“Muito Amadas”

Seguindo neste filme de ficção o dia-a-dia de quatro prostitutas de Marraqueche que atendem ricos clientes locais, milionários sauditas ou expatriados franceses em orgias em casas particulares, hotéis de luxo e clubes noturnos, o realizador franco-marroquino Nabil Ayouch escancara a hipocrisia social e de costumes que reina em Marrocos, o que lhe valeu uma rajada de insultos e ameaças de morte e a proibição de estrear a fita. Loubna Abidar, a atriz principal, foi agredida na rua em Casablanca e teve que se refugiar em França, enquanto um dos intérpretes secundários, que faz de namorado de uma das raparigas, escapou por pouco a ser gravemente esfaqueado. Ayouch falou com mais de 200 prostitutas para criar as suas cinco personagens principais, e longe de ser um choradinho neorealejo, um estendal de desgraças ou de mendigar piedade para as personagens, e apesar de mostrar as indignidades a que elas se sujeitam, a violência que sofrem, a dureza que as rodeia e os perigos que correm, “Muito Amadas” destaca, com realismo, veracidade e a crueza necessária, a capacidade de sacrifício e resistência destas mulheres, a sua cumplicidade profunda e solidariedade exuberante, os momentos de tensão e conflito mas também de convívio, ternura e alegria. Se mesmo num país ocidental um filme como este causaria algum incómodo, imaginemos a coragem que foi precisa para o rodar e interpretar num país islâmico. Mesmo que esse seja, supostamente, um país mais secularizado, aberto e próximo do Ocidente como Marrocos.

“Meu Rei”

O novo filme da atriz e cineasta francesa Maïwenn, autora de “Polissia”, premiado em Cannes em 2013, conta em longo “flashback” a tempestuosa relação conjugal entre Tony, uma advogada (Emmanuelle Bercot) e Giorgio, dono de um restaurante (Vincent Cassel), burgesso, trafulha, mulherengo e agressivo, o género de tipo que convence a mulher a chamar Simbad ao filho em vez de lhe pôr um nome civilizado. A história começa logo por ser inverosímil, porque é muito pouco credível que uma mulher com a formação e da origem social de Tony se apaixonasse por um sujeito tão claramente infrequentável como Giorgio, mas Maïwenn torna tudo ainda pior ao atirar-nos à cara todos os lugares-comuns possíveis e imaginários do filme de “casamento de pesadelo”, sem a menor subtileza e em insistente sobre-excitação emocional e histeria cinematográfica. Cassel faz de novo um papel de machão com tendências sociopatas e, espantosamente, Emmanuelle Bercot genhou o prémio de Interpretação Feminina no Festival de Cannes, “ex aequo” com Rooney Mara por “Carol”.

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“Cavaleiro de Copas”

Christian Bale, Cate Blanchett e Natalie Portman são os principais intérpretes do novo filme de Terrence Malick, dividido em oito partes, sete das quais com o nome de uma carta do Tarot (tal como o título), e que vai buscar inspiração a uma obra religiosa alegórica escrita na Inglaterra do século XVII, e a um texto apócrifo do Novo Testamento. Bale interpreta um argumentista de Hollywood que está a passar por uma crise espiritual, familiar e emocional, e leva a cabo uma jornada de autodescoberta. “Cavaleiro de Copas” é uma obra enigmática, vaga e laboriosa, que dividirá ainda mais os admiradores e os detratores do realizador de “Noivos Sangrentos”, e foi escolhido como filme da semana pelo Observador. Pode ler a crítica aqui.