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AFP/Getty Images

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Acumulam comida e estão "aterrorizados": os britânicos que queriam ficar na UE

Especialista em desastres diz que o país só armazena comida para 24 horas. Perante a falta de acordo, empresas como a de John acumulam stock e cidadãos como Jo enchem a despensa. Reportagem em Londres

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Enviada especial ao Reino Unido

Joanne Elgarf nunca imaginou que o Leave (“Sair”) iria ser a opção mais votada no referendo de 23 de junho de 2016. “Estava deitada na cama quando vi o resultado. Fiquei gelada”, conta, sobre aquela noite de verão. “Tinha a certeza absoluta que o Remain (“Ficar”) ia ganhar. Lembro-me que via imensas bandeiras de Inglaterra por todo o lado, mas assumi sempre que era por causa do Euro 2016, que era por causa do futebol. A verdade é que eu vivia numa bolha Remain.”

À altura, Jo (nome pelo qual costuma ser tratada) não poderia imaginar que, dois anos depois, acabaria por se tornar uma ativista que dá entrevistas a dezenas de media, inclusivamente estrangeiros. Mas eis que, mais de dois anos depois, ali está ela sentada a conversar com mais uma jornalista, depois de ter dado entrevistas a jornais de países tão distantes como o Canadá ou o Japão. Em causa está o facto de ser uma das organizadoras do grupo de Facebook 48% Preppers, que conta com mais de 10 mil membros, e que reúne britânicos preocupados com a possibilidade de um no deal, que trocam impressões sobre como se preparar para o pior.

“Neste momento, não interessa quem votou Remain ou Leave, não somos um grupo político. Estamos focados é no presente e, no presente, ninguém sabe o que se passa”, explica ao Observador. Sentada num café do seu bairro no sul de Londres, no subúrbio de Worcester Park, pára um pouco para refletir sobre o momento atual: “Ainda agora tivemos os estúpidos dos votos indicativos. Isto devia ter acontecido há meses!”, diz.

Se não houver acordo, a saída da UE pode ser caótica, com implicações diretas na vida dos cidadãos. E o problema é que, mesmo faltando apenas duas semanas para a data final, ninguém consegue ter a certeza do que vai acontecer — nem mesmo sobre esses danos mais imediatos. Jo, David e John não estão otimistas.

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Jo, a cidadã que tem uma filha dependente de dois medicamentos. Ambos vêm da UE

Aos pés de Jo, durante a nossa conversa, está o saco azul e branco que trouxe da farmácia da porta ao lado. Dentro dele estão embalagens de Epilim e Keppra, medicamentos fulcrais para a vida da sua filha de quatro anos, Nora, que sofre de epilepsia e tem paralisia cerebral. Nenhum destes medicamentos é produzido no Reino Unido — os dois são importados regularmente da União Europeia (UE), à semelhança de três quartos dos medicamentos utilizados no Serviço Nacional de Saúde britânico.

A britânica tem de ir ao médico de mês a mês revalidar a receita de Nora. Não lhe é permitido comprar stock para mais de quatro semanas: “Armazenar medicação coloca em risco os outros pacientes”, alertou o secretário de Estado da Saúde, Stephen Hammond, no Parlamento, em fevereiro. “Se toda a gente fizer o que é suposto, estamos confiantes que a medicação continuará a estar disponível, independentemente do que acontecer com o Brexit.” Apesar disso, os alertas de médicos, hospitais e farmacêuticas sobre o impacto que o Brexit pode ter na área da Saúde sucedem-se. E, para Jo, as garantias do Governo de pouco valem quando se trata da vida da filha: “Se ela não toma aqueles medicamentos em específico, começa a ter convulsões graves. Pode morrer”, resume, olhos azuis fixos no horizonte e lábios finos apertados, em tensão.

Jo Elgarf à porta da farmácia onde comprou as últimas embalagens dos medicamentos para a filha, epilética (CÁTIA BRUNO/OBSERVADOR)

Foi por saber isto que Jo, membro de um grupo pró-Remain no Facebook, começou a discutir com outros o impacto que um no deal podia vir a ter na sua vida. A medicação da filha sempre foi a sua principal preocupação, mas esta britânica de 43 anos começou também a ver com bons olhos a ideia defendida por alguns de ir enchendo a despensa, pouco a pouco, com alguns produtos alimentares. Foi assim que surgiu o 48% Preppers. Depois de uma entrevista ao jornal The Guardian, o número de membros disparou, do dia para a noite. “Mas não fazemos ideia de quantas pessoas terão lido o artigo, não se terão juntado ao grupo, mas podem ter-se virado para o marido e ter dito ‘Sabes que mais? Vou comprar mais umas latas de feijão’”.

