Ao quarto dia de audiência, na sequência da ação especial de tutela da personalidade que leva “SuperNanny” a tribunal, um dos diretores de programas da SIC revelou que a estação de Carnaxide esteve dois anos a ponderar se produzia o formato televisivo. “Estivemos dois anos a ponderar que se produzíamos ou não o programa. [No final ] entendemos encomendar a produção”, disse esta quinta-feira Luís Miguel Proença.

No Tribunal Judicial de Oeiras, Luís Miguel Proença disse ter analisado o impacto internacional de “SuperNanny” em países que se aproximam culturalmente de Portugal, referindo-se ao Reino Unido e a Espanha, e garantiu que o princípio de confiança gerado pelo programa — que existe há 14 anos e estreou-se em Inglaterra num canal público — esteve na base da decisão para avançar com o mesmo.

Tivemos em preocupação a aceitação do programa no Reino Unido e em Espanha, por exemplo. Em Portugal, emitimos dois episódios, em Espanha foram emitidas várias séries.”

O diretor de programas da SIC garantiu ainda que a estação não esteve envolvida na produção do programa, à exceção da respetiva edição, assegurando que existiu salvaguarda tendo em conta o nível de exposição das crianças. “Tentámos menorizar do ponto de vista da captação de imagens aquilo que pudesse ser tido como exploração gratuita.” Questionado sobre o interesse do programa estar apenas relacionado com as audiências — em média, 1.2 milhões de pessoas ficaram cada um dos dois episódios emitidos em janeiro –, Luís Proença referiu que as audiências “não podem ser o fim último e único de uma estação de televisão”.

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Em tribunal, Luís Miguel Proença disse ainda não ter conhecimento sobre o parecer requerido pela SIC à Ordem dos Psicólogos, em 2016, a propósito da alegada prática de psicologia em televisão, o qual foi negativo.

SIC nega ter ameaçado família com processo

Em tribunal, Luís Proença disse que não se encontrava na estação de Carnaxide quando o pai da menina que aparece no primeiro episódio se deslocou à SIC e solicitou o visionamento do programa antes deste ir para o ar. Segundo o testemunho da madastra de Margarida, dado no passado dia 13 de março, o pedido não só foi recusado, como o pai chegou a ser ameaçado com um processo. Agora, Luís Proença garante que à data os diretores responsáveis pela programação não estavam presentes e que o visionamento do programa não era viável por não ser “tecnologicamente possível”. “Nessa altura o programa estava a ser descarregado para os nossos servidores. No limite, esse visionamento só podia ser feito mais tarde, em Paço de Arcos.” Luís Proença disse ainda não ter qualquer conhecimento de uma ameaça feita ao pai da menina.

SuperNanny. Madrasta acusa membro da produção de influenciar comportamento de criança

Questionado pela representante legal de um dos pais, o diretor de programas da SIC explicou ainda que, aquando da produção do programa, não chegou a ser equacionada a possibilidade de os pais visualizarem os programas antes destes serem emitidos. “Diria que não chegámos a isso.”

Teresa Paula Marques esteve envolvida no casting

Pedro Cardoso, responsável pela Warner Bros. em Portugal, foi a testemunha comum à SIC e à produtora que se seguiu. O produtor de televisão confirmou em audiência que o processo de casting passou pelo uso de imprensa e de redes sociais, e que a produtora também recorreu a ATL, ainda que não tenha selecionado qualquer família referenciada. “Pedimos autorização para pedir a promoção do programa.”

Patrícia Mateus, a mãe da menina que seria apelidada de “Furacão Margarida” na sequência do primeiro episódio do programa “SuperNanny”, chegou a confirmar ao Observador que foi o ATL que a menina frequenta, em Loures, que reencaminhou o pedido da produtora para encontrar famílias.

No final de janeiro, o Observador noticiou que a produtora de “SuperNanny” contactou várias IPSS para ajudarem na divulgação do projeto e referenciarem famílias. À data, uma delas, que havia recusado o apelo, revelou o email ao Observador.

Produtora de SuperNanny pediu a IPSS para referenciarem famílias

Pedro Cardoso explicou ainda que a produção procurou famílias que preenchessem determinados requisitos, sendo que a diversidade foi precisamente um dos critérios. Uma primeira triagem das famílias aconteceu via telefónica.

Há uma equipa encarregue de reunir todas as inscrições. Depois, há um coordenador de conteúdos que vai selecionando as candidaturas. Excluímos famílias que estivessem referenciadas por alguma instituição ou junto das quais não conseguíssemos reunir as autorizações necessárias para avançar com o programa”, disse Pedro Cardoso.

Questionado pela juíza sobre como asseguravam que as famílias não apresentavam quaisquer comportamentos patológicos, o representante da produtora em Portugal referiu que a avaliação foi feita com base em informações cedidas pelos próprios pais através de questionários previamente preenchidos e que a própria Teresa Paula Marques avaliou os casos, estando, assim, envolvida também no casting das famílias.

Teresa Paula Marques, psicóloga de profissão, já antes deixara claro que estava a participar no programa enquanto educadora — personagem que apresenta alguns traços em comum com as “amas” dos formatos internacionais, segundo assegurou em audiência –, pelo que disse não ter feito avaliações enquanto psicóloga. Perante isto, Pedro Cardoso respondeu que os casos a participar no casting eram “passados” à apresentadora do programa, que podia decidir se estes avançavam ou não. “Ela tinha liberdade e poder para dizer que não se identificava ou que não se sentia confortável com alguma coisa”, disse, confirmando em tribunal que nada disto estava oficialmente acordado com Teresa Paula Marques.

“Houve uma consultora [psicóloga] que trabalhou connosco nos primeiros três casos”, acrescentou. Esta psicóloga estaria disponível para acompanhar as famílias após as gravações, caso os visados sentissem necessidade de algum tipo de acompanhamento.

Pedro Cardoso negou ainda que um operador de câmara tivesse instigado a menina do primeiro episódio a ter determinados comportamentos. Em audiência, Luísa Botelho, mulher do pai da menina, acusou um membro da produção de a ter convencido a exagerar determinados comportamentos — a testemunha deu como exemplo as cenas em que Margarida cospe para a mesa, bate na mesa com força e chama a mãe de “estúpida”. “Não tenho conhecimento disso. Se tivesse, teria agido em conformidade. Teria afastado o operador de câmara que tivesse agido dessa forma”, disse Pedro Cardoso.

[Em atualização]