Com o caso Maria Luís Albuquerque ainda quente, o Bloco de Esquerda aproveitou para apresentar um projeto de lei para alterar o regime de incompatibilidades dos titulares de cargos políticos. À cabeça, os bloquistas propõem o alargamento do período de nojo dos três anos atuais para seis anos. Mas as mudanças não ficam por aqui.

Atualmente, e segundo a lei das incompatibilidades, “os titulares de órgãos de soberania e titulares de cargos políticos não podem exercer, pelo período de três anos contado da data da cessação das respetivas funções, cargos em empresas privadas que prossigam atividades no setor por eles diretamente tutelado, desde que, no período do respetivo mandato, tenham sido objeto de operações de privatização ou tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos e benefícios fiscais de natureza contratual”.

Ora, o que agora o Bloco de Esquerda propõe agora é um alargamento significativo destas restrições. De acordo com o projeto de lei apresentado pelos bloquistas, os “titulares de órgãos de soberania e titulares de cargos políticos” não devem poder exercer, nos seis anos seguintes à cessação de funções, qualquer atividade em empresas privadas do “setor por eles diretamente tuteladas”. Ou seja, deixa de valer como critério o facto de, por exemplo, a empresa não ter sido objeto de uma privatização. A proibição estende-se a todas as empresas que pertençam ao setor antes tutelado.

Em declarações aos jornalistas, no Parlamento, o líder da bancada parlamentar do Bloco, Pedro Filipe Soares, aproveitou para lembrar que se a lei tivesse sido alterada em 2013 – como o BE propôs, de resto – seria “inequívoco aos olhos da lei que qualquer membro do Governo que saísse do Governo” não podia “exercer qualquer cargo” em empresas da área que tutelava”. Se este projeto de lei tivesse sido aprovado na altura – foi chumbada pela anterior maioria PSD/CDS – o caso de Maria Luís Albuquerque seria, sem margem para dúvidas, “inaceitável e ilegal”.

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Resta saber se o Bloco tem, por esta altura, condições para fazer aprovar o projeto de lei. Aos jornalistas, Pedro Filipe Soares mostrou-se confiante de que é “possível” dar esse passo. “Nós esperamos que não seja só pela novo ordenamento parlamentar, mas sim pelo que a realidade nos vai demonstrado. É cada vez mais necessário proteger o interesse público. E, por isso, quem faz leis, quem está no Governo, quem gere milhares de milhões de euros, tem de ter responsabilidade também quando deixa de estar nos cargos executivos”.

PS disposto a debater. PSD descarta alterações ao quadro legal

Numa altura em que o Bloco de Esquerda mostra vontade de alterar a lei das incompatibilidades em vigor, PS e PSD parecem estar em polos diferentes. Os socialistas, pela voz de João Galamba, não fecharam a porte ao debate. Matos Correia, vice-presidente do PSD, por outro lado, foi claro: “Não conheço a iniciativa do Bloco de Esquerda, mas não vejo nenhuma necessidade de, à boleia de acontecimentos concretos, que, ainda por cima, são perfeitamente legais, estar a mexer num quadro jurídico”.

Os dois parlamentares falavam aos jornalistas no Parlamento. Com a hipótese de mexer na lei aparentemente afastada pelo PSD, foi o PS a ir mais longe. “Estamos abertos para debater. Se entendermos que há alguma lacuna na lei e que a lei deve ser apreciada, não temos nenhuma objeção em participar e contribuir par essa melhoria da lei”, sublinhou João Galamba.

O deputado socialista, de resto, não poupou críticas a Maria Luís Albuquerque. Mesmo lembrando que deve ser a subcomissão de ética do Parlamento a pronunciar-se sobre o caso, João Galamba não deixou de comentar a contratação da ex-ministra das Finanças pela Arrow Global.

“Um governante que através das políticas que implementou aumentou significativamente o crédito malparados do bancos portugueses, a aumentou a falência das empresas e das famílias portugueses, [algo] que é negativo para o país, curiosamente é um ativo, uma vantagem, uma extraordinária oportunidade de negócio para a empresa que contratou Maria Luís Albuquerque”, atirou Galamba.

O socialista considera a decisão da ex-ministra das Finanças “política e pessoalmente insustentável”. Pode até dar-se o caso, reiterou, de enquanto deputada, Maria Luís Albuquerque vir a “apreciar projetos que prejudicam a empresa” para que agora trabalha. “É manifestamente insustentável”, repetiu.