Oficialmente, um em cada dez compradores das grandes cadeias de supermercado afirmou num estudo estar a acumular produtos para o caso de uma saída sem acordo. Segundo uma sondagem recente da Sky News, o número pode ser ainda maior: 28% dos inquiridos admitiu à cadeia de televisão estar a comprar produtos extra ou, pelo menos, está a pensar fazê-lo. Os britânicos estão mesmo a pensar nisto: caso contrário não haveria uma empresa a criar uma Brexit Box (um “kit de sobrevivência” que custa quase 350 euros), nem a autora de livros de culinária Jack Monroe teria publicado o Tin Can Cook, que explica como cozinhar com enlatados.

“Não somos como aqueles grupos de ‘sobrevivencialistas’ norte-americanos, que fazem bunkers e tudo o mais”, garante Jo. “Achamos que é simplesmente algo razoável. Algo que a minha mãe, que cresceu com o racionamento, faria. Estamos a preparar-nos para o pior, mas a desejar que ele não aconteça.” Não é só o tom de voz calmo e descontraído que ajuda a reforçar a ideia de que Jo não faz parte de um grupo em pânico, que aguarda o Apocalipse. Licenciada em Estudos Europeus, esta britânica está atualmente fora do mercado de trabalho para se dedicar a cuidar a tempo inteiro da filha. No entanto, tem experiência profissional como gestora de uma cadeia de distribuição, numa empresa produtora de sanduíches. “Os produtos até podem ser todos made in UK. Mas os ingredientes por vezes não são daqui”, resume. Como o tomate das sandes da empresa onde trabalhava, por exemplo — vinha todo de Espanha.

“Não fazemos ideia de quantas pessoas terão lido o artigo, não se terão juntado ao grupo, mas podem ter-se virado para o marido e ter dito ‘Sabes que mais? Vou comprar mais umas latas de feijão’”.
Jo Elgarf sobre o grupo de Facebook 48% Preppers, a que pertence, que incentiva britânicos a rechearem a despensa para estarem preparados para o Brexit

No mundo globalizado de hoje, o Reino Unido está dependente de muitos outros países. A 15 minutos da casa de Jo está o New Covent Garden Market, o maior mercado distribuidor de fruta, vegetais e flores de todo o país. Da janela do comboio, é possível ver caixas cheias de laranjas a serem transportadas de um dos grandes armazéns para outro. Estamos a 27 de março, a pouco mais de 15 dias da nova provável data de saída do país da UE. Algumas daquelas laranjas devem ter chegado de madrugada, trazidas pelos camiões que atravessaram o Canal da Mancha, de Calais até Dover. Mas se o Reino Unido sair da UE da noite para o dia a 12 de abril, perdendo acesso ao mercado comum, as toneladas de laranjas que chegam diariamente, vindas de países como Espanha, continuarão a chegar sem perturbações? Jo é uma dos que se interrogam. E, pelo sim pelo não, compra alguns pêssegos enlatados.

Fotografia da despensa de Jo Elgarf atualmente. Há refeições prontas, arroz, enlatados, farinha e todo o tipo de bens não perecíveis (D.R.)

David, o especialista em prevenção de desastres que antecipa o pior

“Neste país, só temos capacidade para garantir comida durante 24 horas.” A garantia é dada ao Observador por David Alexander, professor de Redução de Risco e Desastres da University College London (UCL). “É assim por causa do sistema de distribuição que temos na maioria dos supermercados e nas lojas, conhecido como Just-In-Time (JIT), que utiliza armazenamento mínimo.”

A ideia, que teve origem nas indústrias automóvel e eletrónica do Japão, é simples: “As empresas acumulam muito pouco ou nenhum inventário. Os bens são distribuídos em pequenas qualidades, mas muito frequentemente, vindos de fornecedores que estão em regiões ou países próximos. Não só se reduz os custos, como uma grande vantagem do sistema é que maximiza os produtos e a qualidade do serviço”, resumiram à revista Prospect os especialistas em economia e logística Philip McCann e Raquel Ortega-Argilés em 2018.

