O pedido do árbitro para que as pessoas a assistirem ao jogo se calassem dirigia-se aos gritos de “Diego, Diego, Diego”. Nuno Borges tinha tudo contra si. No entanto, o maior inimigo da prestação que teve diante de Schwartzman na segunda ronda do torneio de Roland Garros foi ele próprio. O português, que procurava ser o primeiro a alcançar a terceira ronda do Grand Slam francês, cometeu 52 erros não forçados (contra apenas 25 do adversário). Por falhas arredondas aos metros, a eliminação começou a parecer inevitável, mas houve sempre espaço para imaginar um twist que levasse a mais um momento de relevo num ano que deu ao tenista muitos motivos para celebrar.

Ainda agora começou e a edição de 2023 do Roland Garros já é um aglomerado de eventos espantosos. Rafael Nadal falhou a prova devido a lesão, Daniil Medvedev caiu na primeira ronda perante o qualifier brasileiro, Thiago Seyboth Wild (7-6, 6-7, 2-6, 6-3, 6-4), e o francês de 36 anos que que não tinha vencido qualquer encontro este ano, Gael Monfils (394 do ranking), bateu Sebastian Baez (3-6, 6-3, 7-5, 1-6, 7-5). O inesperado tornou-se no novo normal, mas Nuno Borges estava em condições de ser um protagonista de relevo.

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Frederico Silva e João Sousa foram eliminados na qualificação. Nuno Borges foi o único português a ter acesso direto ao quadro principal do torneio. No primeiro jogo, o tenista da Maia deixou pelo caminho o norte americano John Isner num jogo a cinco sets que durou 3h58. Não menos intenso foi a partida de Diego Schwartzman que esteve a perder por dois sets, mas conseguiu virar a seu favor o encontro contra Zapata Miralles. Repetia-se então o duelo entre o português e o argentino que tinha acontecido em Phoenix nos Estados Unidos com a vitória a cair para as cores nacionais (7-5 e 6-3).

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Se Nuno Borges vencesse Schwartzman, tornar-se-ia no primeiro português de sempre a alcançar a terceira ronda de Roland Garros. Caso isso acontecesse, o número 80 do ranking ia medir forças com Stefanos Tsitsipas, um velho conhecido que defrontou no Masters 1000 de Roma, o que seria mais uma paragem no caminho glorioso que o tenista tem percorrido ao longo de 2023, ano em que se bateu também com Carlos Alcaraz e Holger Rune.

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Nuno Borges conseguiu um break logo no primeiro jogo de serviço do adversário. A seguir, Schwartzman respondeu e começou a ganhar força a ideia de que era mais fácil um jogador se sobrepor quando era o outro que tinha a iniciativa do serviço. Ao todo, cada um conseguiu três breaks no primeiro set. Borges estava a ser forçado a jogar muito no fundo do campo, mas, dado o arranque de encontro que fez, parecia confortável com isso. Com o set a ser decidido por margens muito justas, o português cometeu uma dupla falta e Schwartzman chegou à vantagem por 4-3 com o momento do seu lado. Apesar das sensações não o indicarem, o maiato foi buscar uma liderança por 6-5. O rival ganhou tempo em conversas com o árbitro  sobre uma bola que caiu muito próxima da linha, que o fez perder um ponto, e, a partir daí, respirou o ar que precisava para empatar. Schwartzman dispunha do serviço para fechar o set, só que Nuno esteve à altura para forçar o tiebreak no qual o adversário foi mais bem sucedido (7-3).

Já com 62 minutos de partida, Nuno Borges cometia erros não forçados em excesso (17, o que tornava inúteis os 12 winners e os três ases), enquanto Schwartzman mantinha a consistência. Vestido num corpo de atitudes bastante típicas de um sul-americano, o número 95 do ranking nunca se inibiu de festejar com gestos emotivos. Tinha razão para tal. Apresentava um ténis variado que fazia Nuno Borges desgastar-se num vai e vem constante para responder às bolas mais tensas que o forçavam a recuar e às bolas curtas que exigiam uma corrida até à rede. Relativamente aos lances de rede, Borges chegou quase sempre tarde ou sem discernimento para uma pancada firme. Schwartzman fechou precisamente assim, com um amorti, o segundo set (6-4, em 45 minutos).

O desespero expressava-se em Nuno Borges sempre que o tenista levava as mãos à cabeça e repetia o gesto que acabava de falhar. E tantas vezes ficou na rede aquele amorti. O pequeno Schwartzman, de 1,70m, agigantava-se. Mesmo que o português estivesse em baixo no resultado, a proximidade no marcador mostrava que a vitória em cada set e, consequentemente, no jogo podia mesmo cair para qualquer dos lados visto que as diferenças entre os dois eram do tamanho de um grão da terra batida onde competiam. Schwartzman conseguiu o break e passou a liderar por 5-3, ficando em condições de servir para fechar o encontro. No primeiro match-point que teve, o argentino viu Borges, numa tentativa de que o resultado capotasse, forçar uma direita cruzada que, de novo, ficou na rede (6-3).

O português ficou pelo caminho na segunda ronda de Roland Garros, deixando a competição de singulares masculinos órfã de presença portuguesa. Schwartzman acabou como começou — muito aplaudido — e viu ser adaptado a si um cântico dedicado a Diego Maradona. Foi o muchacho mais forte nos momentos críticos da 2h32 de encontro.