Sérgio Conceição não é treinador de ficar engasgado. Longe disso. O que tem para dizer, diz – mesmo que as perguntas feitas não tenham propriamente o objetivo de dizer aquilo que o engasgara. Foi isso que aconteceu no lançamento desta deslocação a Matosinhos para defrontar o Leixões. Em relação à colocação de Pepe no banco em detrimento de Sérgio Oliveira. Em relação a algumas análises feitas ao esquema adotado em Alvalade frente ao Sporting. Em relação, também ou em paralelo com tudo isso, a um resultado que lhe custou aceitar frente a um adversário que poucos esperavam ter linhas tão baixas perante o contexto do jogo e a relevância dos três pontos para diminuir a distância pontual para o topo da classificação no final da primeira volta.
FC Porto vence Leixões no prolongamento por 2-1 e defronta Sp. Braga nas meias da Taça de Portugal
Com a devida distância temporal, é muito provável que se perceba daqui a algumas semanas que o empate sem golos no clássico não foi assim tão prejudicial – e diz a história que quem termina com cinco ou mais pontos de vantagem a primeira volta acaba sempre por ganhar o título (foi assim 15 vezes). No entanto, o técnico dos dragões ficou com aquela sensação de que foram 18 vitórias que podiam ser 19. E como não é de ficar engasgado, acrescentou mais um capítulo à sua versão 2.0 de FC Porto. 2.0 porque utilizou elementos habitualmente suplentes mas também porque continua a testar a polivalência do plantel. Desta vez, com outra surpresa positiva: a colocação de Mbemba como lateral direito no lugar de Maxi Pereira.
Olhando para as características do congolês contratado esta temporada ao Newcastle, e dentro das possibilidades existentes, era mais provável colocar com sucesso o jogador como uma espécie de falso trinco do que propriamente como lateral. E, mais uma vez no plano teórico, por uma única razão: não parecia ser alguém capaz de chegar à linha de fundo para cruzar com sucesso; afinal, esse foi o menor dos seus problemas. Ainda assim, quem se começou por destacar foi a grande “criação” de Sérgio Conceição na presente temporada: Óliver Torres, versão médio-centro-total-a-defender-e-a-atacar que perdeu o lugar com a aposta mais recorrente no 4x4x2 com Soares na frente com Marega mas que tem agora na lesão de Danilo nova oportunidade.
Ficha de jogo
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Leixões-FC Porto, 1-2 (a.p.)
Quartos de final da Taça da Portugal
Estádio do Mar, em Matosinhos
Árbitro: João Capela (AF Lisboa)
Leixões: Luís Ribeiro; Jorge Silva, Matheus, Bura, Stéphane; André Ceitil (Zé Paulo, 72′), Lawrence Ofori (Amine Oudrhiri, 90+1′), Luís Silva; Erivaldo, Bernardo (Evandro Brandão, 62′; Roniel, 91′) e Pedro Henrique
Suplentes não utilizados: Fábio Matos, Derick e Monteiro
Treinador: Jorge Casquilha
FC Porto: Fabiano; Mbemba (Marega, 87′), Felipe, Pepe, Alex Telles; Herrera, Óliver Torres; Corona (Éder Militão, 70′), Adrián López, Fernando Andrade (Hernâni, 99′) e André Pereira (Soares, 80′)
Suplentes não utilizados: Casillas, Jorge e Sérgio Oliveira
Treinador: Sérgio Conceição
Golos: Herrera (11′), Zé Paulo (78′) e Hernâni (118′)
Ação disciplinar: cartão amarelo a Felipe (29′), Pepe (87′) e Jorge Silva (107′)
No Mar, o FC Porto conseguiu pescar mais do que a passagem às meias-finais da Taça de Portugal, onde irá defrontar o Sp. Braga; pescou alternativas para um calendário que não dá tréguas nos próximos dois meses (pelo menos). O Leixões, uma equipa ainda a ser trabalhada pelo novo técnico Jorge Casquilha, tem todas as condições para fazer uma Segunda Liga na parte de cima da tabela classificativa – e também lançou a cana para algo mais, neste caso a parte da receita dos azuis e brancos nesta partida – e conseguiu contrariar um campeão nacional ao ponto de levar a eliminatória a prolongamento. No entanto, e apesar desse mérito do conjunto de Matosinhos, houve igualmente uma grande dose de demérito dos azuis e brancos, que se livraram a dois minutos do fim dos penáltis numa noite de experiências onde sofreram quando lhes faltou na fórmula o ADN original de procura da baliza, agressividade sobre o portador da bola e controlo do jogo. Com isso, foi sempre melhor.
