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João Leão tem de apresentar o Programa de Estabilidade no máximo até 15 de abril
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João Leão tem de apresentar o Programa de Estabilidade no máximo até 15 de abril

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

João Leão tem de apresentar o Programa de Estabilidade no máximo até 15 de abril

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

8 incertezas que atrapalham o Programa de Estabilidade (e um problema para resolver mais tarde)

O ministro das Finanças está a preparar o Programa de Estabilidade rodeado de indefinições. Mas tem uma certeza — Bruxelas não vai "cobrar" para já as derrapagens orçamentais.

Não é bem como atirar a moeda ao ar, mas qualquer exercício que vise estimar o que vai acontecer ao longo do ano — ou prever os próximos quatro, como faz o Programa de Estabilidade que será entregue a 15 de abril (último dia do prazo) — será sempre difícil. Esta fase, no entanto, é pior, porque ninguém sabe o que acontecerá no ano em que se espera que haja uma despedida da pandemia.

Há elementos que o Governo controla melhor do que outros, não porque adivinhe melhor, mas porque tem instrumentos à sua disposição que condicionam o rumo dos acontecimentos — é o caso da meta do défice para o ano em curso, em que cabe ao executivo decidir a dimensão dos apoios sociais ou, por regra, até que ponto abre os cordões à bolsa para apoiar empresas e famílias. Já para não falar das famosas cativações, em que o ministro das Finanças tem um certo nível de liberdade face às autorizações que o Parlamento concedeu quando aprovou o Orçamento do Estado.

Neste capítulo, João Leão já deu uma pista, que só conta parte da história (tendo em conta que estamos ainda em março) — o saldo orçamental deverá mesmo degradar-se face àquilo que previa em outubro, não só porque houve um novo confinamento pelo meio, mas porque as linhas de crédito que o Governo deu são uma bomba ao retardador, com consequências em 2021 e 2022.

João Leão reconhece que custos com apoios são maiores do que o previsto e défice deste ano deverá ser revisto

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A dimensão destes estragos para as contas públicas tem uma estimativa, mas ainda é incerta — como, aliás, muitos outros aspetos, a começar pelo andamento da atividade económica, que tem consequências diretas na receita e na despesa do Estado.

Nessa outra vertente, das estimativas de crescimento, os governantes — e todas as entidades que se dedicam a tentar perceber quanta riqueza será produzida pelo país — têm de contar com uma maior incerteza, e mais ainda a curto prazo, o que torna este exercício de consultar a “bola de cristal” ainda mais errático.

Até ver, o Banco de Portugal, levando em conta já parte do mais recente confinamento, continua a acreditar num crescimento de 3,9% para a economia portuguesa em 2021. E melhora as previsões para 2022. O Conselho das Finanças Públicas, por seu lado, vê a economia atrasar a retoma, mas acredita que 2022 terá um crescimento robusto (4,9%), empurrado pelo fim da pandemia e pelos fundos europeus. E antecipa que o défice também ficará sob controlo (-2,1%) nesse ano.

Já o Fundo Monetário Internacional acredita que o crescimento atinja os 3,9% este ano e os 4,8% no próximo (neste caso, a previsão menos otimista dos três por apenas algumas décimas). Em relação ao saldo orçamental, no entanto, apesar de antever 5% de défice este ano, o FMI acredita que baixe para -1,9% no próximo e atinja mesmo um excedente de 0,5% (o mais alto da UE) em 2024.

CFP menos otimista para 2021, mas 2022 é ano de brilharete — economia mete prego a fundo e Estado controla contas

O que é certo é que João Leão contará nos próximos tempos com a flexibilidade de Bruxelas, que, em tempos de pandemia, retirou dos ombros dos estados-membros o peso do cumprimento das metas orçamentais. No caso da dívida pública, atingiu 133,6% no ano passado, um valor recorde. Mas esse será um problema para resolver mais tarde.

Quando e como é que a economia se despede do confinamento?