Camiões em Dover, a cidade por onde entra a maioria dos bens importados pelo Reino Unido, onde pode haver mais perturbações em caso de "no deal" (Leon Neal/Getty Images)

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Sabendo isso, vários empresários do setor retalhista já avisaram repetidamente o Governo britânico e os deputados sobre o efeito que uma saída sem acordo poderia ter na distribuição alimentar. A cadeia de supermercados Sainsbury’s e a McDonald’s são algumas das empresas que escreveram uma carta aos políticos britânicos alertando para a incapacidade de armazenar produtos frescos na ilha. De acordo com a Associação Britânica de Armazéns, começa a haver falta de espaço de armazenamento do país, com 75% das empresas que prestam esse serviço a dizerem-se já assoberbadas.

“Quando eu nasci, em 1953, ainda tínhamos racionamento. Com o tempo, tornámo-nos mais prósperos, mas também mais dependentes do estrangeiros. Importamos cerca de metade da nossa comida, a maior parte dela de países da UE”, conta ao Observador o professor universitário. Sentado no seu gabinete da UCL, no centro de Londres, este investigador explica que o Instituto da Universidade a que pertence tem por hábito fazer pesquisa sobre desastres “em cascata”, ou seja, numa sequência de eventos. Contudo, o grupo optou por não o fazer relativamente ao Brexit: “Não sabíamos por onde começar”, confessa o académico. “Há tantos cenários possíveis, que implicam tanta coisa diferente, que teríamos de simplesmente assumir muita coisa que não sabemos.”

Por cima da cadeira onde David está sentado, uma caneca pousada numa prateleira dá o slogan apropriado: “Mais um dia, mais um desastre”. É uma piada para quem lida diariamente com cenários de catástrofe e que estuda como os prevenir, mas que, nesta situação, não consegue prever solução possível. Cada pequena ação, em caso de no deal, pode ter um efeito que se multiplica em direções imprevisíveis — a comida é apenas um deles. “Temos vários tipos de infraestrutura que são críticos, como a alimentação, a eletricidade, a água, as respostas de emergência, os serviços financeiros e as telecomunicações. Alguns destes sistemas são altamente dependentes de redes internacionais”, resume o professor.

David Alexander, professor de prevenção de desastres na UCL, no seu gabinete. Em cima, a caneca que diz "Mais um dia, mais um desastre" (CÁTIA BRUNO/OBSERVADOR)

Não é, por isso, de admirar que a preparação chegue a todos os pormenores: desde as luvas de látex encomendadas para o aeroporto de Heathrow, até aos sacos utilizados para os cadáveres, tudo o que não é produzido no Reino Unido está a ser encomendado em maior quantidade do que o habitual.

“Lembra-se do Eyjafjallajökull?”, pergunta David de repente, referindo-se ao vulcão islandês de nome quase impronunciável, cuja erupção de 2010 interrompeu todo o tráfego aéreo europeu durante dias. “O Reino Unido foi muito afetado na altura. Na estação de Vitoria não havia um único bilhete disponível para se comprar, fosse a que preço fosse. As pessoas corriam para o sul do país para apanhar um ferry. O ‘efeito cascata’ foi tremendo. Basta recordar como até os transplantes de medula óssea que vieram do estrangeiro foram afetados”, declara o investigador, referindo-se aos 16 transplantes de medula no Reino Unido que foram suspensos por não haver forma de transportar os órgãos para dentro do país. “E isso foi apenas durante uma semana…”, remata, arregalando os olhos e arqueando as sobrancelhas.

John, o empresário que enche o armazém para evitar ir à falência

Se as empresas que vendem bens alimentares estão preocupadas, por causa do JIT, não são as únicas. Os produtores automóveis, por exemplo, são outros dos dos empresários que deitam as mãos à cabeça com um cenário de no deal. “Basta pensar que, na indústria automóvel, 14 tipos de material que têm de atravessar o Canal da Mancha até haver o suficiente aqui para se montar um carro”, ilustra o professor da UCL. A fabricante Honda, por exemplo, já deixou claro como pode ser afetada: cada 15 minutos de atraso num controlo fronteiriço levam a perdas que podem chegar a um milhão de euros por ano.

