Na Catalunha, o dia 9 de novembro de 2015 entrou para a História, tal como o 9 de novembro do ano anterior já tinha entrado. Entre 2014 — altura em que se celebrou uma espécie de referendo não-oficial — e a segunda-feira que passou, mudou sobretudo o tom dos responsáveis políticos. Aprovada a resolução que inicia formalmente os procedimentos para a independência catalã, voltou a ganhar fôlego a guerra de palavras entre Madrid e Barcelona, entre Rajoy e Artur Mas, entre a imprensa espanhola e a imprensa catalã.

Desta vez, porém, a imprensa da Catalunha não está unida. Se os jornais Ara e El Punt Avui se mostram entusiasmados com o que o parlamento regional decidiu na segunda-feira, já o La Vanguardia e o El Periódico mostram reservas e criticam os partidos independentistas — que se entenderam quanto à resolução aprovada, mas não conseguem entender-se sobre quem deve ser o novo presidente da Generalitat (governo regional). 

“O independentismo saído das urnas iniciou de forma legítima e democrática o processo de desconexão do Estado espanhol”, lê-se no editorial do El Punt Avui, jornal abertamente separatista, que no texto salienta a importância histórica do “grande passo” dado na segunda-feira. Perante as acusações de que Artur Mas, atual presidente da Generalitat que está a ter vida difícil para ser reeleito, está envolvido em esquemas de corrupção, o jornal lembra que também Rajoy não é flor que se cheire. “Em Madrid, os principais partidos e todos os líderes que aspiram ocupar um lugar entre as grandes formações não duvidam em alinhar-se ao lado do primeiro-ministro, um dirigente com muito mais sombras do que luzes, seja onde for.”

O El Punt Avui não deixa, ainda assim, de fazer um aviso, subscrevendo de certa forma as palavras de Artur Mas. Na segunda-feira, o presidente que aspira a um terceiro mandato radicalizou o discurso, colocando pressão sobre a Candidatura de Unidade Popular (CUP), partido de esquerda que só tem o independentismo em comum com a coligação Junts Pel Sí. “Sem investidura não há governo, sem governo o processo [de separação] pode encalhar”, afirmou Mas. O jornal apoia esta tese: “Muitos grandes momentos dependem de saber aproveitar a conjuntura favorável. A História não vai nunca contra aqueles que, pacientes, sabem deixar chegar o momento, mas também não espera por aqueles que não sabem aproveitar as oportunidades como a que a Catalunha hoje tem.”

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Num tom bem menos entusiasta, o La Vanguardia chama sobretudo a atenção para a mensagem contraditória enviada por Barcelona. “Decide-se romper paulatinamente com Espanha — uma declaração unilateral de independência encoberta — e mantém-se em suspenso a governação do país. Esta é a mensagem que o parlamento da Catalunha está a enviar aos organismos internacionais, aos congéneres europeus, ao governo de Espanha e a toda a sociedade. Rutura e poder vacante por falta de um mínimo acordo entre a maioria.”

No mesmo sentido vai o editorial do El Periódico, que lembra que a maioria dos catalães não quer uma rutura unilateral. “A coligação vencedora das eleições, que não consegue os votos necessários da CUP para investir Mas, fechou todas as portas a uma negociação”, lê-se, para logo a seguir o jornal radicalizar ainda mais esta posição: “Os independentistas conduzem o país ao precipício e nem sequer são capazes de eleger um condutor”.

O Ara, jornal abertamente separatista, é o outro periódico de Barcelona que recebeu com agrado o início do processo de independência. Sim, há problemas com a eleição de um presidente, escreve, mas isso não pode impedir o avanço de um “momento histórico”:

“Entendemos o valor que tem uma promessa eleitoral e até mesmo um posicionamento ideológico claro e contundente como o da CUP, e aceitamos que uma alteração dos critérios teria um importante custo a nível interno e externo, mas é precisamente nas situações excecionais que têm de se tomar decisões valentes e arriscadas, assumir sacrifícios, pagar um preço, em resumo, para conseguir um bem superior.”