A primeira incógnita com que o Governo terá de lidar é bastante imediata. António Costa amarrou as possibilidades de desconfinamento a um conjunto de indicadores que medem o risco da situação epidemiológica e que, dia sim dia não, deixam parte do país na expectativa para perceber se o “verde” ainda se mantém, entre o agora famoso R(t) (índice de transmissibilidade, isto é, o número de pessoas que alguém pode infetar) e a taxa de incidência (número de novos casos por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias) na matriz de risco desenhada pelos especialistas.

Será que o desconfinamento vai mesmo realizar-se ao ritmo anunciado pelo primeiro-ministro? Vai depender do vírus, de quem o transporta, e das opções que o Governo tomar para que não haja uma nova vaga de casos de Covid-19. E isso pode fazer toda a diferença para o crescimento do país, nomeadamente a curto prazo.

Numa primeira fase reabriram as creches, o ensino pré-escolar, as escolas do primeiro ciclo e as atividades de tempos livres (ATL) para essas idades; o comércio ao postigo é autorizado e reabriram cabeleireiros, manicures, livrarias, comércio automóvel, mediação imobiliária, bibliotecas e arquivos.

Rui Oliveira/Global Imagens

Depois da Páscoa, a 5 de abril, mais um alívio. Os alunos do segundo e terceiro ciclos voltaram a encontrar-se com os professores nas salas de aula e nos ATL. Reabriram ainda museus, monumentos, palácios e galerias de arte, lojas que tenham até 200 metros quadrados e porta para a rua, feiras e mercados não alimentares (nestes dois casos, ficando ao critério das autarquias). Voltaram os clientes às esplanadas (mas com limites) e os ginásios reabriram (ainda que sem aulas de grupo).

Depois, a 19 de abril, é suposto reabrirem escolas do ensino secundário e universidades, cinemas, teatros, auditórios e salas de espetáculo, lojas de cidadão (por marcação) e todas as lojas e centros comerciais. Restaurantes, cafés e pastelarias devem poder abrir (ainda com limites de ocupação e de horário), e os eventos exteriores devem poder ser organizados com limites de lotação.

Finalmente, a 3 de maio, restaurantes, cafés e pastelarias funcionam sem limite de horário (mas ainda com lotação limitada, desta feita a um máximo de 6 pessoas ou 10 em esplanada); todas as modalidades desportivas e os ginásios voltam a não ter restrições; e os grandes eventos exteriores e eventos interiores (com diminuição de lotação) passam a poder realizar-se.

Das esplanadas, às lojas (até 200m2) com porta para a rua, até às escolas e aos ginásios. O que abre a 5 de abril?

Cada uma destas reaberturas faz mexer a agulha do PIB. Logo na sequência da primeira fase de desconfinamento, o Banco de Portugal notou uma recuperação. “Na quarta semana de março, o indicador diário de atividade económica voltou a registar uma variação homóloga muito superior à da semana anterior”, refere a entidade numa nota do início deste mês. Um salto que se explica pela comparação com a mesma semana de 2020, quando o país estava fechado em confinamento geral.

Esse dado relativo à última semana do mês passado (e também à anterior) foi suficiente para gerar algum otimismo no governador do BdP, Mário Centeno. “Após 15 de março, os indicadores económicos recuperaram face ao período anterior. (…) Todos seguimos os dados do desemprego no dia a dia, os pagamentos automáticos”, ou seja, os vários indicadores que suportam essa melhoria.

Mas mesmo que tudo corra conforme o calendário definido, falta saber como se vão comportar os agentes económicos perante um cenário de incerteza, a começar pelos consumidores.

Centeno. Após 15 de março os indicadores económicos já recuperaram face ao período anterior

Está na hora de gastar as poupanças “forçadas”?

Não foram poucos os portugueses que perderam rendimento durante o período da pandemia, à conta de desemprego, lay-off ou alterações à atividade. Só que, ajudado pelos apoios do Governo, mas também por poupanças “forçadas”, o rendimento disponível, em média, acabou por não cair.

Reflexo disso, a taxa de poupança quase duplicou no país no espaço de um ano, de 6,8% para 12,8%, segundo dados do INE divulgados na semana passada. O endividamento das famílias, por outro lado, teve um crescimento de 1,6%, segundo dados do Banco de Portugal. A questão será, portanto, se o dinheiro que não se gastou em férias, restaurantes, bares ou atividades culturais vai agora ser “despejado” na economia ao longo dos próximos meses.

