Um livro sobre a história da Saúde Pública em Portugal, coordenado pelo médico Francisco George, recorda crises passadas — como a peste, a sida ou a Covid-19 — para alertar que o país precisa de se preparar para futuras pandemias.

O livro, que conta com o contributo de especialistas de diferentes áreas, como os médicos Constantino Sakellarides, Raquel Duarte ou o psiquiatra José Caldas de Almeida, constitui o primeiro volume de uma coletânea de saúde pública que será lançada a partir do trabalho da recém-criada Sociedade Portuguesa de Saúde Pública, presidida por Francisco George.

Intitulado “Saúde Pública em Portugal – Do século XIX ao novo ‘millenium’ até ao futuro”, será lançado na segunda-feira na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Trata-se de uma obra coletiva que reflete a história da Saúde Pública desde o seu começo, em 1850, e que vai até ao novo milénio, aos dias de hoje, mas prossegue até ao futuro em termos de antecipar aquilo que irá acontecer nas próximas gerações”, disse à agência Lusa Francisco George.

Neste volume, adiantou, são descritos e analisados os problemas de saúde pública que surgiram em Portugal desde 1850, nomeadamente as epidemias de cólera, de febre-amarela, mas também de tifo, da peste no dobrar do século, no Porto, em 1899, até à sida e à covid-19.

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O antigo diretor-geral da Saúde destacou a evolução “muito significativa” da Saúde Pública, comentando que “os problemas de hoje são diferentes dos problemas de há 150 anos e naturalmente vão ser diferentes daqui a 150 anos”. “Há toda uma evolução que tem de ser antecipada a fim de podermos proteger a saúde dos filhos, dos netos e dos bisnetos e este volume trata exatamente dessa situação”, salientou.

Para tal, defendem os especialistas no livro, “há que observar, antes de tudo, como princípio maior: nada fazer, hoje, se prejudicar a saúde de quem vem a seguir. Só assim aqueles que irão nascer a partir de 2023 poderão ter uma vida prolongada com qualidade e saúde”. “É uma questão de herança que os de hoje deixam aos de amanhã. Legado que depende, sobretudo, das opções tomadas pelos cidadãos e pelos governantes que os representam”, sustentam.

Advertem ainda que “à semelhança dos gases poluentes que fazem efeito em todo o planeta, também um foco de doença transmissível, em aldeia remota de qualquer país, pode assumir características pandémicas. Por isso, há que agir e pensar no planeta Terra”. “As políticas, as medidas tomadas por cada setor, devem, previamente, equacionar a eventualidade de serem geradoras de riscos para o futuro, mesmo que beneficiem o presente”, alertam ainda.

Questionado sobre as lições que a pandemia de covid-19 deixou para o futuro, Francisco George afirmou que “Portugal tem de estar sempre preparado para eventuais novos fenómenos que venham a acontecer com expressão pandémica, mas que representam riscos em Portugal”.

E por isso, em termos de plano de contingência, não só é preciso desenhar esse plano, mas sobretudo mobilizar meios desde já capazes, no caso de necessidade, de assegurarem a concretização daquilo que o plano prevê”, disse, avisando que não se pode “ignorar a probabilidade, que é muito grande, de surgirem outros problemas análogos de natureza viral”.

No capítulo “Desafios para o futuro. Uma nova era”, os especialistas falam nos avanços alcançados como a transformação da sida numa doença crónica pela terapêutica inovadora, a cura da hepatite C ou novos medicamentos biológicos para o cancro, mas ressalvam que estes avanços não são “nem os últimos, nem suficientes para ganhar desafios futuros”.

É preciso ir mais longe. Os antibióticos estão em risco, devido à propagação de bactérias resistentes, nomeadamente associadas à prestação de cuidados de saúde. As resistências passam a interessar às doenças infecciosas, quer provocadas por bactérias, por vírus, fungos ou protozoários. Constituem um dos mais importantes duelos com o futuro”, alertam no livro.