Pelo segundo dia consecutivo, João Ferreira não conseguiu contornar André Ventura. Logo na sessão da manhã foi a anfitriã, presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Maria das Dores Meira, a falar de “velhos fachos que ficaram escondidos debaixo das pedras” e que servem agora para “alimentar novos fascistas”. Num curto encontro com advogados que apoiam publicamente a candidatura de João Ferreira foi um ex-secretário do Estado e da Justiça a dizer que mais que votar em João Ferreira por concordar com aquilo que defende há também a utilidade de impedir “o candidato fascista de ficar à frente da esquerda”. E nem na sessão dedicada às questões das pessoas com deficiência João Ferreira conseguiu que não se falasse no assunto.

Vamos por partes. João Ferreira começou o dia em Setúbal, com um auditório de cadeiras muito vazias (já que a campanha reduziu a 15% a ocupação do espaço), mas com intervenções relevantes no universo comunista. A presidente da autarquia, Maria das Dores Meira e a mandatária nacional Heloísa Apolónia (ex-deputada d’Os Verdes, que concorrem coligados com o PCP às eleições) subiram ao palco para deixar mensagens bem claras. E mais que criar movimentos nas redes sociais, o candidato pôde hoje puxar dos galões da história comunista para tentar ensinar o caminho para travar André Ventura.

Disse Maria das Dores Meira que a candidatura de João Ferreira serve para travar os “novos fascistas”. “Soubemos combater os velhos fachos, saberemos derrotar os novos fascistas. Para isso serve também esta candidatura de João Ferreira, para reafirmar um profundo empenhamento na construção de uma vida melhor para todos. Para defender o espírito da constituição, uma democracia real e efetiva onde todos têm direito ao trabalho, à saúde e à cultura”. E contou com o reforço de Heloísa Apolónia que foi ao púlpito dizer que Ferreira tem “dignificado a campanha eleitoral”.

A paragem seguinte da caravana de João Ferreira, à porta da sede de candidatura em Lisboa tinha como objetivo receber o apoio de 160 advogados. Mas João Correia, antigo secretário do Estado e da Justiça, deixou um recado além do apoio a João Ferreira. Disse o primeiro subscritor do apoio expresso de advogados “do norte ao sul do país” que votar em Ferreira era também uma forma de impedir “o candidato fascista de ficar à frente da esquerda” colocando às costas do candidato, no mínimo, esse “dever histórico”.

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E ali ficou também o início do argumento que João Ferreira tem para fazer frente a André Ventura. “É sabido e reconhecido que esta candidatura é herdeira da melhor tradição e luta pela liberdade e democracia do país”, afirmou para depois apontar a fórmula de combater populismos: “Derivas antidemocráticas combatem-se indo à causa do problema, com outras políticas para corrigir as razões da revolta de tantos cidadãos”.

Mas ainda antes da meia-noite haveria de falar novamente de André Ventura. Em entrevista ao Porto Canal, Ferreira repetiu a ideia de que Ventura “ataca a Constituição” e não algum dos outros candidatos à Presidência da República, mas diz que “sente que as coisas não vão correr bem” ao candidato que é também líder do Chega. Já durante a tarde tinha garantido que André Ventura não ficaria em segundo lugar na eleição de dia 24, à frente dos três candidatos de esquerda.

João Ferreira esteve na noite deste sábado a ser entrevistado no Porto Canal isto depois de a candidatura ter conseguido impedir todos os debates que o canal de televisão tinha agendado com Vitorino Silva. Na fase inicial da entrevista Ferreira foi questionado várias vezes sobre a opção de ter feito queixa do canal de televisão do norte e não de qualquer um dos generalistas antes da RTP3 ter incluído debates entre todos os candidatos e Tino de Rans. João Ferreira escudou-se no facto de ter alertado para a necessidade de garantir debates entre todos os candidatos, mas frisou que “não é aceitável que se corrija uma desigualdade com outra desigualdade” o que aconteceria caso Vitorino Silva tivesse uma nova ronda de debates com todos os candidatos. O canal de televisão viu-se obrigado a retirar os debates da programação e optou por substituí-los por entrevistas a todos os candidatos. João Ferreira foi o primeiro a ser entrevistado.

Numa repetição que já ninguém esperava — tendo em conta o ter evitado nos primeiros dias de campanha — João Ferreira viu os intervenientes das ações de campanha agendadas para este sábado voltarem a trazer para o dia André Ventura. Com uma resposta já ensaiada (que repetiu, aliás, na entrevista que deu à noite no Porto Canal), João Ferreira usa agora o “legado comunista” de combate ao fascismo para explicar o caminho de combate ao populismo. “Repetiu a ideia de sexta-feira — de que André Ventura não ataca candidatos, mas a democracia — e diz que o candidato e líder do Chega não se conforma “com uma constituição avançada, progressista, profundamente democrática”.