O Banco de Portugal espera que haja “a concretização de compras adiadas”, sobretudo este ano. Isto no caso dos bens, porque “a capacidade de recuperar oportunidades de consumo adiadas é mais limitada no caso dos serviços”, pode ler-se no último boletim económico.

Se os consumidores voltarem a encher os carrinhos, a retoma será mais rápida

Rui Oliveira/Observador

A entidade liderada por Mário Centeno antevê que a taxa de poupança só regresse aos níveis anteriores à pandemia em 2023, porque as famílias deverão manter “reservas adicionais num ambiente de incerteza ainda elevada”.

É, para o Banco de Portugal, o cenário central, mas não o único. No quadro mais sombrio, o consumo privado “cresce marginalmente em 2021 (0,4%) e recupera de forma mais moderada (3,6% em 2022 e 2% em 2023)”. Mário Centeno avisa que “não seria a primeira vez que processos de crise desta natureza estariam associados a alterações mais estruturais do comportamento das famílias e a uma redução mais lenta da taxa de poupança”. Se esse for o caso, vai trocar as voltas a muitas empresas.

No entanto, se tudo correr bem, o supervisor admite que o consumo privado possa crescer ainda mais do que o esperado (3,1% em vez de 2%), no pressuposto de que “as famílias gastam parte da poupança acumulada em 2020, em larga medida de natureza forçada, o que permite repor mais rapidamente a despesa adiada durante a pandemia”.

Boletim económico. 4 riscos e uma ideia controversa

Para já, há sinais interessantes, tendo em conta que a confiança dos consumidores atingiu agora em março o máximo de quase um ano, após uma queda no mês anterior. Desde abril do ano passado, que não havia tanto otimismo entre as famílias, o que decorre “sobretudo das expectativas relativas à evolução futura da situação económica do país“, explicou o Instituto Nacional de Estatística.

O anúncio de desconfinamento, apesar de o essencial das restrições ainda continuar, terá contribuído para o novo estado de espírito. O INE dá nota ainda da confiança reforçada quanto à “evolução futura da realização de compras importantes e da situação financeira do agregado familiar”.

Vão os parceiros europeus crescer e comprar mais a Portugal?

O maior otimismo alastra-se também às empresas. Os dados do INE revelam que o “indicador de clima económico aumentou em março, contrariando a redução observada no mês anterior”, nomeadamente na indústria transformadora, no comércio e nos serviços. Já o indicador da construção e obras públicas “estabilizou”.

Isto depois de muitas dessas empresas terem sofrido uma forte quebra da atividade desde que começou a pandemia. Entre março e dezembro do ano passado, a faturação das empresas caiu como um todo 14,3%, com a redução (ou mesmo paragem) das respetivas atividades nesse período.

Os dados do INE, com base na plataforma do e-fatura, indicam, no entanto, que o impacto foi muito superior nalguns setores: o alojamento foi o que mais sofreu (-66,5%), logo seguido de atividades artísticas, desportivas e recreativas (-50,6%) e da restauração (-42,5%). Por área geográfica, as maiores quedas tiveram lugar no Algarve (-27%), na Madeira (-21,6%) e na Área Metropolitana de Lisboa (-18,2%), regiões em que o turismo tem sido um grande ausente.

Os restaurantes têm sido uns dos grandes perdedores desta pandemia

Rui Oliveira/Observador

Depois desse descalabro, este é que seria o ano em que tudo finalmente iria ficar bem — pensou-se na passagem de ano, ao sabor de passas e champanhe. Mas foi precisamente a seguir a esse período, entre a quadra natalícia e o ano novo, que o vírus se alastrou a velocidade relâmpago, levando o SNS a uma situação crítica.

A meio de janeiro chegaram então as más notícias para as empresas, com o confinamento imposto pelo Governo. Mas podia ter sido ainda pior, segundo o Banco de Portugal — é que estas restrições, apesar de muito penalizadoras para várias empresas, levaram a uma queda “menos severa” da atividade quando comparado com o primeiro confinamento.

