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De Sevilha a Nova Iorque e das passerelles ao Instagram. Os 80 anos da modelo, musa e stylist Naty Abascal

Este artigo tem mais de 1 ano

Jantares com Dali, dias no iate de Valentino, desfiles em Paris. A vida de Naty Abascal dava uma série. Passou de modelo a diva, foi duquesa, viveu um escândalo e esteve sempre dedicada ao trabalho.

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Quem pisca o olho à imprensa espanhola já se terá cruzado com Naty Abascal. Não será preciso confessar-se já leitor da Hola! porque esta mulher, com um constante ar de diva, é muito mais do que uma socialite. Na década de 1960 saltou da sua Sevilha natal para Nova Iorque porque os fotógrafos de moda fizeram da sua aparência uma beleza exótica. Em 1964, o New York Times terá escrito sobre uma modelo espanhola “que mudava tão rápido de roupa que estava sempre na passerelle”, contou Naty Abascal à Vanity Fair. “Ninguém suspeitava que se tratava de duas pessoas: a minha irmã gémea Ana Maria e eu.”

Do epicentro cultural e artístico da cidade norte-americana voltou a Espanha na década seguinte. Casou, tornou-se duquesa de Feria, formou família. Depois, tudo se desmoronou e seguiu-se um dos escândalos que abalou Espanha nos anos 90. Que o ar soberano e porte aristocrático não criem ilusões de contos de fadas. Depois da sua carreira de modelo, Naty Abascal fez da moda o seu reino e continuou a trabalhar, entre ambientes luxuosos e tarefas que a fazem arregaçar as mangas dos seus trazes de Alta Costura para alcançar o perfecionismo. Até nos esquecemos que completa 80 anos a 2 de abril.

Mais do que modelo, foi musa e amiga dos designers

A carreira de modelo de Naty Abascal começou pela mão do designer de moda espanhol Elio Berhanyer, na altura o costureiro mais famoso da alta sociedade espanhola, que convidou Naty e a irmã gémea Ana Maria para serem modelos das suas criações na Exposição Mundial em Nova Iorque em 1964, tinham 21 anos. O fotógrafo Richard Avedon viu as irmãs e quis fotografá-las para a Harper’s Bazaar com a diva Elizabeth Taylor e a bailarina Maya Plisétskaya, num trabalho com o nome “Magic Beauties”. Fotografou também as irmãs em Ibiza nesse mesmo ano para um editorial da mesma revista com o nome “The Iberians”. No ano seguinte, Naty foi capa da edição de maio, numa imagem também com assinatura de Avedon. A partir daqui a carreira de modelo estava lançada.

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“Em pouco tempo, Dick [como trata Richard Avedon] decidiu viajar a Ibiza…Ibiza em 1964! O paraíso perdido! Ali converteu-nos em duas mulheres exóticas, misteriosas, a jogar às cartas na praia, a fumar com boquilha e acompanhadas por um enigmático brasileiro vestido com uma túnica com capuz. Recordarei sempre esta cena de ‘O Sétimo Selo’ de Ingmar Bergman em que a morte fala com Max von Sydow, só que o nosso brasileiro não tinha uma foice mas uma beleza que te deixava sem respiração. Isto era trabalhar com Avedon”, conta Naty Abascal.

Eileen Ford, a diretora da agência Ford Models, viu-a e não a deixou escapar. “Fica, todos te querem”, terá dito a Naty, e esta mudou-se para Nova Iorque. Disse aos pais que ficaria por lá uma semana, mas acabou por ficar dois anos e meio. Assinou contrato com aquela agência e trabalhou também com a Wilhelmina, duas bem conhecidas e prestigiadas agências de modelos norte-americanas. “Viajavas a todo o lado e conhecias gente interessantíssima. Podias estar num dia com Mick Jagger, outro com Dali, outro com Óscar… Naquela época, Nova Iorque era o sítio mais livre do mundo”, disse Naty em entrevista à Telva. Mas há um nome que destaca, Salvador Dali, com quem jantava todas as semanas quando vivia na cidade cidade norte-americana, e foi o artista que a colocou num macacão branco e fez dela tela para um anúncio publicitário do digestivo Alka Seltzer. “Dali. Era incrível. Gostava de sair, divertir-se, estar com gente jovem. Ligava-me e dizia: ‘Vem, vamos almoçar e traz amigos teus’. Ele vivia no hotel St. Regis e fazia umas festas estupendas lá.”

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Naty Abascal com Karl Lagerfeld. © Getty Images

Andy Warhol prometeu pintá-la, mas nunca chegou a acontecer porque a musa voltou para Sevilha e já não se cruzaram mais em Nova Iorque. Com Woody Allen participou no filme “Bananas”, de 1971, no papel de Yolanda, uma “guerrilla girl”. Nesse ano posou para o número de julho da Playboy e foi capa da revista Interview de Andy Warhol. Os fotógrafos queriam captar a sua figura singular. “Todas eram loirinhas, pequeninas… Eu era um pássaro exótico, com o meu nariz, morena”, confessa Naty ao El País sobre o que a tornava diferente e fascinante naquela época em que a diversidade ainda não estava na agenda mediática. Foi fotografada por Norman Parkinson em 1982, nas Caraíbas, para a revista Town & Country, e por Lord Snowdon, em 1987, em Sevilha. Mesmo depois do fim da carreira de modelo, foi como se nunca tivesse deixado de fazer capas e editoriais. Entre tantos outros exemplos, já nos seus 70’s, foi primeira página da Telva e da Vanity Fair Espanha, ambas com produção fotográfica e longos textos, porque afinal, além de manter uma extraordinária figura, a musa tem também uma história de vida para contar. Não esqueçamos, claro, as inúmeras capas da Hola.

Trabalhou com Óscar de la Renta desde o início da carreira do designer, quando o criador ainda trabalhava para Elizabeth Arden. Com Valentino a relação é especial. Conheceram-se em 1965 em Nova Iorque. Naty conta que começaram a ir a museus e jantares e depois começou a desfilar para o italiano. “Desde então temos sido inseparáveis.” Valentino considera-a como uma irmã. É frequente ver Naty a bordo do iate de Valentino e Giancarlo Giammetti pelas águas do Mediterrâneo no verão, porque ela própria partilha os momentos na sua conta de Instagram, mas também os vemos juntos na neve em Gstaad.

Valentino Garavani. A sofisticada “la vita in rosso” do imperador da moda

Uma princesa da moda sem conto de fadas

Natividad Abascal y Romero-Toro nasceu a 2 de abril de 1943 em Sevilha, numa família de 11 irmãos — entre estes tem uma irmã gémea, Ana Maria. O pai, Domingo Abascal, era um advogado bem sucedido e dono de um extenso olival. A mãe, María Natividad (ou Natuca, como lhe chamavam os seus íntimos), era filha do marquês Romero-Toro, foi a primeira mulher que se atreveu a abrir uma loja em Sevilha e era considerada uma das mais elegantes da cidade. No Dia da Mãe em 2021 (que, tal como em Portugal, se celebra no primeiro domingo de maio) partilhou uma fotografia da matriarca na conta de Instagram, que disse em entrevista ter sido “um exemplo em tudo”, e que morreu em 2005, com 88 anos.

Em 1971, Naty casou-se com o escocês Murray Livingstone Smith, que era vice-presidente de uma agência de publicidade. Separaram-se em 1975. O segundo casamento foi mais longo, mas também mais complicado. Em 1976, Naty Abascal regressou a Sevilha, já solteira, porque o pai estava doente e ficou por lá de vez. Reencontrou-se com um antigo namorado de adolescência, Rafael Medina y Fernandez de Cordoba, duque de Feria e marquês de Villalba. Casaram-se em 1977 e tiveram dois filhos: Rafael, a 25 de setembro de 1978, que é o atual duque de Feria, e Luís, a 20 de agosto de 1980. A modelo deixou a moda para se dedicar à vida familiar. Naty e o marido divorciaram-se em 1989, mas só em 1993 viria a rebentar o escândalo.

