Problemas financeiros foram durante várias décadas o nome do meio do Borussia Dortmund, adversário desta terça-feira do Benfica no regresso da Champions (19h45). Senão vejamos: no final da década de 20, coincidindo com a Grande Depressão, a aposta dos germânicos em jogadores profissionais trouxe muito mais pontos negativos à sua economia do que positivos no plano desportivo; nos anos 70, altura em que inaugurou o atual estádio (Westfalenstadion, ou Signal Iduna Park – mas já explicamos mais à frente este nome), acumulou dívidas e insucessos, ao ponto de descer de divisão; na década de 80, continuou a postura titubeante de gastar mais do que tinha. O cúmulo chegaria ainda assim em 2003, altura em que teve de ser o rival Bayern a emprestar dois milhões de euros durante um par de meses para pagar salários e evitar a falência. Nesse ano, o Borussia correu o sério risco de cair de vez no esquecimento ou fechar. O mesmo ano em que o Benfica abriu a porta a uma história que ainda hoje se escreve – foi aí que Luisão, que cumpre esta terça-feira o jogo 500 pelos encarnados, fez a sua estreia.

Esta será a semana do capitão das águias. Se calhar, há uns meses, poucos acreditavam que cumpriria esta segunda-feira os seus 36 anos como titular indiscutível, a um passo de entrar no lote restrito de jogadores com pelo menos 500 jogos pelo Benfica, juntando-se a Nené, Veloso e Coluna. Uns davam-no como excedentário, face à dupla Jardel-Lindelöf, que assegurou o tricampeonato na última época; outros quase lhe compravam o bilhete de ida sem volta para acabar a carreira no Brasil, na segunda divisão de Inglaterra (Wolverhampton) ou num desses campeonatos que não olham a gastos como a China. O Xerife aguentou, manteve as juras de amor ao clube nas redes sociais e recuperou o seu posto. Esta terça-feira vai reforçar a liderança como atleta com mais encontros europeus pelos encarnados (121).

Vamos então recuar de novo a 2003: a 14 de setembro de 2003, no Jamor (casa emprestada do Benfica enquanto a nova Luz se preparava para ser inaugurada no mês seguinte), o central estreou-se com um empate no dérbi lisboeta frente ao Belenenses, tendo mesmo apontado um golo nesse 3-3 à quarta jornada. A época terminaria com um saboroso segundo lugar e consequente acesso à Champions, assegurado na penúltima jornada em Alvalade frente ao eterno rival Sporting, antes da vitória na Taça de Portugal contra o FC Porto. No ano seguinte veio o primeiro Campeonato Nacional, que quebrou um raro jejum de 11 anos, com um golo decisivo frente aos leões a sete minutos do fim da penúltima jornada.

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Nessa altura, o Borussia Dortmund, potência que tinha conseguido ganhar a Liga dos Campeões em 1997 e chegar à final da Taça UEFA em 2002 (derrota com o Feyenoord), continuava a reparar os erros do passado para voltar a ser grande, tendo cortado os salários em 20% entre os jogadores que ficavam e vendido o naming do estádio por dez anos (passou a ser conhecido como Signal Iduna Park).

Um caça-alemães especialista nos jogos a eliminar

Em 2008, Jürgen Klopp chegou ao clube e devolveu o Borussia Dortmund aos títulos – até 2015, altura em que saiu à espera de um novo projeto (que seria o Liverpool), os germânicos conquistaram dois campeonatos, uma taça da Alemanha e duas supertaças, além de terem chegado à final da Champions de 2012/13 (derrota frente ao Bayern). Em 2009, Jorge Jesus chegou à Luz e colocou o Benfica de Luisão em constante festa – até 2015, altura em que saiu para o Sporting, as águias ganharam três campeonatos, uma taça de Portugal, cinco taças da Liga e uma supertaça. Ou seja, dez dos 17 troféus ganhos pelo internacional brasileiro desde que chegou à Luz.

45

Luisão não é propriamente um avançado mas tem deixado marca desde 2003, altura em que se estreou com o primeiro dos 45 golos apontados até ao momento. A maior vítima foi a Académica, com cinco

Hoje, as realidades são distintas. Luisão teima em fintar a idade e bater recordes atrás de recordes. É uma confirmação que continua a adiar o fim de uma era. Já o Borussia Dortmund tem aquele género de equipa com uma qualidade elogiada por todos, mas que continua a ver adiado o início de uma nova era (a robustez do Bayern na Bundesliga também não ajuda nada, acrescente-se). Na quarta posição, a 15 pontos da liderança, os alemães agora comandados por Thomas Tuchel vêem na Champions a única oportunidade de salvar a época. E foi na maior prova europeia que brilharam até ao momento: dois empates com o Real Madrid, duas vitórias frente ao Sporting e duas goleadas com o Legia de Varsóvia.

No entanto, do outro lado estará um Benfica que ameaçou o colosso Bayern na última época e que parece apostado a, no mínimo, repetir a presença nos quartos-de-final da última temporada. E conta com Luisão, que passou todas as quatro eliminatórias em que participou contra germânicos, sempre nos dezasseis-avos-de-final da Liga Europa – Nuremberga (2007/08), Hertha Berlim (2009/10), Estugarda (2010/11) e Bayer Leverkusen (2012/13). No ano passado, com o Bayern, não jogou. Agora, de novo contra uma formação alemã, vai ser titular e fazer história. Uma história que começou em 2003, ano em que o próximo adversário do central correu o risco de cair no esquecimento e foi salvo por um rival.