade de se definir financiamento para as autarquias abrangidas, já que do lado do metropolitano de Lisboa o financiamento está garantido.
O outro projeto crítico é o das medidas de apoio à capitalização. “Apesar da abertura demonstrada pela nova administração do Banco Português de Fomento e da dinâmica demonstrada depois da sua tomada de posse”, estas medidas estão em estado crítico, enumerando a comissão as razões:
- baixa procura elegível por parte de empresas não financeiras ao programa de recapitalização estratégica;
- atraso na avaliação das candidaturas elegíveis na janela A;
- atraso no lançamento de outras medidas de apoio à capitalização;
- reduzido número de contratos celebrados;
- baixo montante dos pagamentos realizados;
- inexistência de medidas concretas de investimento na literacia financeira de empresários e gestores de PME e mid caps.
Conforme já referido, a comissão nacional de acompanhamento recomenda, neste âmbito, a publicação das listas de todas as candidaturas do Fundo de Capitalização e Resiliência e da informação necessária “para garantir a transparência do processo de seleção”, assim como a publicação e atualização regular da informação sobre pagamentos efetuados a beneficiários finais quer nos programas de investimento direto quer nos programas através dos intermedários. Quer ainda o envolvimento de todos os atores para melhorar a literacia financeira.
Mas se estes dois projetos estão em estado crítico, há 13 que estão em estado preocupante e três deles são na área da habitação, que o Governo prometeu medidas, tendo lançado um documento de propostas para consulta pública até 10 de março.
“Na habitação o nível de projetos aprovado é baixo face às metas globais, antevendo-se que durante o primeiro semestre de 2023 este número cresça de forma relevante”, salienta a comissão de acompanhamento, falando, no entanto, de uma área com riscos, nomeadamente pelo aumento de preços e falta de mão de obra. É pois uma das áreas em que a comissão diz que se deverá reequacionar as metas e objetivos. “Esta situação leva-nos a considerar este investimento do PRR como preocupante”. Em três vertentes: programa de apoio ao acesso à habitação; bolsa nacional de alojamento urgente e temporário e parque público de habitação a custos acessíveis. Já no alojamento estudantil a custos acessíveis fala na necessidade de acompanhamento. Mas vai mais longe: nesta medida foram assinados 116 contratos, representando 15.800 camas, estando em execução 54 projetos, num total de 5.700 camas. À Rádio Observador, o presidente da comissão falou, também, da preocupação com a evolução dos projetos ligados à habitação.
“Atendendo ao aumento dos custos de construção e ao atraso na entrega de alguns materiais, sugere-se que se possam recalendarizar algumas metas temporais, incluindo-as no processo de reprogramação em curso”. Foi também essa a sugestão por exemplo para a rede nacional de test beds. De qualquer forma, Pedro Dominguinhos deixou para decisão política os financiamentos e os critérios para as reprogramações.
No conjunto, os projetos críticos e preocupantes resultam de atrasos na avaliação das candidaturas; atrasos no lançamento de concursos ou escassez de procura; definição de metas; e custos construção e redefinição de projeto.