O supervisor entende que houve mais “capacidade de adaptação e aprendizagem dos agentes económicos“, mas as empresas também beneficiaram de um “enquadramento internacional mais favorável”, havendo, por isso, um impacto menos grave nas exportações portuguesas nestes dois meses.

O Banco de Portugal está ainda mais otimista para 2021 do que estava há apenas três meses em relação às vendas das empresas ao exterior — depois de um ano que as exportações fecharam com uma quebra de 18,6%, o supervisor espera agora uma subida de 13,7%, em vez de 9,2%. E nas importações, antevê um aumento de 10,2% (em vez de 8,8%). Há ainda a expectativa de que esse ritmo elevado nas exportações se mantenha em 2022, com 11,5% de crescimento.

Em ano de pandemia, as exportações portuguesas aguentaram-se em 78 mercados — tiveram ajuda de medicamentos, novilhos e F-16

Muito vai depender, naturalmente, de como se vão comportar os principais mercados das empresas que exportam a partir de Portugal. Em 2020, foram perdidos 1,1 mil milhões de euros de vendas só para Espanha; 475 milhões para França; 814 milhões para Alemanha; 575 milhões para o Reino Unido, e 366 milhões para os EUA. Ou seja, mais de 3 mil milhões de euros nos cinco principais mercados das empresas nacionais.

Em 2021, o Governo terá a expectativa de que se recupere parte dessas perdas, uma vez que esses países deverão ter, como muitos outros, uma segunda metade do ano diferente.

No caso de Espanha, de longe o principal parceiro comercial português, a Comissão Europeia espera crescimentos do PIB na ordem dos 5% este ano e no próximo. Para França, o mesmo deverá acontecer em 2021, abrandando para cerca de 4% em 2022. No caso da Alemanha, as previsões apontam para crescimentos na casa dos 3% em ambos os anos. E para a União Europeia, como um todo, Bruxelas acredita que ficará perto de 4%. Fora da UE, o Reino Unido deverá crescer 5,3% e os EUA 6,4%, se as contas do FMI, que foram agora revistas, baterem certo.

Mas não faltam incógnitas, desde logo, a evolução epidemiológica em vários países. Aquelas estimativas para França, por exemplo, não tinham em conta o novo confinamento anunciado pelo presidente francês. É apenas um de vários países em todo o mundo que estão a lidar com novas vagas de Covid-19.

Parisians Enjoy Warm Weather As Further Covid-19 Restrictions Expected

Em Paris, aproveitava-se o sol no final de março, em vésperas do anúncio de novo confinamento

Getty Images

Até que ponto resistem as empresas?

Apesar de se esperar um ano de retoma e com mais exportações, várias empresas estão a chegar ao limite. Durante largos meses, ajudadas pelo Governo, muitas foram adiando o pior — e 2020 terminou mesmo com menos insolvências (-1,4%) do que no ano anterior. Mas 2021 veio confirmar que o problema, em muitos casos, estava a ser apenas adiado.

Em janeiro, segundo a consultora Iberinform, não só as constituições de empresas tiveram um queda acentuada face ao mesmo mês do ano anterior (-43%) — o que será natural, num mês em que o país confinou — como houve também um aumento das falências em 15%. Pode ser pior? Fevereiro mostrou que sim, tendo em conta o aumento de 31,8%. Só que, ainda assim, esses números são “tímidos” face ao aumento de 67% registado em março. No conjunto desses três primeiros meses deste ano, as insolvências dispararam 33,1% (para 1.579) face ao mesmo período do ano passado.

Até que ponto este processo continuará, apesar da prometida retoma, ainda não se sabe, mas o Conselho das Finanças Públicas constata que há um “aumento do risco de insolvências no tecido empresarial e, consequentemente, de aumento do desemprego e de diminuição no rendimento das famílias”.

Poucos serão os que acreditam que o mercado de trabalho vai aguentar da mesma forma em 2021. O CFP espera um aumento da taxa de desemprego de 6,8% para 8,3% da população ativa, e uma descida para 7,3% no ano seguinte, “iniciando em 2022 uma trajetória de diminuição gradual até 6,5% no médio prazo”. Já o Banco de Portugal, é mais otimista do que o CFP para este ano (7,7%), mas prevê para 2022 mais desemprego do que a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral (7,6%).

