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YOSHIKAZU TSUNO/AFP/Getty Images

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Ciência 2016. Materiais inteligentes, medicina personalizada e mistérios do universo desvendados

A tendência é que, cada vez mais, a ciência básica e fundamental se transforme em ciência aplicada, com uma presença crescente no nosso dia-a-dia. O que é que os cientistas destacam para 2016?

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O Observador desafiou alguns cientistas e diretores de unidades de investigação a fazerem uma previsão do que estará em destaque na Ciência em 2016. Uma tarefa que se mostrou algo difícil, mas não impossível.

NANOTECNOLOGIA: lâmpadas LED para purificar a água e mudanças na medicina

Lars Montelius, diretor-geral do Laboratório Internacional Ibérico de Nanotecnologia

“Olhar para o futuro é sempre difícil. É especialmente difícil prever com precisão quais serão as descobertas científicas nos próximos 20 anos”, disse ao Observador Lars Montelius, diretor geral do Laboratório Internacional Ibérico de Nanotecnologia (INL), em Braga.

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“O que vai acontecer no próximo ano é, sobretudo, a continuação dos acontecimentos mais importantes deste ano.” E como exemplo falou no Ano Internacional da Luz e de todas as atividades relacionadas com o tema. Inevitavelmente, a visibilidade criada terá impacto no ano de 2016. “Não é tanto uma consequência em termos de descobertas científicas, mas o resultado de uma maior compreensão por parte dos interessados, em especial investidores e setores empresariais.” Um dos exemplos é a utilização de lâmpadas LED na purificação das águas, em vez das lâmpadas de mercúrio.

“A iluminação é apenas um exemplo das mudanças que iremos presenciar no próximo ano. De forma geral, os nossos “objetos” familiares vão tornar-se “sujeitos” como consequência do aumento da integração das funções inteligentes na maioria dos materiais do presente e do futuro, baseando-se na inclusão da nanotecnologia diretamente nos materiais.” O diretor-geral do INL acrescenta que no próximo ano o valor acrescentado desta indústria e a internet das coisas vão ser tema de debate, não só em termos de tecnologia, mas também de segurança, integridade ou direitos sobre os dados.

Se nos focarmos no domínio científico e tecnológico, a área onde veremos as maiores mudanças e muitos novos resultados é a área das energias como consequência direta do aumento da atenção no aquecimento global. Aqui serão sobretudo as soluções para aproveitar a energia solar e para fazer melhores baterias. Em ambos os casos serão os esforços crescentes da nanotecnologia que terão um papel importante.” Lars Montelius acrescenta ainda o papel crescente que a nanotecnologia terá nos diagnósticos médicos, na medicina personalizada, nos “bio-implantes inteligentes com sensores integrados” e nos “curativos de feridas inteligentes” que relatam o próprio estado do processo de cura.

"Os nossos 'objetos' familiares vão tornar-se 'sujeitos' como consequência do aumento da integração das funções inteligentes na maioria dos materiais do presente e do futuro."
Lars Montelius, diretor-geral do INL

TECNOLOGIA: “Espero que haja um enfoque na investigação que nos permita criar e gerar riqueza”

Elvira Fortunato, diretora do Centro de Investigação de Materiais (Cenimat), da Faculdade de Ciências da Universidade Nova de Lisboa

“Em termos científicos espero que 2016 traga novos avanços sustentados em várias áreas, como:

Energia: ir além da sequestração de dióxido de carbono (CO2) para uma efetiva utilização do CO2 como matéria-prima, para podermos assim fechar o anel de sustentabilidade, que tanto ambicionamos, e assim contribuir para uma diminuição do aquecimento global.

Alimentação: promover formas interativas autossustentadas de funções inteligentes nas embalagens, que nos permitam controlar em tempo real a qualidade dos alimentos e, dessa forma, diminuir drasticamente os desperdícios atualmente gerados pelo método de amostragem, que se baseiam em códigos de barras.

Água: criar formas de controlo e distribuição de água através de protocolos de eficiência de utilização/reutilização de água e sua purificação recorrendo, por exemplo, às nanotecnologias, de forma a garantir sustentabilidade deste ecossistema vital para a humanidade.

