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Robbie Williams versão minissérie: honesto, mas demasiado solitário

Este artigo tem mais de 6 meses

O fenómeno da pop protagoniza uma série documental com o mesmo nome. Ele é o narrador e único entrevistado — e isso é um problema. Os quatro episódios, na Netflix, parecem por vezes um longo monólogo.

Ainda sem ter feito totalmente as pazes com o passado, nesta série documental Robbie Williams escolhe encará-lo olhos nos olhos, esperando encerrar um ciclo e fazer uma espécie de catarse.
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Ainda sem ter feito totalmente as pazes com o passado, nesta série documental Robbie Williams escolhe encará-lo olhos nos olhos, esperando encerrar um ciclo e fazer uma espécie de catarse.

Ainda sem ter feito totalmente as pazes com o passado, nesta série documental Robbie Williams escolhe encará-lo olhos nos olhos, esperando encerrar um ciclo e fazer uma espécie de catarse.

“Sou um eremita. Quando não estou em palco, estou na cama.” Não é um exagero, é assim mesmo, na cama, que vemos Robbie Williams durante a maior parte da série documental com o próprio nome, que está disponível na Netflix.

Ao longo de quatro episódios, o cantor britânico recorda a carreira de cerca de 30 anos através de vídeos de bastidores a que vai assistindo num portátil que carrega atrás de si pela casa. Comenta as imagens que está a ver, carrega na pausa quando tem algo mais importante a dizer ou faz fast forward quando está perante uma recordação incómoda. Robbie Williams vai da ascensão meteórica dos Take That à reinvenção de um percurso a solo, passando por um longo historial de adição a drogas e álcool e por uma batalha constante contra a depressão.

Ainda sem ter feito totalmente as pazes com o passado, Robbie Williams escolhe encará-lo olhos nos olhos, esperando encerrar um ciclo e fazer uma espécie de catarse. Muitas vezes, o que está a ver não favorece minimamente a imagem dele. “Não fui muito simpático para aquelas fãs”, diz a dada altura. “Consumia o que pudesse agarrar. Ecstasy, cocaína, álcool” ou “era só um parvo que consumia muita coca”, acrescenta.

Aos 49 anos, depois de ter batido no fundo algumas vezes, Robbie Williams mostra-se autêntico e vulnerável. O mais curioso é que ele sempre foi assim, mas ninguém prestou atenção ou se interessou pelo que ele tinha para dizer. Era desconfortável e a saúde mental não era uma questão, muito menos falada publicamente, nos anos 90 e início de 2000.

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[o trailer de “Robbie Williams”:]

Quando em 1999, nos ensaios para um concerto no qual iria atuar para 80 mil pessoas, um jornalista lhe perguntou quão empolgado estava, a resposta foi inesperada. “Nas últimas cinco semanas estive numa depressão negra, portanto não estou empolgado com grande coisa neste momento. Tenho medo de tudo.” Porém, não era isso que interessava ouvir. Segunda versão da resposta: “Definitivamente [muito empolgado]. Vai ser uma experiência incrível.”

Em palco parecia a pessoa mais confiante — e até arrogante — do mundo. Não podia estar deprimido. O miúdo rebelde que se juntou a uma banda com 16 anos e depois saiu dela, no auge da fama, por não querer seguir as regras? Não podia estar deprimido. O autor de sucessos como Angels ou Millennium que as miúdas queriam namorar e os rapazes copiar? Não podia estar deprimido.

Mas estava. E há muito tempo. “Fui diagnosticado aos 22 ou 23 anos”, explica. E quanto mais fama tinha, mais triste e isolado ficava. Não confiava em ninguém. Solidão, destruição, desistência, está tudo estampado no olhar que Williams revela nos vídeos caseiros mais antigos. No entanto, se ele não estivesse agora a chamar-nos a atenção, não teríamos perdido dois minutos a tentar decifrar o que se passava nos bastidores do frenesim da pop.