“Lembra-se do Eyjafjallajökull? O Reino Unido foi muito afetado na altura. Na estação de Vitoria não havia um único bilhete disponível para se comprar, fosse a que preço fosse. As pessoas corriam para o sul do país para apanhar um ferry. O ‘efeito cascata’ foi tremendo. Basta recordar como até os transplantes de medula óssea que vieram do estrangeiro foram afetados. E isso foi apenas durante uma semana."
David Alexander, professor especialista em prevenção de risco e desastres da UCL

É por isso que o empresário John Thrupp afirma que os produtores alimentares não podem dizer que são as únicas vítimas de uma possível saída sem acordo. “Seria arrogante da minha parte dizer isso. Uma empresa como a Honda, por exemplo, enfrentará graves problemas se não armazenar stock”, afirma ao Observador. “Aquilo que é certo do ponto de vista das empresas todas neste momento é isto: um no deal é, para nós, inaceitável.”

Thrupp é diretor da Mons Cheeses, uma empresa francesa de queijos que está no Reino Unido desde 2006. No Borough Market, o mercado mais antigo de Londres, a empresa tem uma banca enfeitada com gigantescas rodelas de queijo francês Comté e outras variedades francesas e suíças. É uma das dezenas de bancas deste mercado onde se vendem produtos britânicos, claro, mas também muitos vindos da UE — aqui há mostarda francesa, enchidos croatas e trufas italianas, entre outras iguarias importadas. A empregada do Mons Cheeses, contudo, é das poucas que admite sem problemas que o Brexit está sem dúvida a ter impacto na empresa, quando questionada. Afinal de contas, os produtos lácteos são dos que podem vir a ser mais afetados, segundo um estudo da LSE que afirma que alguns queijos estrangeiros podem vir a ser considerados “bens de luxo” devido à subida dos preços provocada pelo Brexit. Não é por isso de admirar que a empregada do Mons Cheeses rapidamente passe o contacto do diretor da empresa, “o homem certo para falar sobre isto”.

A banca de queijos da Mons Cheeses, no Borough Market. A empresa, no país desde 2006, já está a acumular stock para o caso de um "no deal" (CÁTIA BRUNO/OBSERVADOR)

“Nas últimas duas semanas comprámos imenso stock de queijo, para estarmos preparados para o que aí vem”, começa por dizer o diretor Thrupp mal atende o telefone e ouve as perguntas. A situação, diz, é de total incerteza — razão pela qual a empresa não tem feito nenhum tipo de investimento, à semelhança da maioria dos negócios britânicos nos últimos dois anos. “Estamos a fazer os possíveis para não ficar com prateleiras vazias. Mas podemos sempre chegar a uma situação em que um chef nos diz ‘vocês não têm o queijo que eu quero, por isso vou passar para outro fornecedor’”, reconhece. “Mesmo que não haja um no deal, a nossa indústria já foi afetada. Dois dos nossos concorrentes fecharam portas nas últimas semanas, por exemplo. Estamos numa situação frágil”, confessa.

Vai valendo o apoio da própria direção do Borough Market, que elaborou um plano de contingência com armazéns disponíveis para os negócios que ali estão instalados, bem como a utilização de um local no norte de França que pode funcionar como hub logístico do mercado. “Eles têm-nos dado imenso apoio”, resume Thrupp. “Não se limitaram a falar, avançaram e começaram a tratar das coisas.” O mesmo não pode ser dito dos políticos, confessa o empresário: “Sei que sou só um dono de uma pequena empresa de queijos e não sou ninguém para falar de economia e política, mas… Os políticos, quando abrem a boca, mostram que não fazem ideia de como funcionam as empresas”, lamenta-se. Como exemplo, aponta a gaffe do ex-ministro para o Brexit, Dominic Raab, que afirmou, em tempos, “não ter percebido bem” que o Reino Unido dependia altamente da ligação entre Calais (França) e Dover (Reino Unido) — por onde mais de 2,5 milhões de camiões passam todos os anos, com bens que representam cerca de 17% de todo o comércio do país, segundo dados do Institute for Government, citados pela BBC.

