O Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) cumpriu os objetivos gerais do plano estratégico de 2014-2018, mas subsistem desequilíbrios, assimetrias e disparidades no setor, concluiu um estudo do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa.

O estudo foi encomendado pelo Governo, em 2021, ao Centro de Estudos Dinamia’Cet, do ISCTE, com o objetivo de avaliar o cumprimento dos objetivos do plano estratégico 2014-2018 do ICA, no desenvolvimento do setor do cinema e audiovisual.

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As conclusões do ISCTE são reveladas na mesma semana em que o ICA também divulgou os resultados de um outro estudo, que decorreu em paralelo, encomendado em 2020 à consultora inglesa Olsberg SPI, destinado a identificar áreas de intervenção para um futuro plano estratégico, para o período 2021-2025.

Nas mais de 200 páginas do estudo do ISCTE, não só é avaliado o cumprimento de objetivos do ICA como é traçado um diagnóstico do panorama português, a partir de depoimentos e contactos com agentes do setor.

“O ICA, de modo geral, contribuiu para ampliar a difusão da cultura portuguesa e afirmação da língua portuguesa, fomentando o apoio ao cinema e ao audiovisual independente, particularmente através de programas de apoio financeiro”, lê-se no documento.

No entanto, esses mesmos objetivos são genéricos e passíveis “de interpretações relativamente subjetivas”, alertou o estudo.

Ainda assim, o ISCTE sublinha que, de 2014 a 2018, o financiamento direto do ICA cresceu, com um aumento do número de concursos, que passou de 28 para 33, e de projetos abrangidos, aumentando de 223 para 310, embora em alguns programas de apoio tenha diminuído o valor financeiro a repartir por cada candidatura.

O ICA também “tem promovido a sua projeção internacional e criado oportunidades para a coprodução”, apoiou a exibição em circuitos alternativos e fomentou a literacia cinematográfica, mas “os resultados, difíceis de avaliar a curto prazo, parecem ainda ser insuficientes”.

As questões mais problemáticas levantadas pelo estudo do ISCTE relacionam-se com as áreas da distribuição e da exibição de cinema português.

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“Mesmo recebendo apoio do ICA, existe uma grande dificuldade na distribuição de filmes portugueses não comerciais. Na maior parte das vezes o que acontece é existirem apenas algumas sessões em Lisboa ou no Porto”, refere o estudo.

Segundo a análise do ISCTE, no setor da distribuição há “claramente a hiperconcentração de mercado num único operador de distribuição, a NOS Lusomundo. […] É essencial que esta situação seja ponderada em prol da diversidade do cinema exibido, incluindo do próprio cinema produzido em Portugal”.

Há ainda a questão de “a quantidade de filmes estreados não ter correspondência com as receitas geradas”: No período 2014-2018 estrearam-se nos cinemas portugueses, em média, 32 filmes portugueses por ano e a quota de mercado, em termos de receitas, variou entre os 6,2% (em 2015) e os 1,5% (em 2018).

Para um próximo plano estratégico, sobre o qual o Ministério da Cultura ainda não revelou orientações, o estudo do ISCTE sugere que tenha “objetivos mais operacionais” e “indicadores e metas concretas a atingir”.

São elencadas ainda mais sugestões, nomeadamente abordar a questão de “quotas para minorias”; tornar os processos dos concursos “mais transparentes”; melhorar a “promoção e diferenciação dos conteúdos nacionais produzidos”, e melhorar o acesso aos dados das novas plataformas a operarem em Portugal.

O outro estudo divulgado esta semana pelo ICA foi produzido pela consultora inglesa Olsberg SPI, que propõe uma “estratégia nacional holística” para o próximo plano estratégico.

Segundo a consultora, “nos últimos anos, Portugal tem estado no top 10 dos mercados audiovisuais que mais rapidamente crescem na Europa”, no entanto apresenta “deficiências estruturais”, como uma quota de mercado “notavelmente baixa” de cinema português, uma grande dependência de financiamento do ICA e dificuldades de acesso a financiamento privado.

“Muitas das áreas de foco estratégico para o ICA permanecem inalteradas desde 2013. […] O ICA precisa de estar ciente de que pode não ser possível avançar plenamente com alguns elementos da sua estratégia até 2025″, alerta a consultora.