Os moradores queixam-se de abandono, há casas onde “chove como na rua”, toxicodependentes consomem em carros, tendas e descampados: cinco anos depois da demolição da primeira torre do Aleixo, o bairro do Porto está “muito sozinho”. “Meteram a escola abaixo, tiraram o café, demoliram as [duas] torres. Foi tudo. Não sei porque não mandam estas [três torres] abaixo. O bairro está muito sozinho. Chega a um ponto em que cansa”, descreve Helena, de 55 anos, moradora na torre 1 há 42.

“Saíram muitos vizinhos. A gente até sente o silêncio”, acrescenta Olívia Martins, de 69 anos, que vive noutra das três torres que restam no bairro, onde o fundo imobiliário criado pela Câmara do Porto em 2009 já implodiu dois blocos e o atual executivo suspendeu as demolições até estarem concluídas as casas para realojar os moradores.

João Oliveira, de 56 anos, diz que o bairro está “muito deserto e abandonado”. “Deitaram as torres abaixo, prometem que vão mandar as outras e nunca mais se resolve”, lamenta, acrescentando que em casa “como chove lá fora”.

Para o sociólogo João Teixeira Lopes, o que está a acontecer “é o esquecimento, a lenta asfixia, a ideia de deixar o envelhecimento funcionar e de que a questão se vai resolver por si própria”. “O bairro do Aleixo é um problema não resolvido por esta administração autárquica”, observa. “Já não temos a crueldade da destruição programada e espetacular das demolições de Rui Rio [anterior presidente da Câmara, que criou o fundo imobiliário através do qual a autarquia e parceiros privados se comprometeram a demolir o bairro], mas não há vontade de resolver o problema”, destaca.

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Margarida Martins, de 66 anos, moradora na torre 3, lamenta que os realojamentos não tenham sido feitos em simultâneo. “Quanto tivessem de tirar as pessoas, tiravam-nos a todos. Assim, estamos meios abandonados. Isto está parado. O que fizeram, fizeram. O que não fizeram, tão cedo não vão fazer. A gente não está na rua, ainda vão arranjar as casas e a gente vai cá estando. É assim, não há outra solução”, descreve.

Os toxicodependentes “andam à volta do prédio, fazem barraquinhas, fazem de tudo”, e a moradora considera que se trata de “um mau ambiente, sobretudo para pessoas de idade”. “O espaço está a tornar-se fantasmagórico. São os efeitos da desertificação”, resume Teixeira Lopes, notando que o tráfico de droga é “outra questão que não se resolve”.

“O Aleixo continua a ser um supermercado de droga e era um dos sítios onde devia funcionar uma sala de chuto. Por que é que esta Câmara, que é sempre tão ousada, não avança? Seria possível, e desejável, que mostrasse alguma coragem”, sublinha.

Para o morador João Oliveira o problema não “mudou muito”, nem vai mudar. “Este flagelo tem muitos anos e vai ser difícil o combate. O combate ao tráfico da droga é quase igual ao combate ao terrorismo. Como dizia um político, no tempo do 25 de Abril [de 1974], por cada camarada morto, mil se levantam. Com eles [os toxicodependentes e traficantes] também é assim”, resume.

Cada uma das cinco torres de 13 andares do Aleixo era composta por 64 fogos, num total de 320 casas onde em 2008 viviam 960 pessoas. Em novembro de 2015, a “breve caracterização do edificado e residentes” do Aleixo, elaborada pelo município liderado pelo independente Rui Moreira, indicava que o bairro era habitado por 101 famílias, estando devolutas 91 casas.

O mesmo documento referia a existência de cinco “processos de transferência” e de 58 famílias “associadas à prática de atividades ilícitas”, segundo um apuramento feito pelo município “junto das entidades policiais e judiciais”, revelava o documento. Questionado sobre o número de agregados que atualmente vive no bairro do Aleixo, o gabinete de comunicação da Câmara do Porto não deu qualquer resposta.