Em março, o duque foi preso por rapto de uma menina de cinco anos e tráfico de drogas. No mesmo ano foram publicadas na imprensa fotografias do duque com duas meninas com idade inferior a 12 anos e foi acusado de novo delito contra menores. Acabou por ser condenado a 18 anos de prisão, pena que viria a ser reduzida para nove. Em maio de 1998 saiu da prisão em liberdade condicional, mas em apenas 10 dias regressou por ter conduzido embriagado e ter ferido três mulheres nas ruas de Sevilha, relata o El País. Seguiram-se tentativas de suicídio, e a 6 de agosto de 2001 Rafael Medina foi encontrado morto em casa, com uma overdose de barbitúricos. O duque de Feria é um título com raízes em Espanha e com casa senhorial em Sevilha, a Casa de Pilatos, o Palácio dos Medinaceli, o que contribuiu ainda mais para o mediatismo em torno do escândalo que envolveu o duque.

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Naty Abascal na década de 1990. © Getty Images

A preocupação de Naty foi afastar os filhos adolescentes do escândalo — mandou-os estudar para os Estados Unidos. Durante esse tempo viveram na casa do designer Óscar de la Renta. Naty não tinha fortuna própria, por isso contou com a ajuda do seu círculo de amigos e reinventou-se. Continuou com a sua vida e com o seu trabalho. “Eu gosto de trabalhar. Foi o que me salvou nos momentos difíceis da minha vida. Agora tudo é a cultura do menor esforço. Eu não sou assim, levo muito a sério o que faço. Nas produções de moda, por exemplo, fico obcecada para que tudo esteja perfeito e ir melhorando dia a dia”, disse à Telva.

Com os filhos a relação manteve-se próxima ao longo dos anos. Naty Abascal foi a madrinha e uma das estrelas do casamento do filho mais velho, em 2010. O empresário casou-se com Laura Vecino, que na altura era diretora de estilismo da Mango e atualmente tem a sua própria marca de roupa. A celebração teve lugar no Palácio Tavera, um espaço com ligações à família do noivo, em Toledo, e foi um acontecimento social em Espanha, com cerca de 700 convidados. Dois anos depois foram pais de um casal de gémeos a quem deram os seus nomes, Rafael e Laura. A avó conta que os netos a tratam por “abu”. Já o filho mais novo, tem dado à mãe motivos de preocupação. Desde há um ano que está envolvido num caso de justiça em que é acusado de ter lucrado milhões de euros em comissões na venda de material sanitário com defeito para a autarquia de Madrid durante a pandemia.

Do museu para a estante, as homenagens a uma musa espanhola

“Olha Naty, estou convencida de que se tivesses nascido nos Estados Unidos ou em Inglaterra te teriam feito uma exposição no Metropolitan em Nova Iorque ou no Victoria & Albert Museum. Nasceste em Espanha e eu estou orgulhosíssima de que esse reconhecimento te dê a Telva”, disse Olga Ruiz, a diretora da revista espanhola, quando se encontrou com Naty para uma primeira abordagem a uma exposição de moda em jeito de homenagem. E assim foi. Entre 10 de outubro e 2 de dezembro, a Real Academia de Belas Artes de San Fernando, em Madrid, recebeu a exposição “Uma crónica de moda. Coleção Naty Abascal”.

