O tema é “difícil”, as “dúvidas” são muitas, mas Pedro Passos Coelho tem “uma forme convicção” sobre o tema e acredita que vai estar “preparado para decidir” quando o Parlamento for chamado a legislar. É esse o exemplo que quer dar aos deputados do PSD e foi isso que, esta quinta-feira, pediu aos deputados, reunidos num colóquio dedicado ao tema da eutanásia, que venham a fazer quando o dia chegar: que tenham “coragem” de decidir.

O PSD terá uma posição assumida, devendo ter um projeto-lei a favor ou contra a eutanásia, apesar de o líder do partido lembrar que haverá liberdade de voto e que cada deputado votará conforme a sua consciência. Mas só depois de um debate aprofundado. E se no final desse debate permanecerem dúvidas, que é normal que aconteça, Passos pede prudência. “Devemos decidir de forma prudente”, avisou.

“É importante ter a coragem de, no fim do debate, assumir posição. É isso que estou convencido que os deputados do PSD vão fazer. No final, em consciência, não podemos deixar andar, não podemos não decidir apenas para ser simpáticos ou para não incomodar”, disse aos deputados, na sala do Senado, no Parlamento, onde decorre esta quinta-feira de manhã um colóquio organizado pelo partido e dedicado ao tema.

A eutanásia e o suicídio assistido entraram de rompante no Parlamento na semana passada, à boleia da discussão em plenário de uma petição cívica pró-eutanásia, mas depois depois de uma primeira abordagem, o debate abrandou. Os partidos assumiram não ter pressa para legislar porque um debate como este não se podia fazer “à pressa”. Bloco de Esquerda, PEV e PAN, contudo, anunciaram na altura que iriam avançar com iniciativas legislativas sobre o tema, sendo os únicos partidos que assumiram ter já uma posição assumida — e a favor.

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O Bloco de Esquerda, concretamente, está a ultimar um anteprojeto de lei, que vai ser apresentado no próximo dia 15, numa espécie de conferência no Parlamento, mas não será o projeto-lei definitivo. O texto será uma primeira base de discussão e ficará em discussão pública, a recolher contributos da sociedade civil, até ficar pronto para dar entrada formal no Parlamento.

O debate não está marcado mas é quase certo que avançará mesmo nesta legislatura. “Se o Parlamento for chamado a legislar, e é possível que seja, sobre um assunto que tem consequências irreversíveis para muitos e tão determinantes para o futuro, é importante que todas as dúvidas sejam devidamente pesadas”, começou por dizer o líder do PSD, que fez a intervenção de abertura da conferência, assumindo depois que, mesmo no fim do amplo debate, quando os deputados forem chamados a legislar, as dúvidas podem “remanescer” Mas nessa altura será preciso “coragem” para decidir e, por isso, pediu aos deputados que durante o processo não escondessem a sua opinião, quer fosse contra ou a favor, para ajudar os restantes a formar a sua.

“Devemos decidir de forma prudente, mas aqueles que tiverem mais convicção não podem deixar de partilhar os seus argumentos com os outros. É isso que distingue as sociedades democráticas, não deixaremos de expor as nossas opiniões e fundamentá-las”, disse.

Ou seja, primeiro o debate, os argumentos, e depois a formação de uma posição. Mas Passos recusa que essa formação de posição seja vista como “ideológica” ou “partidária”, ou que decorra do que aparece escrito no programa do partido. Prova disso é o facto de ter convidado o médico bloquista João Semedo para ser um dos oradores da conferência, na qualidade de subscritor da petição “Toda a Vida Tem Dignidade”.

A possibilidade de referendo, que foi assumida pela líder do CDS, Assunção Cristas, não é, para já partilhada pelo presidente do PSD. Passos Coelho quer “envolver o país em todo o debate”, podendo fazê-lo por intermédio dos partidos. Mas não se referiu à consulta popular como a melhor forma de o fazer, mas sim ao debate alargado na sociedade civil, através do envolvimento das universidades e organizações não governamentais.

Quanto a Passos Coelho, tem uma “firme convicção sobre o tema”, que só revelará no final do amplo debate que a sociedade fará. “Não deixarei de, a tempo, deixar bem claro perante todo o público político e social aquela que é a minha firme convicção nesta matéria, por mais dúvidas que esta convicção possa transportar”, concluiu.

BE apresenta anteprojeto pela despenalização da eutanásia

O médico João Semedo, ex-coordenador do Bloco de Esquerda e um dos promotores da petição pró-despenalização da eutanásia, aproveitou a ocasião do colóquio do PSD para reforçar o anúncio de que o BE iria avançar com um anteprojeto de lei sobre a matéria. O anúncio já tinha sido feito, na semana passada, pelo deputado José Manuel Pureza, durante o debate parlamentar sobre o tema, mas João Semedo avançou com a data: dia 15, para a semana. E com pormenores: terá 25 artigos e exclui o recurso à morte assistida a menores e doentes com perturbações mentais.

Deve ser “um adulto, consciente, lúcido, sem perturbações mentais, com uma lesão definitiva ou doença incurável, fatal e irreversível, num contexto de sofrimento intolerável e que exprima a sua vontade”, afirmou João Semedo. Essa vontade do doente tem de ser reiterada e deve também ter o aval de dois médicos, um deles da área da doença da pessoa, com a possibilidade de recorrer a um terceiro, psicólogo, para avaliar as condições psicológicas do requerente.

Numa das suas intervenções, João Semedo avançou ainda que o anteprojeto de lei permite a prática da eutanásia em espaços públicos e entrará no “mercado, como acontece noutras áreas da saúde”, cabendo à lei, se vier a ser aprovada, “proteger os cidadãos dessa possível mercantilização”.