O estudo “Prevalência da ansiedade de voo numa amostra da população portuguesa”, apresentado recentemente na Ordem dos Psicólogos Portugueses e numa conferência internacional, em Malta, sobre psicologia da aviação, revela que há um conjunto de perceções que estão distorcidas, segundo Cristina Albuquerque, uma das autoras. “Trata-se de um estudo pioneiro em Portugal, e o interesse neste tipo de assunto é perceber como as pessoas veem o transporte aéreo. A perceção que têm de como é que, sendo um meio de transporte tão seguro, pode levar a que cerca de 30 por cento dos inquiridos considere ser perigoso andar de avião”, explicou em declarações à agência Lusa.

De acordo com dados de segurança da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA), em 2013 ocorreu um acidente por cada 2,4 milhões de voos, não querendo dizer que estes tenham sido fatais.

Cristina Albuquerque sustentou que há a “ideia distorcida” de que num acidente aéreo “ninguém sobrevive”. “Temos esta realidade, que são os factos, a estatística, e de outro lado, temos a perceção do comum dos mortais de que viajar de avião é perigoso. É uma realidade distorcida”, concluiu.

Para a psicóloga, especialista em casos de fobia de aviação há mais de 25 anos, um dos dados “mais surpreendentes” do estudo tem a ver com o facto de 71,2 % dos inquiridos evitar viagens de longo curso, mas tolerar as viagens de médio curso. “Verificámos que nestas últimas pessoas, 88,5% sofrem de ansiedade de voo. Há um conjunto de comportamentos que o passageiro aéreo tem e que são influenciados por uma ansiedade de voo latente”, sublinhou.

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Cristina Albuquerque referiu ainda que há muitas pessoas que recorrem aos medicamentos ou a bebidas alcoólicas para suportarem as viagens de avião, mas outras há que desistem de embarcar, optando por não enfrentar a sua fobia. A psicóloga exemplificou com um caso de uma pessoa que, por seis vezes consecutivas, embarcou e saiu dos voos, remarcando-os posteriormente e, só depois de um tratamento, conseguiu fazer uma viagem de negócios “importantíssima e que ia mudar o seu rumo profissional”.

De acordo com a especialista, há pessoas que prejudicam as suas vidas, familiares e profissionais, devido à fobia que têm em andar de avião, contando que há luas de mel “que acabam mesmo antes de começar, pois os noivos, tanto homens, como mulheres, saem do avião ou nem sequer chegam a passar do check-in”.

Segundo Cristina Albuquerque, esta fobia é desencadeada por um conjunto de causas, já que não se pode dizer que a pessoa “ganhou medo de viajar de avião ou depois de ter tido um acidente ou ainda de ter apanhado um grande susto”. “Na maior parte dos casos, como os acidentes são raros, não são estes que estão na base do desenvolvimento da fobia”, considerou, adiantando que, normalmente, se trata de pessoas “mais sensíveis e mais ansiosas em relação a tudo na vida, não sendo o avião a exceção”.

Cristina Albuquerque sublinhou ainda que o facto de não se deter o controlo depois de escolhida a viagem, destino, companhia aérea e horário, leva muitas pessoas a desencadear esta fobia. “Entramos no aeroporto e não controlamos mais nada. Não sabemos se o avião vai partir a horas, não sabemos quem vai no ‘cockpit’ a comandar, temos de nos colocar à mercê de um conjunto de procedimentos e pessoas que não controlamos, e isto é gerador de muita ansiedade em algumas pessoas. Há uma ausência total de controlo”, explicou.

O estudo vai ser apresentado no fim de semana de 13 e 14 de dezembro no ciclo de conferências alusivas ao centenário da aviação comercial, que se assinala este ano, promovido pelo município de Seia, e que irá decorrer na Casa Municipal da Cultura em Seia, na Guarda.