Este é aquele tipo de jogos que vale a pena começar a abordar pelo fim (até porque pela quantidade de pushes que deve ter recebido no computador, no iPad ou no telemóvel, o efeito surpresa foi à vida): Portugal venceu a Suíça por 2-0 e qualificou-se de forma direta para o Campeonato do Mundo da Rússia, no próximo ano. Mas vale a pena ir ainda um pouco mais à frente no filme e contar um episódio que se passou no final do encontro.

(E aqui passamos também em fast forward os cumprimentos aos adversários, os abraços entre jogadores, técnicos e restante staff da Seleção etc.) A certa altura, voltou a ouvir-se o hino no estádio da Luz, esse talismã no que toca a jogos de apuramento para Mundiais. E todos se agruparam para a fotografia da praxe, aquela que poderemos ver em tantos jornais um pouco por todo o mundo. Lá mesmo à ponta, estava Fernando Santos. Mas hoje, como nos restantes encontros desta fase de qualificação, ele foi tudo menos uma questão lateral.

Todos riam muito, o selecionador esboçava apenas um sorriso. Depois levantou o punho, fechado, e abriu dois dedos de vitória. Final de fotografia, tudo para o balneário? Não, calma aí! O timoneiro, que faz hoje mesmo 63 anos, chamou a atenção a todos que estava a ser entoado o hino nacional. Colocou a mão no peito, cantou-o até ao fim. Se existe uma imagem que nos remete para uma frase é esta: no Fernando (Santos), nós confiamos. E aproveitando o sortilégio deste apelido que nos tem dado tanta sorte, acrescente-se que não foi preciso nenhum milagre.

Portugal tinha ganho oito jogos consecutivos. Esta noite voltou a ser melhor. E venceu, de forma natural.

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Ficha de jogo

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Portugal-Suíça, 2-0

10.ª jornada do grupo B de qualificação para o Mundial

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Cüneyt Çakir (Turquia)

Portugal: Rui Patrício; Cédric, Pepe, José Fonte, Eliseu (Antunes, 68’); William Carvalho, João Moutinho; João Mário (Danilo, 90+1’), Bernardo Silva, Cristiano Ronaldo e André Silva (André Gomes, 75’)

Suplentes não utilizados: Anthony Lopes, Beto, Nélson Semedo, Bruno Alves, Renato Sanches, Gonçalo Guedes, Gelson Martins, Quaresma e Éder

Treinador: Fernando Santos

Suíça: Sommer; Lichtsteiner, Schär, Djourou, Rodríguez; Freuler (Zakaria, 46’), Xhaka; Shaquiri, Mehmedi (Embolo, 66’), Dzemaili (Zuber, 66’) e Seferovic

Suplentes não utilizados: Hitz, Mvogo, Moubandje, Elvedi, Akanji, Michael Lang, Gavranovic e Derdiyok

Treinador: Vladimir Petkovic

Golos: Djorou (41’, p.b.) e André Silva (57’)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Freuler (27’), Eliseu (45+1’) e Zakaria (69’)

A Seleção Nacional entrou como se pedia, a Suíça reagiu como se esperava. O que significa esta frase tão bonita mas que dita assim não quer dizer nada? Que a Seleção teve um início dominador em termos territoriais e de posse, a pressionar alto e com algumas recuperações de bola bem sucedidas, mas sem a qualidade necessária no último passe para criar situações de perigo. A única exceção foi mesmo um remate de André Silva prensado num defesa contrário, após uma interceção de João Mário, que Sommer desviou para canto (8′).

Com o passar dos minutos, os cruzamentos sempre errados e as más decisões que levavam a perdas de bola pelo corredor central deram o flanco para os helvéticos começarem a fazer o jogo que pretendiam: pela certa, com variações e exploração da subida dos laterais, aproveitando alguns desposicionamentos para colocar Xhaka como uma espécie de placa giratória a distribuir sem a pressão que deveria ter. Mas havia esse pormenor em comum com Portugal: a falta de chances. De tal forma que fez um único remate (desenquadrado) na primeira parte…

Até ao intervalo, Bernardo Silva, após um grande passe a rasgar de João Moutinho num lance confuso onde Cristiano Ronaldo tinha caído sem falta à entrada da área, obrigou Sommer à melhor defesa do primeiro tempo, com um remate forte travado para canto (32′). E parecia que não ia haver mais nada até que a sorte do jogo esteve com Portugal (ou o azar com a Suíça, como se queira) e surgiu o primeiro golo caído quase do céu: cruzamento de Eliseu para a zona morta entre guarda-redes e defesa, João Mário não conseguiu o desvio mas a perna de Djorou acabou por tocar de forma inadvertida a bola para a própria baliza (41′).

Há 13 anos que a Suíça não concedia um autogolo. Há três anos e meio que Portugal não beneficiava de um autogolo. E o último tinha sido em pleno Mundial do Brasil, frente ao Gana. A ideia estava percebida.

No segundo tempo, os helvéticos até fizeram um remate enquadrado de bola parada, por Shaquiri, na sequência de um livre direto de longe (51′). No entanto, essa seria uma imagem enganadora sobre o que se passaria de seguida.

Ronaldo já tinha deixado o aviso de longe, por cima (56′). Mas havia claramente mais Portugal, com uma defesa irrepreensível (quatro golos sofridos em dez encontros) e um meio-campo onde duas unidades (William e João Moutinho) valiam por três ou quatro no corredor central. Faltava apenas aquele toque de magia que iluminasse em definitivo a noite e, à falta de uma maior inspiração do capitão nacional, foi da varinha do coletivo que saiu o momento que, por si só, valia uma presença direta em qualquer Campeonato do Mundo.

Durante 47 segundos, os suíços levaram um chocolate onde andaram a cheirar a bola, que circulou entre Cédric Soares, Eliseu, Pepe, William Carvalho, João Moutinho, João Mário, Ronaldo, Bernardo Silva e André Silva. Foram os dois últimos que, na sequência de um passe primoroso do pequeno grande médio do Mónaco, completaram o momento de magia, finalizada pelo avançado do AC Milan após assistência do fantasista do Manchester City (57′).

Os visitantes bem tentaram mudar em termos táticos, bem arriscaram com mais avançados, bem alteraram a própria forma de chegar à baliza de Patrício, mas a verdade é que, excetuando pequenos momentos em que Portugal deixou que o jogo se partisse em demasia, o 3-0 esteve sempre mais perto do que o 2-1. Até Ronaldo falhou um golo isolado, algo tão raro como uma equipa perder apenas um jogo na qualificação e não se apurar de forma direta. Mas foi isso que aconteceu à Suíça. E é isso que provavelmente não voltará a acontecer com o capitão.

Portugal conseguiu o quinto apuramento consecutivo para a fase final do Mundial e o décimo se contabilizarmos também Campeonatos da Europa. Mas promete não ficar por aqui. Porque no Fernando (Santos), nós confiamos. E a verdade é que quando ele diz que vamos ganhar, ganhamos mesmo. Sem precisar de milagres. E a fazer história, como se percebe agora com a melhor taxa de sucesso alcançada numa qualificação para uma grande prova.