Estiveram ali reunidos mais de 60 looks vindos dos diferentes armários da diva. “Vimo-la subir aos mezaninos da sua casa em Sevilha para ir buscar peças dos anos 60 e 70 que sabe que tem e que precisávamos ver em que estado estavam, para ver se era necessário conservá-las, restaurá-las…” conta Olga Ruiz. “Vimo-la atirar-se ao chão para ir buscar livros de arte, livros de fotografia. Vimo-la rebuscar entre as pilha que tem de livros, um livro concreto que alguém lhe tinha dedicado.

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Naty Abascal num baile da casa Dior em 2017, em Madrid. © Getty Images

A exposição, dividida em cinco temas (paixão, amizade, única, admiração e sempre), foi um percurso pela vida de Naty através de peças de roupa, acessórios, fotografias do seu tempo de modelo, objetos de decoração e muitos livros, sobretudo de arte e nos quais se inspira, tudo seu. Balenciaga, Givenchy, Armani, Valentino, Óscar de la Renta, Yves Saint Laurent, Elie Saab ou Cavalli são nomes dos autores das criações expostas, mas também figuras da vida da diva. Afinal, poucas pessoas terão um universo pessoal que junte Alta Costura, Pop Art e fotógrafos de alta sociedade. Entre as peças em exposição, Naty escolheu um vestido da última coleção de Alta Costura de Valentino e um vestido que Óscar de la Renta lhe ofereceu em 1965. “Meu Deus, o que dancei e o que me diverti dentro deste vestido! Repararam-no com muita paciência umas quantas vezes, porque a Alta Costura é tão fascinante como delicada. Mas uma peça de roupa é isto: o que viveu contigo.”

O tributo a Naty Abascal rumou depois à Cidade do México e o Museu Jumex foi palco da exposição “Naty Abascal ¡y la moda!” entre 7 de novembro de 2019 e 5 de janeiro de 2020. Tal como uma caixa de Pandora, mas neste caso com salero e glamour. Assim que se abriu o armário de roupa e memórias de Naty Abascal o seu efeito tornou-se incontrolável. Em 2021 foi a vez da editora Rizzoli publicar um livro dedicado à diva espanhola Naty Abascal: The Eternal Muse Inspiring Fashion Designers, tendo por base a exposição do México. Suzy Menkes, Mario Testino, Christian Lacroix, Valentino Garavani e Vicente Gallart dedicaram-lhe textos. Não foi a primeira publicação da musa. Em 2013 tinha lançado um manual de estilo com o  nome 100% Naty.

E… de repente já nos 80

Naty Abascal não vive nas gloriosas memórias do passado. É constantemente descrita como muito trabalhadora e, prestes a cumprir 80 anos no dia 2 de abril, continua ativa como sempre. Modelo, stylist, consultora e até influencer, Naty tem muitas facetas e a sua conta de Instagram é a prova disso. Mesmo não sendo nativa da época das redes sociais nem sequer das tecnologias, fez destas hábeis ferramentas de trabalho. Tanto a vemos na semana da moda de Paris, como em eventos, na sua própria casa a mostrar um novo produto de uma marca ou mesmo só a decoração. Também partilha as paisagens de que desfruta nas suas férias com uma notória preferência por destinos de praia, e não é raro encontrar por lá imagens do Algarve, uma vez que Naty virá com frequência a Portugal.

“Na Naty, até os laços do cabelo são Alta Costura”, terá dito o amigo Valentino, mas a magia inata que a diva tem para lidar com a moda não se limita a escolhas de luxo. Tão depressa usa uma criação exclusiva como peças da Zara, e é no saber fazer esta mistura com personalidade que reside parte do seu encanto. “A moda não perdoa e esquece a s pessoas muito rápido. A moda exige muitos sacrifícios, a moda não tem horários, a moda obriga-te a marcar prioridades na tua vida e um dos maiores sacrifícios que exige é a família, porque nem sempre podes dedicar-lhe todo o tempo que querias”, explica Naty, mas há também o lado de criar do qual não abdica. “A criatividade mantém-te vivo, incita-te a descobrir coisas. Eu não o trocaria por nada.”

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