Os primeiros sinais deste ano não são positivos, com um aumento em fevereiro para 6,9%, o mesmo valor atingido em janeiro, mas mais quatro décimas do que no mesmo mês do ano passado.

Taxa de desemprego mantém-se nos 6,9% em fevereiro

Por si só, já seria suficiente má a concretização do maior risco de insolvências apontado pelo CFP, mas há ainda que contar com o “elevado endividamento na economia”, que “acarreta riscos para a manutenção das condições favoráveis de financiamento da economia”. Para a entidade que fiscaliza as contas do Governo, esses dois elementos conjugados — falências e endividamento — potenciam “o risco de incremento do crédito malparado, em especial após o término das moratórias, com impacto nas condições de liquidez da economia”.

As moratórias estão longe de ser um detalhe. Até setembro, as empresas contam com o adiamento de prazos dos empréstimos bancários, com respaldo do Estado. Neste caso, 24 mil milhões de euros — um terço de todo o crédito concedido a empresas — estava sob moratória em janeiro. Mas há ainda que juntar outros 20 mil milhões de euros em suspenso de empréstimos a famílias (16% do crédito concedido a particulares). Os dados do Banco de Portugal mostram que das 54 mil empresas que tiveram esta ajuda, 57% dizem respeito aos setores do alojamento e da restauração.

Consequências? Se não conseguirem pagar — e se não for encontrada uma alternativa — mais empresas começarão a despedir ou a abrir falência.

O Parlamento, no entanto, tenta mais um adiamento. Uma proposta do PCP que visa o prolongamento de moratórias bancárias por seis meses obteve votos a favor de boa parte da restante oposição — PSD, BE, PAN, PEV, Chega e as deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. A iniciativa foi aprovada na generalidade e baixa agora à especialidade, mas esta solução só é aprovada se passar em votação final global.

Covid-19. Parlamento aprova na generalidade prolongamento de moratórias bancárias por seis meses

No caso do Estado, as linhas de crédito que concedeu também podem prejudicar as contas — é por isso que o ministro das Finanças já assumiu o inevitável: “Vamos rever bastante em alta os custos associados a estes apoios, que resultam das linhas [de crédito] com garantia do Estado, que — uma parte disso — vai ter impacto nas contas públicas, quer em 2021 quer em 2022”.

Quanto é que custarão essas linhas de crédito? Para já, a informação que o Tribunal de Contas recebeu do Banco de Fomento, referente a setembro, previa que uma média de 16,5% do crédito acabasse por não ser pago, ou seja, 1.119 milhões de euros. Mas é esse o valor que o ministro das Finanças já assumiu que terá de ser revisto.

Vai o turismo repetir o desastre do ano passado?

Fundamental para o país seria também não perder para a pandemia um segundo verão. Será necessário recuar a 1984 para encontrar um ano com tão poucos turistas do estrangeiro como em 2020 — uma quebra de 75% face a 2019 —, a que se junta ainda a redução de 35% entre residentes. No total, o ano fechou com menos 63% de dormidas (para um total de 26 milhões). Um verão minimamente semelhante ao do ano passado seria devastador para muitas empresas do setor.

Para que isso não aconteça, muito vai depender de como decorre o processo de vacinação para a Covid-19 em Portugal e nos principais emissores de turistas para o mercado nacional, porque quanto mais pessoas estiverem vacinadas, mais confiança haverá entre as populações para arriscarem viagens este verão. Alguns desses países conhecem, para já, novas vagas da pandemia, como França, Itália, Alemanha ou Brasil.

Num ano normal como 2019, os portugueses foram responsáveis por 21,1 milhões de dormidas ao longo do ano no país. Os turistas de Reino Unido (9,3 milhões), Alemanha (5,9 milhões), Espanha (5,2 milhões), França (4,6 milhões), Brasil (2,9 milhões), Estados Unidos (2,7 milhões), Países Baixos (2,3 milhões), Itália (1,7 milhões) e Bélgica (1 milhão) completaram nesse ano o top 10.

