Podia ser apenas um concurso de dança no país do pai. Ou podia ser muito mais. Uma conversa e uma proibição deixavam antever que o “Let’s Dance” alemão iria servir para Anna Ermakova, a filha do famoso ex-tenista Boris Becker, dizer alguma coisa ao mundo. A modelo ruiva não só se tornou numa dancing star na Alemanha ao vencer na sexta-feira a competição, como provou que é muito mais do que o resultado de uns minutos de sexo nuns arrumos de um restaurante mítico de Londres, há 23 anos.

Primeiro a frase: antes da 16.ª edição do “Let’s Dance”, Anna referiu a sua “notoriedade involuntária” no podcast oficial do canal de televisão alemão RTL, para mostrar o desconforto de ser sistematicamente confrontada com a forma como foi gerada. Durante anos foi a “bebé do encontro no quarto das vassouras”, o que a levou a construir um muro que queria derrubar no concurso de dança. Ou seja, não era apenas tango e valsa, era também um acerto de contas com a sua história familiar.

Aliás, o seu par, Valentin Luisin, acrescentava no início da semana do concurso que a música “Behind blue eyes” que iam dançar era “muito emocionante, fala do jogo de aparências, a fachada, e o que está por trás dela”, cita-o o site alemão TVmovie.

O par ultrapassou todas as expectativas. Recebeu inúmeros elogios do júri pela prestação que foi tendo ao longo das 11 provas onde bateu o recorde ao receber 30 pontos em cada uma. E uma declaração do jurado principal que dizia tudo: “Conseguiu livrar-se de todo o seu legado neste espectáculo, tudo o que foi escrito nos últimos 23 anos.” Um outro elemento do júri já tinha dito que a modelo era “o exemplo vivo de que não somos a nossa história”. E rematou “Acabou de jogar tudo o que já foi dito sobre si pela janela”.

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E isto prende-se com a proibição que Anna Ermakova fez à produtora do programa: em momento algum, o nome do pai poderia ser mencionado ou seriam alvo de uma pesada multa. Uma exigência que surgiu talvez por Anna não querer ser uma “nepo baby”, expressão que atira para a palavra nepotismo, ou talvez porque não queria ser lembrada uma vez mais de quem era filha e das circunstâncias em que foi gerada.

“Quando eu era pequena, não entendia por que havia tanta imprensa ao meu redor”, disse Ermakova. “Sentia-me observada o tempo todo.” Na adolescência, esse sentimento transformou-se em insegurança. “Pensei que tinha que ser alguém que não sou”, confessou. Sofria com o facto de as pessoas terem sempre uma opinião sobre si. “Então retirei-me, não queria ser eu mesma e escondi-me”. Até ao “Let’s Dance”.

Até aqui, Anna era conhecida pelo que acontecera no mítico restaurante de luxo Nobo, na capital britânica.  A história foi confirmada pelo próprio Becker num documentário que esteve este ano no Festival de Cinema de Berlim, “Boom! Boom! The World vs Boris Becker” e já estava presente na sua autobiografia “Hold On, Stay a While”, em 2003, referida pelo The Guardian.

O que se passou conta-se em poucas linhas: Becker tinha sido derrotado em Wimbledon por Pat Rafter e Barbara, a sua mulher, grávida do seu segundo filho, tinha ido para o hospital com contrações. Bebeu umas cervejas no hotel, foi para o restaurante, e cruzou olhares com a então empregada de mesa Angela Ermakova (que se tornou modelo).

Seguiu-a quando ela saiu da sala, trocaram umas breves palavras e num quarto de arrumos, conhecido como “quarto das vassouras” envolveram-se sexualmente. Não trocaram contactos, ele voltou para o hotel, no dia seguinte foi buscar Barbara ao hospital (tinha sido um falso alarme) e regressaram à Alemanha com os 28 sacos de ténis e malas.

Oito meses depois Boris recebeu um fax de Angela no seu escritório em Munique a dizer que ia ser pai e a pedir um encontro. Ele lembrava-se do encontro mas não queria acreditar no resultado. Tanto assim que, depois de Anna (parecidíssima com Boris) nascer, exigiu um teste de paternidade, o que confirmou o que Angela dizia.

O casamento com Bárbara não resistiu ao escândalo e Boris não resistiu à terceira filha. Já publicou mais do que uma vez fotos com Anna, como o fez este ano no dia do Pai no Instagram (e até com Angela) e durante o concurso não deixou de incentivar publicamente a filha na véspera da grande final.

“Aconteça o que acontecer, já conquistaste o coração dos alemães. O teu talento, a tua disciplina, a tua performance e mais, a tua personalidade, são incríveis. E eu não podia estar mais orgulhoso”, disse numa mensagem vídeo partilhada nas stories do Instagram.

O ex-tenista encontra-se neste momento a tentar melhorar a sua reputação depois de ter sido preso em 2020 por estar envolvido em escândalos de corrupção e, aquando da sua libertação, ter sido deportado para a Alemanha.

Já Anna vive o período da sua própria fama e não a dada pelo pai. A modelo que durante anos quis a dança mas não apostou nela como um futuro promissor, optando por tirar um curso de história da arte, concretizou agora esse sonho. Após participar no concurso Let’s Dance, afirmou à RTL que optou pelo mundo do espetáculo. “Gosto de atuar e fazer as pessoas felizes”, acrescentando: “Eu vim da Inglaterra para a Alemanha para dançar. E nunca pensei que seria aceite aqui de braços tão abertos”.

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