Na surpresa menos surpresa no onze, Pepe cumpriu o seu regresso aos dragões 11 anos e meio depois como titular ao lado de Felipe, numa dupla sempre agressiva e implacável com os avançados leixonenses. Mas houve mais novidades, como Fabiano na baliza ou o trio Adrián López, Fernando e André Pereira num ataque que repetia apenas Corona. Mais do que nomes, valeu a atitude. A entrada a recusar o “deixa andar” e que não demorou a atingir o “andar depressa”. A pressionar alto, a ter uma circulação segura, a explorar o espaço pelos três corredores. E também a vantagem não demorou: depois de uma jogada na direita a passar por Mbemba e Corona, Óliver Torres picou a bola para a área onde Herrera conseguiu receber já em esforço mas a tempo de desviar o adversário que saiu na bola e atirar sem hipóteses para Luís Ribeiro (11′). Pouco depois, Fernando rodou bem na área após novo passe em profundidade e rematou com perigo mas às malhas laterais (17′).
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Por falta de indicações não era. Casquilha estava minuto sim, minuto sim a pedir à equipa com gestos para subir as linhas, ao mesmo tempo que ia tentando uma maior coesão no corredor central para impedir o FC Porto. Lawrence ia tentando agitar as coisas à entrada do último terço e o Leixões conseguiu mesmo equilibrar o encontro embora sem oportunidades que não fossem cruzamentos fáceis para Fabiano agarrar. E seria Fernando a ter a melhor chance até ao intervalo, numa jogada iniciada em Alex Telles com assistência de calcanhar de Adrián López para o remate por cima do brasileiro (37′).
O segundo tempo manteve a mesma toada mas com as balizas ainda mais distantes do centro de conversa. O FC Porto baixou e muito a agressividade em campo, andou algumas vezes de salto alto num campo difícil e com demasiada areia mas o Leixões, estando melhor, também continuava sem chatear muito Fabiano. Os treinadores começaram a mexer. Ou melhor, Casquilha quis mexer, procurar algo novo para chegar ao empate; já Conceição quis testar, procurar algo novo para ensaiar novos compromissos. Foi nesse contexto que Éder Militão rendeu Corona, que tinha acabado de falhar a melhor oportunidade do segundo tempo; foi nessa perspetiva que Zé Paulo entrou para o lugar de Ceitil, que andava demasiado preso no meio-campo.
Assim como o FC Porto precisou apenas de um remate enquadrado para marcar, também o Leixões empatou aos 78′ na primeira tentativa à baliza. Foi apenas o terceiro golo sofrido pelos azuis e brancos esta temporada de fora da área e numa zona crítica que costuma ser proibida para as equipas contrárias, entre a defesa e o elemento mais recuado do meio-campo. Quando Éder Militão percebeu que havia ali um erro posicional, ainda podia fazer falta mas acabou por não carregar o brasileiro que fazia apenas o quarto encontro pelo conjunto de Matosinhos, que aproveitou a benesse para colocar no ângulo inferior. Soares entrou de imediato e ainda teve um cabeceamento ao lado da baliza de Luís Ribeiro, assim como Zé Paulo arriscou ser mais herói mas atirou para as mãos de Fabiano. E ainda houve um livre direto de Bura, bem marcado mas ligeiramente por cima da trave do número 2 de Iker Casillas. O prolongamento, que parecia utópico, tornava-se um cenário inevitável.
Na pausa, a mensagem de Sérgio Conceição passou. Que é como quem diz, o pedido de redenção foi aceite. O FC Porto voltou a pressionar alto, esgotou as poucas forças que ainda restavam nos jogadores mais influentes do Leixões e assentou arraiais no meio-campo contrário tentando chegar de todas as formas à baliza de Luís Ribeiro. Depois de um lance em que Fernando ficou a pedir penálti de Stéphane, Soares ainda marcou mas o golo acabou por ser mal invalidado após uma primeira tentativa de Marega bem travada pelo guarda-redes leixonense – e nos jogos da Taça de Portugal não há VAR. Mas há, agora, o direito à quarta substituição. E foi daí que nasceu o triunfo: já depois de ter falhado uma oportunidade flagrante isolado, permitindo o toque para canto de Luís Ribeiro, Hernâni deu o melhor seguimento a uma assistência de Adrián López no seguimento de uma jogada iniciada de novo na visão de jogo de Óliver Torres para fazer, aos 118′, o golo que viria a decidir a eliminatória.