No Lago Maggiore, em Itália, o Gooduria, um barco turístico com capacidade para cerca de duas dezenas de pessoas velejava tranquilamente num passeio turístico. Até que, sem que nada o fizesse prever, uma violenta tempestade virou a embarcação, provocando a morte de quatro a pessoas a bordo — dois italianos, um israelita e uma cidadã russa.

O que, inicialmente, se afigurava como uma simples tragédia humana, cedo começou a assumir contornos “estranhos”, à medida que se informações foram sendo recolhidas: os passageiros não estavam registados em nenhum hotel e, conforme foram sendo identificados, as autoridades italianas constataram que se tratavam de membros da comunidade de informação italiana, assim como espiões e ex-expiões da Mossad israelita. Horas depois do sucedido, os estrangeiros sobreviventes foram rapidamente transportados de volta a Israel em aviões fretados, sem serem questionados.

O caso, que parece ter saltado diretamente das páginas de um qualquer romance de John LeCarré, tem suscitado várias perguntas. O que estava o grupo a fazer naquela zona? Seria uma mera viagem de lazer ou estariam em trabalho? E o que dizer dos indícios que apontam para envolvimento russo no caso? As hipóteses são variadas, mas as respostas, por agora, escasseiam.

Agentes secretos israelitas e italianos entre as vítimas de naufrágio em Itália

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Hipótese 1: uma viagem turística transformada em tragédia

Por vezes, a explicação mais simples pode ser a mais correta: no barco estava apenas reunidos um grupo de amigos e colegas de trabalho para uma viagem turística que terminou em tragédia. Com efeito, a polícia já veio relativizar a ideia de que o caso possa ter contornos mais misteriosos.

“Não vejo grande mistério para lá do facto de que contrataram um barco turístico no que, inicialmente, era um dia bonito para uma visita guiada ao lago — talvez fosse um aniversário. Mas esta não é a típica situação de 007”, sustentaram as autoridades.

Ainda assim, a presença de tantos expiões e ex-expiões no mesmo local não deixa de levantar várias questões. Outra das dúvidas prende-se com a empresa contratada para efetuar a viagem — a Love Lake Srl.–, uma sociedade criada já este ano, propriedade de Claudio Carminatti (que sobreviveu), um italiano fluente em búlgaro que capitaneava o navio, e de Anna Bozhkova, a vítima mortal de nacionalidade russa.

Hipótese 2: troca de informações entre Itália e Irão

Segundo o jornal The Guardian, alguma imprensa italiana tem especulado sobre os reais motivos da viagem. Alguns meios de comunicação alegam mesma que o grupo estava reunido por questões de trabalho, “para trocar informação e documentos”, e que os israelitas poderão ter decidido ficar mais tempo após terem perdido o voo de volta a casa.

Tal encaixaria com os desenvolvimentos recentes nas relações diplomáticas entre os dois países. Há apenas dois meses, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, visitou Roma para um encontro com o governo de Giorgia Meloni; anteriormente, os dois países gozavam de boas relações ao nível da troca de armamento militar.

Hipótese 3: espionagem de oligarcas russos e iranianos

Uma teoria, avançada pelo Corriere della Sera, propõe que os agentes a bordo do Gooduria estariam a espiar oligarcas russos. Isto porque a área, no Lago Maggiore, é conhecida por ser o local onde vários membros da elite financeira russa têm comprado propriedades e hotéis.

As autoridades acreditam que estes oligarcas têm estado a contornar as várias sanções aplicadas pela União Europeia, introduzindo o dinheiro em Itália através de banco suíços ou de empresas italianas. Tal poderia, por exemplo, explicar a questão das nacionalidades a bordo — Bozkhova e Carminatti seriam úteis enquanto tradutores, neste contexto.

Outra possibilidade aponta para operações em torno de um outro país: o Irão. A presença de agentes da Mossad para monitorizar as atividades de iranianos, numa área onde se movimentam vários interesses económicos, seria fácil de entender dadas as tensões entre os dois países. “Os israelitas poderiam ter interesse significativo em monitorizar contactos entre empresas italianas e iranianas, envolvidas no tratamento de componentes civis para drones usados, precisamente na guerra”, especula o Corriere.

Seja qual for a explicação, a polícia garante que vai continuar a investigar e que pretende apurar todos os contornos do acidente e das suas vítimas. “Não quero que haja quaisquer dúvidas de que não perseguimos a investigação até às últimas consequências”, sublinhou o procurador-chefe do caso, Carlo Nocerino. Para tal, as autoridades já estão a planear recuperar a embarcação e revistá-la, recolhendo toda a informação que encontraram — até mesmo, garantem, eventuais documentos confidenciais.