Um é mais madrugador, outro chega mais vezes atrasado. Um cozinha menos mas bem, outro é o que gosta mais de limpar o barco. Um é do Porto, outro da Amadora. É a dupla na classe 470 da vela que conseguiu o oitavo diploma olímpico à equipa portuguesa dos Jogos Olímpicos de Paris.

Diogo Costa (leme) e Carolina João (tripulação) fizeram dupla nessa classe de vela, na equipa mista, e prometem já que estão de olho já nos próximos jogos em Los Angeles, em 2028.

Tinham traçado como objetivo o diploma, mas começaram a acreditar que podiam ir mais longe. Começaram mal os Jogos em Paris, mas foram escalando e terminaram o campeonato na quinta posição, ao ficarem, na regata das medalhas, em segundo lugar. Mas quando aí chegaram as contas para as medalhas já eram difíceis. Houve regatas, anteriores, canceladas e a equipa admite que isso pode ter prejudicado o resultado final.

Em declarações à RTP, Diogo Costa deixou certezas: “É sem dúvida para seguir para Los Angeles. Amanhã começa a campanha para Los Angeles”. A tripulante Carolina João corrobora: “Queremos continuar, com vontade e entusiasmados”, mostrando orgulho. “Lutámos para acreditar até ao fim”.  Carolina João recordou que a dupla portuguesa partiu para a medal race a depender do resultado de outras equipas, que tinham de fazer pior. “Acreditámos que podia ser possível”, mas depois a equipa sueca seguia bem na regata e a dupla portuguesa percebeu que não conseguiria passá-la. A Suécia subiu ao pódio para receber a medalha de bronze, atrás da dupla da Áustria (ouro) e do Japão (prata).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

[Já saiu o segundo episódio de “Um rei na boca do Inferno”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de como os nazis tinham um plano para raptar em Portugal, em julho de 1940, o rei inglês que abdicou do trono por amor. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no YouTube. Também pode ouvir aqui o primeiro episódio. ]

“Tendo em conta o princípio do campeonato, quem vê o fim é diferente”, declarou Diogo Costa, com a parceira a acrescentar: “Começámos mal e rapidamente demos a volta. Não deitamos a toalha abaixo, somos lutadores e estamos contentes por dar a volta por cima”. Depois de uma primeira regata que receberam a bandeira da desclassificação, a dupla portuguesa terminou a terceira e quarta regatas em 16.º e 14.º, o que acabou por afetar o registo final. Nas restantes regatas a pior classificação foi um oitavo lugar, andando depois nas outras entre o quarto e o segundo lugar.

“A matemática dizia que era complicadíssima a medalha, mas ficámos em quinto e conseguimos um diploma e é ótimo”, atirou Diogo Costa. O velejador sabe do que fala. A matemática é a sua disciplina de eleição, o que o levou ao curso de Engenharia Informática na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, cuja .

Carolina João só há três anos começou a velejar nesta classe 470 em dupla mista. Diogo Costa já o fazia. Aliás, foi nesta mesma categoria, mas na vertente masculina, a Tóquio, onde fez dupla com o irmão Pedro Costa, também estudante de engenharia (neste caso civil) na mesma faculdade. Ficaram na 15.ª posição. Carolina João também esteve em Tóquio mas na classe que praticava então, Laser Radial. Competia de forma individual e ficou em 34.º lugar. Em Tóquio nenhum dos dois foi à medal race.

O que aconteceu agora, o que os deixou satisfeitos e a manterem a intenção de continuarem a fazer dupla. “A persistência é o caminho do êxito” foi a frase que Carolina João escolheu num questionário disponibilizado pelo Comité Olímpico de Portugal.

Carolina João é licenciada em engenharia química. As engenharias são importantes? Diogo Costa respondeu em 2021, antes da participação em Tóquio, numa entrevista divulgada pela Ordem dos Engenheiros da Região Norte: “Realmente os velejadores de topo nestas classes olímpicas normalmente estudam ou já estudaram cursos de Engenharia ou de Gestão. Cursos que envolvam números e dão uma mentalidade muito crítica, e ajuda-nos a perceber algumas coisas que seriam difíceis de perceber se não tivermos esta mentalidade”. E ainda acrescentava: “Vê-se cada vez mais equipas a contratarem engenheiros para estudarem o comportamento dos mastros, do patilhão, do barco. Acho que se tivermos isto dentro de nós podemos cortar algum caminho e encurtar algumas relações e perguntas”.

Diogo Costa faz 27 anos no próximo dia 23 de agosto. Carolina João já fez 27 anos. Ambos são sócios do Clube Naval de Cascais. E treinados pelo espanhol Aaron Sarmiento, que foi velejador olímpico.

Carolina é que é a mais madrugadora. Diogo o que chega atrasado. Carolina chega primeiro aos treinos e adormece primeiro nas viagens e prefere arrumar o barco. Mas é Diogo que tem mais rituais antes de uma regata.

Ambos dizem ser competitivos, mas Diogo acaba por ser mais no barco. Portugal já tem, na sua histórica olímpica, quatro medalhas na vela. Em 1948, Duarte Bello e Fernando Bello conseguiram a prata na classe swallow. Em 1952, Joaquim Mascarenhas Fiúza e Francisco Rebello de Andrade trouxeram o bronze na classe star, a mesma na qual Mário Gentil Quina e José Manuel Gentil Quina conseguiram, em 1960, a prata.

O barco ‘O Má Lindo’ e a medalha noticiada antes da última regata. Memórias de José Manuel Quina, que foi prata em Roma 1960

A última, de bronze, foi conquistada precisamente na classe 470 por Nuno Barreto e Hugo Rocha. Diogo Costa não se cansa de repetir que Hugo Rocha é a sua inspiração. O mesmo Hugo Rocha que, ao Público, lamentou “a morte lenta da vela” em Portugal. “É uma ilusão pensar que se pode ser profissional de vela em Portugal”, declarou, para desabafar: “Ganhei oito títulos Mundiais, mas apenas dois foram a competir por Portugal. Os outros foram a olhar para uma bandeira, que não era a minha”.