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As regras, as tradições e as exigências em volta dos cavalos reais: Pedro Foles, um cavaleiro português ao serviço de Sua Majestade

Este artigo tem mais de 6 meses

Pedro Foles foi cavaleiro na casa real inglesa e conduziu as carruagens que transportavam Isabel II várias vezes. Na véspera da coroação de Carlos III fala ao Observador sobre os cavalos reais.

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Pedro Foles a conduzir a carruagem que transportava os então príncipe Carlos e a duquesa Camilla a caminho da abertura do parlamento britânico, em 2015

AFP via Getty Images

Pedro Foles a conduzir a carruagem que transportava os então príncipe Carlos e a duquesa Camilla a caminho da abertura do parlamento britânico, em 2015

AFP via Getty Images

Pedro Foles foi cavaleiro ao serviço da casa real britânica durante cerca de oito anos. Começou na semana a seguir ao casamento do príncipe William com Kate Middleton, em 2011. Esteve no Palácio de Buckingham durante cinco anos e, depois, passou para o Castelo de Windsor, onde esteve mais dois. “Todos os cavalos que participam em cerimónias oficiais ativamente estão no Royal Mews”, em Buckingham. Ali trabalham várias pessoas e vivem 35 cavalos que todos os dias treinam nas ruas de Londres, no meio do trânsito e da confusão da cidade. É deste grupo que foram escolhidos os cavalos que vão puxar a famosa carruagem dourada com Carlos e Camilla coroados novos reis.

Em conversa com o Observador, Pedro Foles, que conhece bem alguns dos cavalos que estão no ativo, arriscou dizer que o Milford Haven e o Tyrone iriam puxar a Golden State Coach. Por coincidência, horas depois da nossa conversa, a casa real desfez as dúvidas e publicou os nomes e fotografias dos oito cavalos encarregues de transportar os reis. Afinal, também eles serão protagonistas deste dia.

Foi a propósito dos cavalos que, durante o seu tempo ao serviço da casa real, Pedro Foles contactou de perto com a Rainha Isabel II e o príncipe Filipe. Diz que foram os membros da família real com quem mais contactou e que era muito fácil manter uma conversa com ambos sobre cavalos. “A Rainha era uma grande apaixonada e percebia imenso de cavalos.” Conta que, com a Rainha Isabel II, estava mais ou menos a cada 15 dias ou quando não estava em visitas oficiais e que se notava que era realmente feliz ao pé destes animais. “Tinha muito conhecimento técnico, tinha uma memória incrível e sabia imensa coisa que nos surpreendia”, além disso, participava nas escolhas dos cavalos. “Cada vez que nascia um cavalo o “farm manager” ligava para a Rainha a dizer que tinha nascido um potro novo, filha desta égua e daquele cavalo, e a Rainha dava o nome”, conta Pedro. Muitos foram batizados com nomes de cidades, por exemplo Sydney ou Melbourne, e com nomes de cidades inglesas também. E a Rainha conhecia todos os cavalos pelo nome. “Tinha uma memória incrível.” Agora a tarefa cabe ao Rei Carlos III.

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No Castelo de Windsor contactava diariamente com o príncipe Filipe. O antigo consorte “tinha um pátio com uma equipa só dele que estava ao lado da nossa e ele todos os dias à tarde ia ver os cavalos dele e foi aí que começámos a falar mais, sobretudo, sobre cavalos”, conta Pedro Foles. Contudo, mesmo numa conversa descontraída sobre um dos temas que apaixonava o casal real, o protocolo nunca é posto de lado. Quando começou a trabalhar na casa real, o cavaleiro teve duas semanas de formação em protocolo, como mandam as regras para todos os funcionários. A Rainha era sempre tratada por “Maam”, nunca ninguém se deve dirigir a ela e era sempre a monarca que começava a conversa, nunca ninguém lhe podia tocar, tinha de ser feita uma vénia no início e outra no fim e o príncipe Filipe era tratado por “His Royal Highness”. E nenhuma das regras pode ser quebrada, seja qual for a conversa.

Com o atual Rei, que quando o cavaleiro trabalhava na casa real era ainda o príncipe de Gales, a relação era muito circunstancial, viam-se duas a três vezes por ano. E com os príncipes William e Harry, uma a duas vezes por ano. Pedro Foles participou em cerimónias muito mediáticas, como por exemplo no jubileu de diamante (em 2012) e nas aberturas do parlamento. “Durante muitos anos fui o condutor oficial do príncipe Carlos e da duquesa Camilla, nessa cerimónia.” Também conduziu ilustres membros da realeza nas corridas de Ascot, nomeadamente a Rainha Isabel II.

Na propriedade de Buckingham, na lateral do palácio, é onde estão os Royal Mews, estábulos reais ativos, que também servem de museu que pode ser visitado todo o ano e onde podem ser vistas tanto as carruagens que são usadas nas cerimónias oficiais, como os cavalos. Ali o trabalho está dividido entre equipas. “Cada equipa tem um manager e tem à volta de sete a oito pessoas e depois existe uma equipa só de conservação e restauro das carruagens,” explica Pedro. As três equipas estão divididas pela equipa que era a da Rainha, e agora é do Rei, e era nesta que Pedro trabalhava, com os cavalos ruços ou brancos, os Windsor Grey, que são assim denominados porque foram os cavalos que a Rainha Victoria começou a utilizar em Windsor. Manda o protocolo que sejam estes cavalos a puxar as carruagens do Rei. Todos os outros cavalos que vão puxar as carruagens dos membros juniores serão castanhos.

Existem mais duas equipas, que são de cavalos castanhos, os que eram utilizados por outros membros da família real ou por convidados. “O dia a dia começava às seis da manhã, havia um treino matinal até às sete e meia, depois havia uma paragem para pequeno almoço. Seguia-se um treino dos cavalos, seja em atrelado seja dentro do picadeiro ou nas ruas de Londres, até por volta das duas da tarde. O dia acabava por volta das quatro.”

Uma das cerimónias que acontecia com mais regularidade era o transporte de embaixadores, lembra Pedro. “Um embaixador quando chega a Londres tem de ir apresentar as suas credenciais ao Rei, neste caso, e a casa real faz a oferta de serem transportados da embaixada até ao Palácio de Buckingham nestas carruagens. Esta é a cerimónia mais comum.” Depois há que acrescentar ao trabalho dos cavaleiros e dos cavalos as visitas de Estado e a abertura do parlamento, entre outras.

Pedro Foles conta que, quando fez tudo o que havia para fazer no seu trabalho em Londres, lhe foi proposto “um desafio novo” de ir para Windsor e aceitou, porque gostava de trabalhar com cavalos novos e fazer gestão de coudelaria. Diz que gostou muito do trabalho que fez em Windsor, mas gostou mais de viver em Londres. “Em Buckingham, o que fazíamos era o treino diário dos cavalos e a condução de atrelagens em cerimónias oficiais e em Windsor, além de continuar a participar nas cerimónias oficiais, fazia o treino prévio de todos os cavalos novos e a gestão da coudelaria de cavalos localizada e a gestão de uma pequena parte agrícola de cavalos localizada também.”

No Castelo de Windsor é onde estão os cavalos jovens e é lá que começam a ser treinados, durante um ano ou um ano e meio, até estarem aptos a irem para Buckingham, onde “começam a sua vida, digamos, profissional”, explica o cavaleiro. “As cerimónias oficiais são cerimónias de muito barulho, stress e confusão, os cavalos têm de estar preparados para isso. Precisam de um treino prévio durante algum tempo para depois poderem participar nas cerimónias e poderem estar em Londres.” O final do treino o primeiro teste dos animais em grandes eventos são as corridas de Ascot. Numa espécie de celebração de fim de curso para os jovens cavalos, cabe-lhes transportar os membros da família real no desfile que percorre a pista do famoso recinto de corridas.

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Manda a tradição britânica que tudo seja pontual e irrepreensível. Por isso, como lidar com estas situações que estão a ser observadas por todo o mundo? Pedro diz que o segredo está no treino, que nos Royal Mews era “muito intensivo e muito metódico”. Explica que todas as cerimónias importantes são treinadas de madrugada dias antes do grande dia. E assim foi também com a cerimónia de coroação, que teve o seu ensaio completo durante a noite de terça para quarta-feira desta semana. “Estas cerimónias são muito intensas, porque têm muito, muito público, há um barulho ensurdecedor, há helicópteros a filmar. São cerimónias que têm de ser bem preparadas e são para pessoas e cavalos com muita experiência.” Não revela nenhum episódio inesperado, porque diz que quando tal acontecia estavam preparados para resolver e nunca se chegava a perceber que alguma coisa tinha ocorrido.

Apesar de serem sujeitos a duras provas de resistência e, já agora, de terem de mostrar grande sentido de estado durante as cerimónias oficiais, os cavalos têm direito a uma folga. “Vão para Hampton Court, para o campo durante umas semanas para descansarem e relaxarem antes de voltarem ao trabalho”, explica Pedro Foles. “É importante terem um tempo em que estão só a ser cavalos e estão no meio do campo, em que não há barulhos, para depois voltarem com vontade.” E vale a pena acrescentar que no verão também têm direito a férias.

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Pedro Foles conta que sempre montou a cavalo. Formou-se como treinador e tirou um curso de técnico de gestão em Portugal. Trabalhou como cavaleiro profissional tanto por cá, como em Itália e em Espanha, ao mesmo tempo que tirou um curso em Agronomia e uma pós-graduação em gestão. A dada altura decidiu ir para Londres em busca de um trabalho como cavaleiro num picadeiro nos arredores da cidade, não como cavaleiro da família real. Contudo, antes de partir respondeu a um anúncio para um cavaleiro para a casa real que viu no site da revista “Horse & Hound”. Nunca pensou que tal se viesse a tornar realidade, mas ao fim de três meses de recrutamento ficou com o cargo.

Ao fim de alguns anos diz que decidiu sair. “Chegou o momento de constituir família, achei que tinha tido um percurso muito interessante, queria começar a trabalhar como agrónomo e que era o momento ideal para o fazer.” Explica que era uma altura de fim de ciclo e que queria regressar a Portugal e assim o fez em 2019, com boas memórias na bagagem e uma série de momentos vividos com a Rainha Isabel II, que chegou a partilhar com o Observador quando a monarca morreu.

Atualmente, é diretor executivo de um fundo de investimento agrícola que faz gestão agrícola. Está sediado no Alentejo, mas viaja com frequência a Londres onde se encontra com os amigos que fez por lá e visita os Royal Mews. E será que vai assistir à coroação no próximo sábado e ver os cavalos com que costumava trabalhar diariamente? “Acho que sim. Não posso assistir muito porque fico nostálgico.”

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