Entre estes países, os que estão mais adiantados na vacinação são Reino Unido (perto de 40 milhões de doses administradas, ou seja, 58 doses por cada 100 habitantes) e EUA (183 milhões de doses, ou 55 doses por cada 100). No caso dos britânicos, dados da University College de Londres mostram que juntando os que apanharam a vacina aos que já apanharam o vírus, mais de 73% da população tem anticorpos contra a Covid-19, atingindo assim a imunidade de grupo.

Mas são casos à parte, tal como Hungria (42 doses por cada 100) e Malta (55) no contexto da União Europeia, onde o processo não está fácil — a grande maioria, por cada 100 pessoas, tem entre 14 doses (Croácia) e 25 (Estónia). Há ainda dois países que ficaram claramente para trás — Bulgária (8 doses por cada 100) e Letónia (9). Nessa lista de países que mais contribuem para o turismo português, o Brasil está ainda pior do que a generalidade dos países europeus, com perto das 13 doses por cada 100.

Em estudo está um certificado europeu de vacinação, que deverá ser usado para entrar em países europeus que exijam saber se os turistas foram ou não vacinados.

Como vai ser o passaporte da vacinação que a Comissão Europeia tem para aprovar

Por cá, foram administradas 21 doses por cada 100, num processo que deverá ter o final da primeira fase na segunda semana de abril. A task force que conduz este processo prevê que este mês seja possível vacinar 100 mil pessoas por dia, podendo mesmo chegar às 150 mil vacinas/dia.

Isto se se confirmar a receção neste segundo trimestre de nove milhões de vacinas, das quais 1,8 milhões em abril, o que permitiria recuperar algum do tempo perdido nos primeiros três meses do ano, em que Portugal recebeu menos de dois milhões de doses. O cumprimento do calendário por parte das farmacêuticas será fundamental para que o turismo não seja tão afetado este verão.

Nas últimas projeções económicas que fez para o período 2021-2025, em antecipação ao Programa de Estabilidade, o Conselho das Finanças Públicas aponta precisamente, entre os riscos, “a possibilidade de o processo de vacinação poder ocorrer de forma mais lenta do que o esperado, ou de surgimento de novas variantes do vírus, que poderão retardar o controlo da pandemia e a redução e eliminação das medidas para a sua contenção, atrasando a perspetivada recuperação económica e a melhoria do saldo orçamental”.

NHS Wales Starts Covid-19 Vaccination Campaign

O processo de vacinação será decisivo para o turismo nacional e europeu

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Para já, nalguns casos, teme-se o pior. Os empresários do Algarve, por exemplo, antecipam mais um verão perdido. Muito dependerá, neste caso, do que acontecer no Reino Unido depois do desconfinamento progressivo que está em curso.

Os números globais no início do ano não são animadores, ainda muito condicionados pelas restrições impostas. Em janeiro houve uma queda de 87% na chegada de turistas internacionais em todo o mundo, de acordo com os dados da Organização Mundial do Turismo.

Quanto gastará o Governo em medidas Covid?

Sem se saber se vai haver uma nova vaga de casos de Covid-19 este ano, nomeadamente no próximo inverno, nem tão pouco quanto tempo vai demorar a pandemia, o Governo terá de calcular os gastos com apoios às empresas e às famílias com base em cenários muito incertos.

Para já, tendo em cima o peso do confinamento, o Governo gastou 1.091 milhões de euros nos primeiros dois meses do ano com medidas extraordinárias para fazer face à crise (fora o impacto no lado da receita, sobretudo o alargamento dos prazos de pagamento de impostos e suspensão de execuções fiscais).

Pandemia agrava défice em 2,5 mil milhões nos primeiros dois meses do ano

As contas da execução orçamental até fevereiro mostram que a maior componente é relativa aos apoios a empresas e ao emprego, que atingiram os 663 milhões de euros. Aqui se inserem o layoff simplificado, para empresas cuja atividade tenha sido suspensa por causa do confinamento (134,7 milhões gastos entre janeiro e fevereiro); o apoio extraordinário à retoma progressiva da atividade, para empresas em situação de crise empresarial com redução provisória do período normal de trabalho (115,9 milhões); o incentivo à normalização, que serve para apoiar a manutenção do emprego e reduzir o risco de desemprego de trabalhadores em empresas que tenham sido afetadas pela crise (44,5 milhões); o programa Apoiar.pt, numa dupla vertente — apoios à restauração (198,5 milhões) e a outros setores (146,2 milhões) —, entre outros programas com menor expressão nas contas.