Saúde: utilizar plataformas multifuncionais inteligentes capazes promoverem a deteção e despistagem de doenças, situação muito importante atualmente, especialmente quando associada aos fluxos de migrantes.

Em termos nacionais, espero que haja um enfoque na investigação que nos permita criar e gerar riqueza – além do conhecimento -, que contribua efetivamente para dar mais conforto e bem-estar aos nossos cidadãos. Para isso, espero que tudo isto seja acompanhado por uma maior estabilidade e consistência do sistema científico, a nível de projetos e bolsas de doutoramento/pós-doutoramento.

Espero também que o excesso de burocracia a que estamos sujeitos seja simplificado, com uma maior responsabilização atribuída aos investigadores, em termos de gerarem ideias ou inovarem. Assim, desejo que exista um diálogo proativo e efetivo entre o Ministério das Finanças e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e que se possa fazer o balanço dos investimentos realizados, de forma a consolidarmos uma estratégia nacional de futuro, que passará inevitavelmente por um alinhamento com as políticas europeias de Ciência e Tecnologia.”

ASTROFÍSICA: “ALMA será a vedeta de uma rede global de telescópios”

José Afonso, investigador no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço

O ano que se aproxima apresenta-se como extraordinariamente promissor para o estudo do universo. No nosso ‘quintal’ temos missões como a Akatsuki para Vénus, a sonda Juno para Júpiter e a BepiColombo para Mercúrio, que trabalham em coordenação com os maiores telescópios terrestres, como o VLT [Very Large Telescope, no Cerro Paranal no Chile] e o ALMA [Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, no planalto Chajnantor do Chile]. Estas missões permitirão avançar no nosso conhecimento sobre o sistema solar.

A sonda Akatsuki entrou na atmosfera de Vénus a 9 de dezembro de 2015 - Akihiko Ikeshita/AFP/Getty Images

Akihiko Ikeshita/AFP/Getty Images

No estudo dos exoplanetas, além de se prosseguir na deteção de corpos cada vez mais semelhantes à Terra, avançar-se-á para o estudo – ainda básico, mas revolucionário – das suas atmosferas, área que em 2015 já revelou avanços impressionantes.

Será também em 2016 que o ALMA atingirá as suas capacidades plenas possibilitando o estudo das primeiras galáxias e, em particular, da ‘nossa’ CR7 – aquela que tem, aparentemente, a luz da primeira geração de estrelas do universo. Em 2016 será também instalado o instrumento Espresso (em parte ‘made in Portugal’) que permitirá juntar a luz dos quatro telescópios VLT e que se revelará essencial para o estudo dos exoplanetas e da própria estrutura do universo antes da chegada do E-ELT [European Extremely Large Telescope, no Cerro Armazones no Chile], na próxima década.

O estudo do buraco negro central da Via Láctea estará também em foco em 2016, quer com o ALMA – que será a vedeta de uma rede global de telescópios capaz de realizar este estudo -, quer com o instrumento Gravity (que também tem sangue português) recentemente instalado no VLT.”

FÍSICA: “2016 vai ser o ano das ondas gravitacionais”

Vítor Cardoso, especialista em buracos negros e coordenador do grupo de investigação em gravidade no Centro Multidisciplinar para a Astrofísica (Centra), do Instituto Superior Técnico

“Em Física, 2016 vai ser o ano das ondas gravitacionais. Existem rumores, semioficiais, de que foi detetada esta grande última previsão da teoria de Einstein. Estas ondas viajam à velocidade da luz e transportam consigo informação dos astros que as geraram, estrelas de neutrões, buracos negros e até a inflação. São por isso o Santo Graal em Física, que nos vai permitir conhecer muito melhor o nosso Universo.

Mas podemos também ter novidades do CERN (Laboratório Europeu de Física de Partículas): no dia 16 de dezembro foram divulgados os últimos dados que apontam para a possibilidade de existência de uma outra partícula não prevista pelo Modelo Padrão.”