Não se percebe porque não há contextualização (onde nasceu, como cresceu, como era a vida familiar). Talvez isso pudesse até explicar como é que, mesmo enchendo estádios e ganhando discos de platina, era profundamente inseguro e infeliz

O que torna a série documental intimista é também o seu ponto fraco. Robbie Williams é o único entrevistado — tirando o contributo de breves minutos que a mulher, Ayda, dá no último episódio. A história é a dele, o narrador não podia ser outro, mas fica a faltar a participação de figuras chave na vida e na carreira do cantor, como Guy Chambers, o produtor que escreveu e musicou com ele os primeiros álbuns; os membros dos Take That; os amigos ou a própria família. Com esta nem sabemos se tem relação. A narrativa começa aos 16 anos, quando Robbie Williams se junta a uma nova boy band. Até aí, a única coisa que ficamos a saber é que não tinha boas notas na escola e desistiu dos estudos por essa altura.

Não se percebe porque não há contextualização (onde nasceu, como cresceu, como era a vida familiar). Talvez isso pudesse até explicar como é que, mesmo enchendo estádios e ganhando discos de platina, era profundamente inseguro e infeliz. É, por isso, também inevitável fazer a comparação com Beckham, até porque a série documental sobre o futebolista ficou disponível há menos de um mês e ainda está muito fresca no algoritmo.

Ambos mais ou menos com a mesma idade refletem agora sobre o passado, ambos péssimos na escola, ambos com um sucesso desmesurado e antes do tempo que era impossível terem maturidade para entender, ambos perseguidos e enxovalhados pelos tablóides, ambos estrelas da cultura pop. Só que Beckham é rico em depoimentos (todos os nomes que interessam e mais alguns estão lá, nem que seja para dizerem apenas duas frases) enquanto Robbie Williams dá uma única visão, transformada num monólogo que dura praticamente quatro horas.

Em 2023 está em tournée, a comemorar os 25 anos da carreira a solo, fazendo aquilo que já no início do documentário, nas imagens mais antigas, dizia ser o mais importante: “só queria entreter” as pessoas

Talvez tenha sido uma escolha deliberada dos produtores (este é o primeiro projeto deste género da Ridley Scott Associates Production) mas não funciona. O próprio Williams diz ser um “lobo solitário” — as relações de amizade ou amorosas, que teve com outras figuras públicas como Nicole Appleton e Geri Halliwell, são pouco exploradas e, mais uma vez, só temos direito à versão de um dos lados. Estamos sempre à espera de mais qualquer coisa, algo que nunca chega. Como por exemplo, que Robbie Williams vista umas calças. O facto de passar grande parte do documentário de cuecas, sentado com as pernas cruzadas em cima da cama, torna-se constrangedor e desvia-nos a atenção do que está a dizer, parece um ambiente demasiado íntimo para estarmos presentes. Pode ser porque está tão habituado a estar fechado no seu casulo que não sabe estar de outra forma. Pode ser porque se está nas tintas para o que os outros pensam — afinal, estamos a falar do homem que mostrava o rabo em palco.

O que se destaca aqui é um depoimento cru sobre os erros e as lutas mais privadas que alguém pode ter. Interrompido pela filha, Teddy, num dos momentos em que está a ver imagens dos Take That, Robbie Williams confessa que tinha ciúmes de Gary Barlow e que era vingativo. Saiu dos Take That com raiva, lavou roupa suja em praça pública e demorou muito tempo a ultrapassar o rótulo de desertor. Em 2006, num concerto em Leeds, teve ataques de pânico que o fizeram nunca mais querer cantar. Contudo, teve de o fazer logo na noite seguinte porque cancelar custaria mais do que o dinheiro que ele tinha naquele momento. “As pessoas estavam à espera que eu fizesse merda.”

E ele fez. Entrou em colapso, não conseguindo lidar com as péssimas críticas a Rudebox, que ele acreditava piamente ser melhor do que Angels. Teve uma recaída e ficou viciado em medicamentos. Foi nessa altura que conheceu Ayda, a mulher (que nos é introduzida através de um segmento de segundos no programa de Conan O’Brien, mas que ficamos sem saber o que faz). A recuperação e o caminho até voltar a ter confiança para cantar novamente não foram rápidos nem fáceis, mas a estabilidade familiar parecem ter-lhe dado uma paz mental que ele nunca tinha tido antes. Em 2023 está em tournée, a comemorar os 25 anos da carreira a solo, fazendo aquilo que já no início do documentário, nas imagens mais antigas, dizia ser o mais importante: “só queria entreter” as pessoas.

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