Foram ainda pagos 194 milhões de euros no âmbito do apoio ao rendimento das famílias, dos quais a maior parte foi canalizada para apoios extraordinários ao rendimento dos trabalhadores (88,5 milhões); e 175,4 milhões na área da Saúde, entre despesa extraordinária com recursos humanos (contratações, horas extra e outros abonos, num total de 44,3 milhões), equipamentos de proteção individual ou medicamentos (52,4 milhões), mas também a aquisição de doses de tratamento de Remdesivir (16 milhões), testes Covid-19 (24,7 milhões), ou aquisição de vacinas (30 milhões). Não ficará por aqui, porque estas contas não apanham todo o confinamento. E porque a pandemia não terminou.

Qual será o total de gastos com este tipo de despesa no final do ano? O Governo poderá sinalizar uma estimativa no Programa de Estabilidade, mas o resultado final será sempre sujeito aos caprichos do vírus, ao comportamento das pessoas e às decisões do Governo em cada momento. A promessa de João Leão é de que os apoios vão continuar enquanto decorrer a pandemia.

Resta saber o valor total desse cheque, ainda mais quando a oposição já fez aprovar a extensão de apoios à revelia do Governo. A questão não está completamente fechada, porque o executivo ainda vai remeter o assunto para o Tribunal Constitucional (TC), defendendo que essa decisão viola a norma-travão (que impede os deputados de apresentarem alterações que desequilibrem o Orçamento de Estado).

“Lei é lei”. Costa contraria Marcelo e envia apoios sociais para o Tribunal Constitucional

Uma ideia que tem sido contrariada pela oposição. O Bloco de Esquerda, por exemplo, tem insistido que “o Orçamento do Estado foi feito com folga e com autorização ao ministro das Finanças para alterar verbas de um lado para o outro para ir respondendo à pandemia que não podemos prever”. E lembra que foi feito sem se saber quais seriam as restrições futuras.

Para já, passou pelo crivo do Presidente da República. E se passar também no Tribunal Constitucional fica aberto o precedente para mais gastos à revelia do Governo no futuro.

Quantos problemas tem uma só bazuca?

Quando se pensava que já se sabia, em tese, o que podia correr mal com o novo mecanismo para relançar as economias europeias, eis que a iniciativa de um movimento alemão (o Bündnis Bürgerwille, Aliança para a Vontade dos Cidadãos) contra a Comissão Europeia, no mês passado, criou um novo problema — o Tribunal Constitucional federal do país suspendeu, no final do mês, o processo de ratificação da “bazuca”, gerando a dúvida se este Mecanismo de Recuperação e Resiliência não ficará ainda mais atrasado.

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Em causa está o alargamento dos recursos próprios, que a Comissão Europeia pretende para se poder endividar à vontade junto dos mercados e assim distribuir pelos estados-membros os 750 mil milhões em fundos extraordinários para esta crise, entre subvenções e empréstimos.

O que vai acontecer agora ninguém tem a certeza, mas a decisão da justiça alemã faz disparar as campainhas em Bruxelas, em Lisboa e várias outras capitais, porque, ao contrário de outras decisões, esta tem mesmo de obter a aprovação dos 27 estados-membros, vários deles dependentes de luz verde dos respetivos parlamentos. Pensava-se que o problema estaria em países como a Polónia, em que as divisões são grandes nesta matéria, mesmo no interior do governo, mas o travão, para já, vem do tribunal de Karlsruhe — sendo certo que cerca de metade dos países ainda não ratificaram a medida.