“Uma das coisas que podemos vir a descobrir é se encontrámos ‘o’ bosão de Higgs ou ‘um dos’ possíveis bosões de Higgs.”
Gaspar Barreira, investigador no LIP

FÍSICA: “Sabemos onde queremos chegar, mas não sabemos quando isso vai acontecer”

Gaspar Barreira, delegado de Portugal no Conselho do CERN e diretor do Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP)

Gaspar Barreira, representante português no Conselho do CERN (Laboratório Europeu de Física de Partículas), admite que só pode falar daquilo que conhece: física de partículas e de altas energias. Mas que esta não é a única área da ciência que vai ter destaque. De qualquer forma, o investigador defende: “Sabemos onde queremos chegar, mas não sabemos quando isso vai acontecer”. É por isso que teve dificuldade em apontar quais serão os destaques para 2016: a partir do próximo ano a investigação nas duas áreas que escolheu vão intensificar-se, mas os resultados podem chegar só dentro de quatro ou cinco anos.

Aproveitando o prémio Nobel da Física 2015, Gaspar Barreira lembra que, agora que se sabe que os neutrinos têm massa, é preciso definir qual dos três é o mais pesado e qual o mais leve. A ordem das massas pode ter implicações no Modelo Padrão da Física.

O Modelo Padrão poderá também vir a ser posto em causa com os resultados da segunda temporada do acelerador de partículas (LHC, na sigla em inglês para Large Hadron Collider) do CERN. Ou não. “Nestes meses [em 2015] em que já esteve a funcionar foi possível confirmar o que já se sabia, mas não se encontrou nada de novo”, afirma o investigador do Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP). “Uma das coisas que podemos vir a descobrir é se encontrámos ‘o’ bosão de Higgs ou ‘um dos’ possíveis bosões de Higgs.”

FÍSICA: “Um novo sincrotrão com um desempenho 100 vezes superior ao dos atuais”

Francesco Sette, diretor-geral do ESRF – Sincrotrão Europeu

“A ciência de raios-X futura, nos sincrotrões modernos, visa criar uma ponte entre a luz visível e a microscopia eletrónica, permitindo resoluções desde um bilião de átomos até à escala nanométrica [0,000000001]. O projeto Extremely Brilliant Source [Fonte Extremamente Brilhante] do ESRF [Sincrotrão Europeu] é um novo desafio, aceite por 21 Estados-membros do ESRF, que vai criar uma nova fonte de sincrotrão, com um desempenho 100 vezes superior ao dos atuais sincrotrões. [Este projeto] irá fornecer ferramentas sem precedente às gerações futuras de cientistas para descobrirem novos campos na exploração científica da matéria.

O que é um sincrotrão?

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Um sincrotrão é um acelerador circular de eletrões. O movimento destes eletrões de alta energia, a viajar a elevada velocidade, liberta energia sob a forma de raios-X extremamente poderosos.

ESRF

Em causa, estão muitos campos da investigação fundamental e aplicada: nanoscopia para a conceção de novos materiais, ciências em condições extremas (ciência planetária, tecnologia de materiais), nano-imagiologia multidimensional (3D, tempo, química, etc.), biologia estrutural e medicina, ciência dos materiais, nanotecnologias, ciência ambiental e energia.

Os desafios e oportunidades são muitos: inventar medicamentos novos e mais dirigidos, criar materiais mais funcionais e user-friendly [favorável ao usuário], definir novas gerações de semicondutores para a indústria eletrónica, melhorar a gestão da energia, contribuir para a produção de comida mais saudável, compreender a composição do nosso planeta, desvendar os mistérios da humanidade, preservar a herança cultural.”

BIOLOGIA MOLECULAR: como o ‘splicing’ pode mudar a medicina

Iain Mattaj, director geral do Laboratório Europeu de Biologia Molecular (EMBL)

“Os grandes passos na ciência são, regra geral, imprevisíveis, mas a investigação biomédica está atualmente em contínua transformação. Novas tecnologias, big data [grande quantidade de dados] e progressos a nível computacional apoiam avanços na compreensão das doenças humanas, como o cancro, assim como nos permite visualizar e compreender a biologia a [várias] escalas: dos átomos aos órgãos e tecidos.