Pelo sim pelo não, John Thrupp não arrisca e tem o plano bem delineado para lidar com a possibilidade de uma saída sem acordo — em junho, tenciona reforçar o stock para o verão. “Sempre fui um Remainer e fui um londrino arrogantemente confiante de que o país não ia votar para sair”, confessa ao Observador. “Mas a 23 de junho de 2016 aprendi a minha lição. Não vou repetir o erro com um não-acordo, achando que não vai acontecer.”

“Traição”, “esquecimento”, “terror”. Como é ser um Remainer num Reino Unido que está para sair?

Que o Brexit é um dos eventos mais importantes da História recente do Reino Unido, ninguém tem dúvidas. Mas o processo tem sido cheio de avanços e recuos, com um Parlamento e um Governo de candeias às avessas, bem como uma primeira-ministra e um líder da oposição que não conseguem qualquer tipo de consenso nacional. Incerteza é, por isso, a palavra de ordem — e o mesmo é aplicado ao que pode acontecer se houver um no deal.

Os especialistas pedem que não haja pânico, nem corridas às compras, porque agravaria os problemas de distribuição. Mas os receios de muitos britânicos que se sentem confusos, perdidos e desinformados podem falar mais alto e provocar situações ainda mais complicadas. “Tudo depende da reação das pessoas”, resume o professor David Alexander. “Prever o ‘efeito-cascata’ do Brexit é muito mais difícil do que o de uma erupção vulcânica. Aí podemos basear-nos na geologia, na meteorologia… Aqui há um fator humano que não podemos prever.”

O Borough Market é um dos mercados que já se está a preparar para o caso de uma saída sem acordo. Há armazéns disponíveis para os vendedores e um hub logístico em França (CÁTIA BRUNO/OBSERVADOR)

É também por isso que David abandona, por momentos, a capa racional de académico e assume a amargura que o processo lhe causou, pessoalmente. “Sinto que o meu país me traiu”, confessa em tom seco este Remainer. A solução, para si, é só uma: esperar os poucos anos que lhe faltam para a reforma e depois partir para Itália, para não voltar. “Tenho a sorte de ter dupla cidadania, porque sou casado com uma italiana e vivi no país alguns anos. Mas nem todos aqui têm essa sorte.” Para trás ficam os muitos britânicos que, crê, podem ficar numa situação económica ainda mais complicada após o Brexit, com as desigualdades sociais a acentuarem-se. “O slogan da campanha do Leave dizia ‘vamos retomar o controlo’. Mas isso não significa que seja o povo quem detém o controlo da situação agora”, resume.

Longe dos corredores de pedra da UCL, Jo Elgarf não conhece sequer o professor David, mas sente exatamente o mesmo. “Esqueceram-se de nós”, resume. “Parece aquela situação em que os pais se estão a divorciar, mas esqueceram-se de explicar aos filhos o que se está a passar, porque estão tão embrenhados na separação.” A britânica de Worcester Park está regularmente em contacto com o deputado do seu círculo eleitoral, a quem faz muitas perguntas. Mas não obtém respostas — não porque ele não lhe responda aos emails, mas porque regra geral ele próprio não as tem.

“Esqueceram-se de nós. Parece aquela situação em que os pais se estão a divorciar, mas esqueceram-se de explicar aos filhos o que se está a passar, porque estão tão embrenhados na separação.” 
Jo Elgarf, sobre os políticos britânicos

A falta de informação e de clareza provoca raiva, irritação e sobretudo medo entre muitos britânicos, sobretudo naqueles que nem sequer votaram para Sair e que lidam agora com as consequências dessa decisão. Todos os dias, Jo imagina os piores cenários: “O que é que acontece se os medicamentos da Nora ficarem retidos num porto, por exemplo?”, questiona-se. “Estou aterrorizada. É por isso que me juntei a este grupo, é por isso que tenho de gritar tão alto”, diz, referindo-se à sua participação nos 48% Preppers. “Por enquanto, posso ir a um supermercado, gastar cem libras e ficar com uma despensa recheada. Mas não interessa quanto dinheiro tenho, porque continuo sem conseguir arranjar aqueles medicamentos essenciais para a vida da minha filha.” A conclusão a que chega é só uma — e uma que a deixa sem alento e a faz engolir em seco antes de a dizer em voz alta: “Estou totalmente dependente de um Governo que não sabe o que faz.”

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