É um processo que tem vindo a decorrer desde a semana passada: o PSD, assim como o CDS, acusam o Governo de estar a esconder dados, quadros e tabelas, relativos às receitas e despesas desagregadas, que deviam constar do Orçamento do Estado. Esta terça-feira, o Governo prometeu enviar os dados atualizados até sexta-feira. Mesmo assim, o PSD quis encostar o Governo à parede e, por isso, marcou para um debate de atualidade (de caráter obrigatório e urgente) sobre os eventuais cortes na despesa que o Governo estará a fazer, e que, segundo disse o deputado Hugo Soares no plenário, está a conduzir a “levar os serviços públicos à razia total”.

O tema do impacto da falta de verbas nos serviços públicos, como transportes, saúde e educação, até já tinha sido trazido a plenário do Parlamento no passado dia 12 de outubro pelo CDS, mas agora o PSD voltou à carga com um debate intitulado “A realidade a impor-se: as implicações das cativações orçamentais nos serviços públicos”. E porquê? Porque o PSD é “o grupo parlamentar” que “tem mais legitimidade para falar neste assunto, já que nos últimos 4 anos foi o partido que salvou os serviços públicos e que tirou o país da bancarrota”, disse Hugo Soares no encerramento do debate.

A questão central sobre a qual girou todo o debate foi a seguinte: “Onde está o Governo a cortar? Onde vai o Governo deixar de gastar? Estão a esconder dos portugueses onde estão a cortar os 445 milhões de euros apresentados em Bruxelas”. Mas do Governo, que se fazia representar pelo secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, não houve nenhuma resposta concreta. No final, o deputado social-democrata até ofereceu tempo que cabia à bancada laranja para o Governo (que já tinha esgotado o seu) responder, mas sem sucesso.

O mote, contudo, começou por ser lançado pela vice-presidente do PSD e ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque, que abriu o debate a dizer que o Governo “tem de esclarecer o Parlamento e o país” sobre as cativações de 445 milhões de euros apresentadas a Bruxelas como uma das medidas para assegurar o cumprimento do défice deste ano, querendo o PSD saber exatamente que despesas serão afetadas. “Que despesas deveriam ser pagas com estes 445 milhões de euros que afinal não vão acontecer, nem agora nem nunca?”, questionou a ex-ministra do PSD. E concretizou: “PS, PCP e Bloco falharam redondamente na sua estratégia económica e orçamental”, acabando por “condenar os serviços públicos a situações que nem a pré-bancarrota, nem o programa da ‘troika’, alguma vez provocaram”.

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Governo diz que Governo PSD/CDS fez mais cativações e mesmo assim não cumpriu metas

Na resposta, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, apontou baterias aos adversários dizendo que o executivo PSD/CDS-PP fez mais cativações orçamentais em 2014 e 2015, e, mesmo assim, falhou as metas orçamentais estipuladas com a Comissão Europeia. “Os senhores cativaram mais para além dos cortes em salários, pensões, direitos, e o aumento de impostos, e falharam as metas orçamentais”, vincou o governante.

E prosseguiu, ainda dirigindo-se ao PSD: “Os serviços públicos estão bem? Não, têm muitos problemas. Descobriram agora?”. Pedro Nuno Santos prosseguiu afirmando que o debate agendado ontem pelos sociais-democratas advém da “incapacidade do PSD de fazer o debate sobre o Orçamento do Estado para 2017”, o que motivou o partido a “inventar o tema” para desviar a atenção do Orçamento.

O secretário de Estado realçou ainda que é “aceitável” que para o PSD seja incompreensível que um “Governo apoiado por socialistas, comunistas, bloquistas e ecologistas” se prepare “para cumprir a meta orçamental acordada por Bruxelas”, mais a mais “sem cortar salários, pensões e sem aumentar de forma brutal os impostos”. “Esta é também uma razão plausível para que a direita não queira fazer este debate”, sublinhou, acrescentando que as cativações são um “instrumento de gestão orçamental, são medidas de gestão corrente, quotidiana”.

Em 2015, com PSD e CDS-PP, foram inscritos no Orçamento 542 milhões de euros de cativações e em 2014 tal valor foi de 578 milhões, disse ainda Pedro Nuno Santos, fazendo uma comparação com os 445 milhões apresentados agora a Bruxelas.

As cativações orçamentais foram um dos temas discutidos na terça-feira durante a audição do ministro das Finanças, Mário Centeno, nas comissões parlamentares de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa e do Trabalho e Segurança Social a propósito da discussão na generalidade da proposta orçamental para 2017. Na audição, o secretário de Estado do Orçamento, João Leão, assegurou que a cativação de 445 milhões de euros prevista para este ano já estava incluída no orçamento e que este valor de despesa cativada será inferior ao dos dois anos anteriores.

Em resposta a uma pergunta da deputada do BE Mariana Mortágua sobre o impacto das cativações de despesa na qualidade dos serviços públicos, João Leão referiu que as cativações são um instrumento de gestão que está presente em todos os orçamentos, assegurando que não existem novas cativações e que as cativações que estão na carta no âmbito do compromisso com a União Europeia são as que já estavam presentes no orçamento de 2016.

A 17 de outubro, no relatório de ação efetiva enviado a Bruxelas, o Governo informou que foram congelados os 445 milhões de euros relativos às cativações de 2016, o que é “totalmente compatível” com os objetivos orçamentais exigidos e que irá permitir reduzir o défice orçamental para os 2,4% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano.