Na ressaca dos Globos de Ouro, em Los Angeles, a FIFA promove uma gala em Zurique para anunciar o melhor jogador do mundo em 2016. Cabe ao português o pomposo título, tal e qual como em 2008. Viajámos até ao início do prémio, em 1991, e fomos atrás dos passos de Ronaldo. Antes da era Andorinha e tudo. É ler para crer.

1991 Matthäus

O rapaz tem seis anos de idade e só dá pontapés na bola, com amigos da rua e sem clube. Falamos de Cristiano Ronaldo, claro. Nesse tempo, a FIFA tem uma ideia. E que tal eleger o melhor jogador do mundo? Sim, que tal imitar a Bola de Ouro? Só há uma ligeira nuance: em vez dos votos dos jornalistas, como a eleição da France Football, a FIFA dá espaço aos selecionadores de todo o mundo. O primeiro classificado recebe cinco pontos, o segundo três e o terceiro um. Na edição inaugural, ganha Matthäus à frente de Papin e Lineker.

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1992 Van Basten

A gala da FIFA é organizada em Lisboa, com vitória-surpresa de Van Basten, campeão italiano e melhor marcador da Serie A. Em segundo lugar, um campeão espanhol e europeu pelo Barcelona (Hristo Stoitchkov). Na sua estada em Lisboa, o holandês dá uma entrevista ao jornal Público em que dá uma ideia para o futebol: “Devia copiar-se o basquetebol, com a expulsão do jogador com um número limite de faltas.” E Ronaldo, onde? Com sete anos de idade, continua sem clube. Por opção, claro. E já é conhecido como menino chorão pelos outros meninos da rua.

1993 Baggio

Spoiler alert: ainda ninguém conhece Ronaldo. Quer dizer, só os vizinhos na Rua Quinta do Falcão, fulos com os pais do miúdo que está sempre a pontapear a bola contra as paredes das casas até altas horas da noite. Já o mundo abre alas para o génio italiano Roberto Baggio, da Juventus. Ora aí está, um vencedor da FIFA sem direito a Bola de Ouro. Nos dois lugares seguintes, dois vira-casacas: em segundo, Romário (PSV/Barça); em terceiro, Bergkamp (Inter/Arsenal).

1994 Romário

Enquanto o Mundial dos EUA é conquistado pelo Brasil dos quatro volantes (Zinho, Mazinho, Dunga e Mauro Silva) mais Romário, o nome de Ronaldo começa finalmente a circular nos meandros do futebol, como jogador do Andorinha, onde o pai é roupeiro. Prepare-se, nada será igual a partir daqui.

1995 Weah

No primeiro ano de Ronaldo nos infantis do Andorinha (continua a ser um aluno sem eira nem beira na Escola Básica Gonçalves Zarco), o prémio alarga fronteiras e chega a África, através do avançado liberiano George Weah (Milan), vencedor destacado com 90 pontos de vantagem sobre Paolo Maldini (também do Milan). Em terceiro, Jürgen Klinsmann (Tottenham/Bayern).

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1996 Ronaldo

Ronaldo, aí está o que é. Calma, é só o fenómeno brasileiro. A sua época no Barça de Baía, Couto e Figo rende-lhe o prémio de melhor do mundo aos tão-só 20 anos de idade. Com 11, o Ronaldo português ganha o primeiro título da carreira, como campeão madeirense de infantis pelo Nacional.

1997 Ronaldo

A rivalidade entre Nacional e Marítimo atinge um novo máximo, com Ronaldo em campo, a driblar toda a gente. Enquanto isso, o Ronaldo fenómeno (agora no Inter) ganha o prémio pelo segundo ano seguido, à frente do compatriota Roberto Carlos. Em terceiro, Zidane e Bergkamp acabam empatados.

1998 Zidane

Com dois golos de cabeça na final do Mundial, o francês Zidane arrebata o prémio. A concorrência chama-se Ronaldo (2.º) e Suker (3.º). E por cá? Ronaldo assina pelo Sporting e viaja para o Continente. Como ainda não existe a Academia de Alcochete, o extremo divide um quarto com Fábio Ferreira no Lar do Jogador, dentro do Estádio José Alvalade. Na época de estreia, Ronaldo assina qualquer coisa como 27 golos em 23 jogos, rumo ao título de campeão regional de infantis de Lisboa.

1999 Rivaldo

Na primeira época de iniciados no Sporting, os números de Ronaldo baixam ligeiramente (16 golos em 20 jogos) entre os almoços e jantares no Tobisbar mais os pequenos-almoços e lanches no Magriço, sempre na companhia de Fábio Ferreira. No mundo da bola, o nome em destaque é o do brasileiro Rivaldo, craque do Barcelona (Beckham em 2.º, Batistuta em 3.º).

2000 Zidane

A vida de Ronaldo continua boa dentro de campo (19 golos em 26 jogos no segundo ano de iniciados no Sporting) e assim-assim na escola (más notas e zero de aplicação). E de resto? Continua amicíssimo de Fábio Ferreira, seu parceiro nas idas prolongadas à casa de jogos ao lado do bingo do Sporting. É costume vê-los a jogar Puzzle Bobble ou Daytona. Com que dinheiro? O enviado pela mãe Dolores, todos os meses (30 euros). Na vida real, Zidane volta a ser o rei com ligeira vantagem sobre Figo (2.º) e Rivaldo (3.º).

2001 Figo

Um ano depois da categórica vitória na Bola de Ouro da France Football, o português Figo também é eleito o melhor para os treinadores e capitães das seleções de todo o mundo. A um nível não tão global, Ronaldo estreia-se a jogar por Portugal e marca à África do Sul, pelos sub-15, em Fevereiro. Dois meses depois, três golos ao Japão (7-0). Pelo Sporting, sobe dos juvenis aos juniores num piscar de olhos e chega aos 100 golos nas camadas jovens (em 123 jogos).

2002 Ronaldo

Ronaldo, sempre ele. O brasileiro ganha o prémio pela terceira vez no ano em que resolve o Mundial asiático, à conta de oito golos, dois dos quais na final com a Alemanha (2-0). Em segundo, Khan. Em terceiro, Zidane. Num contexto mais nacional, Ronaldo estreia-se pela equipa principal do Sporting, lançado pelo romeno Bölöni, em Agosto (vs Inter, para a pré-eliminatória da Liga dos Campeões, em Alvalade). Em Outubro, marca o primeiro golo no campeonato nacional, vs Moreirense, em Alvalade. A jogada individual desde o meio-campo corre mundo. Na mesma noite, Ronaldo celebra o bis, de cabeça, e fixa o 3-0.

2003 Zidane

O estado de graça do Real Madrid nota-se com o primeiro lugar de Zidane e o terceiro de Ronaldo. Pelo meio, Henry (Arsenal). O estado de graça de Ronaldo nota-se de mês para mês. Agosto é o mês decisivo: joga na inauguração do José Alvalade, deslumbra Alex Ferguson, assina pelo Manchester United e estreia-se na selecção portuguesa, pela mão de Scolari.

2004 Ronaldinho

Com o número 7 de Best, Robson, Cantona e Beckham, o português Ronaldo encanta os adeptos mancunianos e celebra o primeiro título da carreira pelo United: é a Taça de Inglaterra, em cuja final marca de cabeça ao Millwall (3-0). No Verão, joga o Euro-2004 e volta a marcar de cabeça, em dose dupla – um à Grécia, na fase de grupos, outro à Holanda, na meia-final. Como tal, é o vencedor do Bravo, um prémio italiano à escala planetária para os sub-21. Num plano superior, mais sénior, o apelido Ronaldo mantém-se glorioso: agora é Ronaldinho o melhor do mundo, à frente de Henry e Shevchenko.

2005 Ronaldinho

O domínio de Ronaldinho no Barcelona prolonga-se (Lampard em 2.º, Eto’o em 3.º) no ano em que Ronaldo perde o pai, em Setembro, na véspera do jogo com a Rússia, em Moscovo, rumo ao Mundial-2006. É, de longe, a colheita mais fraca da sua existência, tanto no United (12 golos em 55 jogos) como na selecção (dois em 11).

2006 Cannavaro

Afundada em críticas, por culpa do “calciocaos”, a Itália dá a volta ao texto e sagra-se campeã mundial. Como tal, os especialistas votam em Cannavaro como o melhor do ano. Nesse Mundial da Alemanha, o nome de Ronaldo ganha força com um golo de penálti ao Irão (na fase de grupos) e outro à Inglaterra (no desempate, a caminho das meias-finais). Vai daí, fecha o top 10 do prémio FIFA com 69 pontos.

2007 Kaká

Campeão inglês pelo United, a duas jornadas do fim, o 7 português assume-se como grande nome do nosso contentamento e acaba o ano em terceiro lugar na FIFA, com 426 pontos, só atrás de Kaká (1047) e Messi (504). O topo do mundo está cada vez mais próximo.

2008 Cristiano Ronaldo

Campeão inglês (31 golos em 34 jogos) e europeu, sempre pelo United. Eis o ano da consagração de Ronaldo, segundo português a vencer o prémio FIFA. Com um total de 935 pontos, nem dá a mínima hipótese a Messi (678) e Torres (203).

2009 Messi

Sim senhor, o United de Ferguson é tricampeão inglês. Só que esse detalhe não chega para Ronaldo voltar a ganhar o prémio. O ano é de Messi, campeão espanhol e europeu pelo Barcelona na primeira época de Guardiola.

2016 Cristiano Ronaldo

A partir de 2010, a France Football e a FIFA resolvem unir esforços na entrega da Bola de Ouro. Segue-se um diálogo aborrecido entre Messi e Ronaldo. Ora ganhas tu, ora ganho eu. Este ano, a FIFA volta a inventar um prémio, o The Best, e Ronaldo é o merecido vencedor. Pela quantidade de golos e, sobretudo, pelo duplo título de campeão europeu (de clubes e de seleção).