29 de setembro de 1990. Na altura, muitos se preparavam para aquela que poderia ser a última tournée da “rainha do Rock’n’Roll”. Prestes a completar 51 anos, Tina Turner tinha resolvido dedicar-se ao cinema (anos antes tinha atuado ao lado de Mel Gibson em “Mad Max: Para Lá da Estrada do Trovão”), mas não sem antes se despedir dos fãs europeus com uma digressão de estádio, como forma de agradecimento pelo apoio durante a década de 1980, quando protagonizou o que a Billboard descreveu como “o maior regresso triunfal da história da música”. Antes, deu vários concertos em Londres; depois, vários em Espanha. Mas naquele dia, no início do outono, o palco foi o Estádio de Alvalade, em Lisboa, naquela que seria a primeira de duas atuações de Miss Hot Legs em Portugal.

Tina Turner durante o concerto no Estádio de Alvalade, em Lisboa, em 1990.

A Foreign Affair European Tour foi vista por mais de 3 milhões de pessoas — um recorde absoluto na Europa. Em Portugal, foram “50 a 60 mil” os que a quiseram ver e ouvir. A estimativa é de Fernando Cunha, músico dos Delfins, banda que fez a primeira parte do espetáculo. “Foi muito bom, ela ainda estava no auge da carreira, mas já lhe chamavam um pouco a avó do rock. Estava em grande forma, foi brutal para as condições que havia naquela época”, contou à TSF devido à morte da cantora esta quarta-feira.

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Durante quase duas horas de concerto, a diva recordou os praticamente trinta anos de carreira que então levava. A primeira parte abria com “Steamy Windows”, tema do álbum que dava nome à digressão, e fechava com “Nutbush City Limits”, de 1973, um dos seus maiores êxitos quando ainda fazia dupla com o então marido, Ike Turner; intervalo e uma cover de “Addicted to Love”, de Robert Palmer” a abrir a segunda parte, que terminava com “Proud Mary”, mais um dos êxitos de Ike e Tina. Pelo meio, os clássicos: “Private Dancer”, “What’s Love Got to Do With It” e “Be Tender With My Baby” como encore, em gesto de despedida do público — e, pensava-se, dos palcos.

A verdade é que a própria já começava a duvidar dessa decisão, como contou durante a tournée à revista Jet. “Sempre pensei que esta era a última, mas agora tenho um misto de sentimentos. (…) A sensação daqueles fãs todos, noite após noite, é fantástica. Não quero fechar completamente a porta”, disse. A porta não permaneceria encostada por muito: em 1993 voltou para mais uma digressão. Já Portugal teria de esperar uns anos para a voltar a receber.

Seis anos depois, o regresso

22 de setembro de 1996. Quase exatamente seis anos depois do primeiro concerto, Tina Turner regressou a Lisboa. A idade não passava por ela: a voz era a mesma, como o eram as hot legs. Perante dezenas de milhares no Estádio do Restelo (um público-recorde para o recinto), voltou, como seria de esperar, a dar espetáculo: cantando, dançando e fazendo dançar.

Ao repertório que já tinha trazido a Alvalade anos antes, acrescentou alguns outros temas, nomeadamente as suas contribuições para o cinema: “We Don’t Need Another Hero”, tema de 1985 que gravou para Mad Max, e “GoldenEye”, do filme de James Bond (o de Pierce Brosnan) do mesmo nome, estreado em 1995. A encore desta vez foi dupla: além do já referido “Nutbush City Limits”, cantou ainda “On Silent Wings”, do álbum mais recente de então, “Wildest Dreams”.

Seria a última vez que pisaria solo português. Em 2000, retirou-se pela primeira vez dos palcos; voltou da reforma para uma última digressão mundial, em 2008 e 2009, em celebração dos 50 anos de carreira, mas sem passar por Lisboa. “I feel the whisper of the wind / on silent wings” declarou, nos últimos versos cantados na capital portuguesa, já lá vão 27 anos. Seguramente, todos os que lá estiveram também o terão sentido.