Se tudo correr bem com a “bazuca”, o Banco de Portugal aponta para que o nível do PIB no país em “seja entre 1,1% e 2% superior” em 2026 ao que seria sem este mecanismo (e isto apenas tendo em conta as subvenções). Mas também aponta vários potenciais problemas que se prendem, “em larga medida, com as questões de implementação – prazos e agilização – e governação – controle, transparência e eficiência dos projetos – do PRR”, o Plano de Recuperação e Resiliência nacional que terá de ser aprovado pela Comissão Europeia.

European Commission visits Portuguese Presidency of the EU Council in Lisbon

António Costa terá de entregar a Bruxelas em breve o plano nacional para receber dinheiro da "bazuca"

NurPhoto via Getty Images

A rapidez com que Portugal retoma os níveis de riqueza pré-pandemia também depende deste mecanismo europeu. O Programa de Estabilidade contará com ele, mas para funcionar depende — para já — de Karlsruhe. E para que tenha o efeito pretendido dependerá de muitos outras variáveis.

Os problemas do costume (e o problema para mais tarde)

São sempre problemas extraordinários e, no entanto, sempre recorrentes — ano após ano, o Estado tem sido chamado a fazer injeções de capital em empresas públicas ou privadas. E a pandemia só veio acentuar a tendência.

Entre os riscos apresentados esta quarta-feira pelo Conselho das Finanças Públicas está a possibilidade de “utilização integral dos 3.890 milhões de euros previstos no Acordo de Capitalização Contingente do Novo Banco”; a hipótese de o apoio estatal à TAP “vir a ser superior ao que está previsto no saldo orçamental para 2021 em contas nacionais (500 milhões de euros), bem como o risco inerente a mais intervenções públicas na TAP nos próximos anos” e ainda “o impacto potencial de medidas de apoio a outras entidades do sector público, nomeadamente no sector dos transportes, particularmente afetado pela pandemia”.

Além disso, há que contar com “a concretização de pressões orçamentais sobre a despesa corrente primária [sem juros], com incidência nas prestações sociais (efeito na despesa com pensões decorrente do envelhecimento da população), nas despesas com pessoal (progressões e promoções) e no consumo intermédio (relacionados com as pretensões dos parceiros privados no âmbito de projetos de PPP)”. Matérias que muito provavelmente fariam parte de qualquer relatório do CFP nesta fase — com ou sem pandemia — mas que, nalguns casos, se agudizam face às circunstâncias.

Encargo do Estado com a TAP vai repetir-se “por um número indeterminado de anos”, avisam técnicos do Parlamento

O resultado deste tipo de pressões é conhecido — o aumento da dívida, que, em 2020, galopou para 133,6%. O Conselho das Finanças Públicas assume um cenário em que já haverá uma redução este ano (para 131,5% do PIB) e no próximo (125,1%), impulsionada pelo crescimento económico, mas só em 2025 — se atingir os 117,1% previstos — se vai aproximar dos níveis pré-pandemia (116,8% em 2019).

Até lá, João Leão contará com a habitual pressão da oposição parlamentar para gastar mais do que aquilo a que o Governo estaria disposto a gastar, o que é agravado agora por potenciais novas decisões do Parlamento de estender novos apoios (dependendo da futura decisão do Tribunal Constitucional).

No Orçamento do Estado para 2021, feito em outubro, o Governo já fazia um primeiro lembrete de que a normalidade pós-pandemia seria feita, na melhor das hipóteses, de contenção. O executivo não só apontou uma redução do défice em 2022 de 4,3% para 2,8% — com uma descida na despesa, de 0,3%, e um aumento da receita, de 2,8% — como sinalizou que a pandemia significa apenas uma pausa no combate ao défice.

Será expectável que João Leão volte a lembrar os partidos da oposição disso mesmo no Programa de Estabilidade — até porque o documento abrange perspetivas até 2025 —, mas no imediato, embora seja sempre uma preocupação para o ministro das Finanças, não é ainda um quebra-cabeças. A União Europeia garantiu flexibilidade das regras financeiras este ano, com a Comissão a propor estender o “estado de graça”, face à situação da pandemia, para 2022, como António Costa já antevia. É, portanto, um problema que vai ser aos poucos atenuado pelo crescimento económico pós-pandemia, mas que, verdadeiramente, só terá de ser resolvido mais tarde.

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