A três semanas do final das audições da comissão parlamentar de inquérito (CPI) à gestão pública da TAP, e ainda sem ouvir alguns dos protagonistas políticos, há algumas conclusões que podem ser já tiradas, do ponto de vista do deputado do PCP, Bruno Dias. Uma delas é a da “total dependência” de consultores externos em que a própria TAP se colocou em temas fundamentais, nomeadamente jurídicos.

Copos de papel e perguntem ao Hugo

Em entrevista ao programa Cheque In da Rádio Observador, que passa em revista os temas que marcaram a semana na CPI, o coordenador dos comunistas no inquérito à TAP afirma que a confiança nos consultores externos tem sido muitas vezes invocada como explicação para os casos que os deputados estão a investigar, sobretudo por parte de gestores e ex-gestores da companhia aérea. O recurso a consultores externos, designadamente escritórios de advogados, à revelia dos serviços internos da empresa, ajudam a explicar decisões que mais tarde vieram a ser legalmente questionadas, como a indemnização de meio milhão de euros para Alexandra Reis terminar o mandato como administradora antes do prazo.

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Para Bruno Dias, ficou demonstrado que os serviços jurídicos da TAP “conheciam as leis e as regras em rigor (e o estatuto do gestor público) e que poderiam, se fossem ouvidos, ter evitado, por exemplo, o acordo com Alexandra Reis”, bem como outras situações de pagamentos decididos pela gestão privada, e que foram que foram considerado ilegais, como a pré-reforma ao ex-administrador Trey Urbhan, ou questionáveis, como os bónus a Antonoaldo Neves e a Fernando Pinto.

O deputado comunista considera por isso que a invocação do segredo profissional por parte desses consultores (nomeadamente da SRS Legal e da Morais Leitão que apoiaram e construíram os contornos do acordo de saída de Alexandra Reis) e da atual diretora jurídica — Manuela Simões — levanta “um problema para a comissão de inquérito porque há perguntas que deixa de ser possível fazer e testemunhos que não é possível recolher”. Mas o maior problema e mais sistémico é “a dependência em que a própria TAP se colocou perante este tipo de prestadores de serviços”.

Esta semana, a antiga chefe de gabinete de Pedro Nuno Santos, Maria Araújo, que comunicou ao então ministro os valores do acordo feito com Alexandra Reis para serem autorizados, admitiu que o Ministério das Infraestruturas assumiu na altura que o departamento jurídico da TAP estava a acompanhar o acordo. O que não aconteceu.

Bruno Dias lembra ainda que ao longo das já várias dezenas de audições da CPI, têm-se ouvido queixas de falta de pessoal em áreas estratégicas — desde a jurídica, à manutenção aeronáutica, passando pelos tripulantes. Houve a vários níveis, e em grande medida justificada pelo processo de reestruturação e pela saída de quadros, uma falta de “capacidade de resposta que se fez sentir”.  E para esta “espiral de opções desastrosas ainda se coloca o resto dos serviços jurídicos a instruir processos de despedimento”(…) em vez de as pessoas “fazerem aquilo que mais fazia falta que era orientar, aconselhar e assegurar que a legalidade era respeitada e cumprida”.

CPI não deve ser “arma de arremesso contra a TAP”

O grande objetivo político dos comunistas nesta CPI é “antes de mais falar sobre a TAP. Às vezes é mais difícil, mas a gente não desiste”. Bruno Dias realça que houve também a preocupação de “não permitir que a constituição de uma CPI fosse utilizada como uma espécie de arma de arremesso contra a TAP, como uma espécie de mecanismo que contribuísse para forçar uma espécie de lógica de factos consumados e de degradação da própria instituição”. E longe de achar que os factos revelados retiram força à manutenção da TAP na esfera da gestão pública, o deputado defende que o que interessa não é discutir o resultado — o caso Alexandra Reis e outros — “mas a causa” que, do seu ponto de vista, é “resultado das opções e das políticas seguidas no contexto da gestão privada”.

Repudia ainda a ideia de que a comissão de inquérito se possa transformar “numa espécie de oportunidade para a liquidação total ou a venda em saldos ou para uma privatização que alguns anseiam há muito tempo”. E defende que os trabalhos da CPI estão a ser importantes para “que se perceba, de facto, o que significou a gestão privada e esta forma de fazer uma gestão pública que imita a gestão privada”.

O deputado justifica ainda a abstenção comunista aos requerimentos de documentação e audições de responsáveis das forças de segurança e e serviços de informação e de membros do Governo (incluindo o depoimento escrito de António Costa) relacionados com a intervenção do SIS na recuperação do computador do ex-adjunto de João Galamba. Para Bruno Dias, o lugar próprio para tratar desses temas não é a comissão de inquérito à TAP. “Não consigo ter quem me demonstre que isso aconteceu assim e que o SIS foi envolvido por ser a TAP (o computador de Frederico Pinheiro tinha documentos classificados sobre a transportadora) e que se fosse outro tema não faria o que fizeram. Uma coisa é a atuação do Governo e a forma como os serviços de informação são tutelados e como atuam. Na CPI à TAP devemos tratar da forma como a TAP é gerida e tutelada.”

A conclusão do investigação à fuga de informação confidencial que tinha sido enviada pela comissão de inquérito pelo Governo — e que iliba os deputados, técnicos e assessores — não surpreendeu o deputado. “Se fosse um documento nascido Assembleia da República, e ao qual mais ninguém tivesse acesso e que tivesse aparecido na comunicação social, não haveria dúvidas que tinha saído daqui. Não foi o caso.” Bruno Dias admite ainda que há acontecimentos relacionados com os trabalhos da CPI que podem “inspirar episódios de séries criminais”, mas repete que para o PCP mais importante “é falarmos sobre a TAP”.