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Discreta e em crescimento. Ainda pouco se sabe sobre a “frota-sombra” de petroleiros que parece estar a ajudar a Rússia a escapar às sanções e restrições ocidentais impostas na sequência da invasão da Ucrânia. Opera misteriosamente. Pelas mãos de quem? Não se sabe bem. Mas os sinais das suas operações estão à vista para um número crescente de observadores da comunidade do comércio petrolífero, que têm acompanhado a compra de centenas de navios antigos por compradores anónimos.

O conjunto de navios não se formou do dia para a noite com o início da invasão russa, em fevereiro do ano passado. Com as sanções ocidentais a pressionar a Rússia, um número crescente de navios juntou-se à misteriosa frota, pronta a facilitar as exportações de petróleo russas, descreve a CNN.

Em declarações ao canal norte-ameriano, Matthew Wright, analista da Kpler, faz uma divisão da frota em duas categorias. A primeira, os “gray ships“, embarcações que foram vendidos desde o início da invasão principalmente por proprietários da Europa a empresas no Médio Oriente e na Ásia, que até aí não estavam ativas no mercado de petroleiros. Na segunda categoria estão os “dark ships“, que no passavam fizeram parte de campanhas do Irão e da Venezuela para evitar sanções ocidentais e que, recentemente, mudaram para o transporte de petróleo russo.

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O número total de embarcações envolvidas não é conhecido, mas a multinacional Trafigura lançou este mês uma estimativa: 600. Nesse total, estão cerca de 400 navios de petróleo bruto, ou 20% da frota global, que trocaram os comércios tradicionais para fazer “ostensivamente negócios russos”, disse em entrevista à Bloomberg Ben Luckock da Trafigura. Os restantes correspondem a cerca de 200 petroleiros, ou 7% do total mundial. Os números, segundo alguns observadores, estão a crescer.

No passado, tínhamos o Irão e a Venezuela com uma frota-sombra relativamente pequena (…). Este fluxo russo é muito diferente: é enorme”, descreveu Luckock.

Uma contagem do VesselsValue, que trabalha dados no setor marítimo, apontou que, em 2022, mais de 100 navios de transporte de petróleo e combustíveis foram vendidos a compradores anónimos, frequentemente a preços exorbitantes. Muitas destas embarcações foram adquiridas por entidades desconhecidas sediadas em zonas como o Dubai, Hong Kong, Singapura ou Chipre, revelou ao Wasghinton Post Svein Moxnes Harfjeld, chefe executivo da empresa petrolífera DHT Holdings Inc. Segundo o representante, muitas das firmas por trás destas operações estão a ser financiadas pelo capital russo.

Como pode a frota-sombra afetar as sanções?

Como resposta à invasão da Ucrânia os aliados de Kiev avançaram com medidas para proibir ou restringir as importações de petróleo russo e derivados. A União Europeia, por exemplo, estabeleceu no sexto pacote de sanções a proibição, aquisição, importação ou transferência de petróleo bruto transportado por mar e de determinados produtos petrolíferos da Rússia para a UE. O bloco comunitário também chegou a acordo para impor um teto de 60 euros às comprar de petróleo russo, na sequência de uma decisão adotada pelo G7.

UE chega a acordo para impor teto de 60 euros às compras de petróleo russo

Em resposta a estas medidas a Rússia procurou compradores alternativos e outras formas de lhes fazer chegar os produtos. Procurando evitar recorrer a navios ocidentais e preferindo os mercados na China e na Índia por oposição aos europeus, Moscovo viu-se confrontada com uma frota nacional com embarcações insuficientes. Para enviar petróleo em viagens mais longas, a Rússia passou a precisar de quatro vezes a capacidade de transporte que tinha antes da invasão, apontou a EA Gibson, citada pela CNN. É aí que entra a “frota-sombra”.

Como é que isso afeta as sanções ocidentais? À CNN alguns especialistas indicaram que a frota-sombra pode estar a facilitar a capacidade da Rússia evitar as restrições ou vender os produtos acima do teto de preço imposto pelo ocidente.

A aplicação das medidas está dependente da transparência dos operadores de navios sobre as suas propriedades e os produtos que transportam, bem como a sua origem. Se o proprietário de um navio for difícil de rastrear e operador abdicar de um seguro segundo os padrões internacionais pode conseguir contornar os limites de preço do petróleo, aponta ainda o Washington Post. Além disso, este tipo de embarcações também pode transportar petróleo russo para compradores de países que preferem manter os negócios com Moscovo fora de vista.

A segurança do transporte também é um fator preocupante. Acredita-se que uma parte significativa da frota seja formada por embarcações com mais de 15 anos, limite a partir do qual as empresas geralmente deixam de usar os navios devido ao desgaste. “Temos embarcações antigas que provavelmente não estão a ser mantidas no níveis próprios. A probabilidade de ocorrer um grande derramamento ou acidente cresce de dia para dia, à medida que esta frota aumenta“, disse ainda Richard Matthews, da EA Gibson.

Além disso, a expansão da frota-sombra também é sinal das mudanças que a invasão da Ucrânia trouxe para os mercados globais de petróleo, criando uma divisão. “Há uma frota que não está a fazer nenhum negócios russo e há a frota que está quase exclusivamente a fazer negócios russos”, resumiu o especialista.