Para pegar noutro exemplo, os genes de todos os organismos, exceto nas bactérias, não estão codificados de forma linear no ADN. Estão antes divididos por interrupções, ou intrões [porções do ARN ou ADN que não codificam proteínas], que têm de ser removidos por splicing [cortar e colar partes] para produzir ARN maduros e funcionais para codificar proteínas. O splicing acontece numa máquina molecular que consiste em cerca de 200 proteínas e cinco ARN. Isto é muito dinâmico e o splicing requer vários grandes reajustes de todos os componentes.

Há cinco anos era inimaginável que conseguíssemos ver o splicing a acontecer à escala dos átomos, mas acredito que vamos (começar a) fazê-lo no próximo ano. Isto vai trazer-nos um enorme entendimento: novo conhecimento que nos vai ajudar a perceber como arranjar o splicing quando acontecem erros [associados a doenças].”

Os passos do "splicing" para retirar o intrão do ARN - BCSteve/Wikimedia Commons

BCSteve/Wikimedia Commons

GENÉTICA: a modelação genética estará em destaque em 2016

Cecília Arraiano, coordenadora do grupo de Controlo da Expressão dos Genes, no Instituto de Tecnologia Química e Biológica, na Universidade Nova de Lisboa

O que é o CRISPR?

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Um sistema CRISPR/Cas é composto por sequências de ADN procariótico (CRISPR) e proteínas, como as Cas. Este conjunto funciona como um sistema imunitário para os organismos procariotas, como as bactérias, e pode conferir uma forma de imunidade adquirida.

“Em 2016 há temas científicos que vão estar em grande destaque. O primeiro será decerto a aplicação de tecnologias genéticas baseadas em sistemas CRISPr/Cas9, que foram descobertos em bactérias, mas que podem ser aplicados em todos os seres vivos. Nestes sistemas utilizam-se sondas de ARN (ácido ribonucleico) que são dirigidas a locais determinados do genoma e originam a clivagem e remodelação cirúrgica do ADN cromossomal.

Irá também estar em grande foco a investigação sobre exosomas (vesículas celulares) que transportam moléculas de umas células para as outras fazendo uma grande rede de comunicação de informação intercelular [entre as células].”

MEDICINA: “Travar envelhecimento deverá ser um foco além do tratamento das doenças”

Maria Paula Macedo, membro da direção do Cedoc, e Maria Serrano Correia, do Gabinete de Comunicação de Ciência do Cedoc – Centro de Estudos de Doenças Crónicas, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa

“Na era que se aproxima, os próximos estudos contemplarão uma interface entre a genómica [função biológica dos genomas] e o fenótipo individual [aspeto físico]. Novas aplicações em telecomunicações e sensores permitem avaliar em contínuo cada indivíduo e identificar marcadores de fenótipos que sinalizam fatores de risco no desenvolvimento de determinada patologia. Hoje em dia, já é possível identificar a dimensão e estilo de exercício, o tipo de sono, a variação das glicemias (glucose no sangue) e muitos outros fatores envolvidos, por exemplo, em doenças crónicas.

Num primeiro tempo é imperioso identificar fatores de risco, que reconheçam a interface entre genótipos/fenótipos e que levem a uma intervenção mais imediata e personalizada. Consegue-se fazer uma estratificação das patologias e distinguir os indivíduos com diabetes que poderão desenvolver retinopatia diabética dos que desenvolverão pé diabético.

Depois, é importante perceber como manter a qualidade de vida nos anos de ouro: a ciência básica focada nos mecanismos de envelhecimento para travar este processo – nas células, nos órgãos, no corpo -, deverá ser um foco além do tratamento das doenças.

Por fim não podíamos deixar de referir a Ciência da Comunicação. Faça-se a Ciência que se fizer, temos o direito e o dever de a comunicar. Com mais ou menos tecnologia, com robôs ou sem eles, a comunicação e a relação humana fará sempre diferença.”

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