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Diogo Pombo/Observador

Diogo Pombo/Observador

Ai é, a segurança é tema? "Se não me perguntasse nem me lembrava"

Dos arredores de Paris ao Stade de France, onde o Europeu começa, vai menos de uma hora. Ver polícias em força só mesmo perto do estádio. À volta, tudo tranquilo e relaxado: "Aqui estamos bem".

É hoje. On y va, o Europeu vai começar.

Mas não parece. A hora de almoço já espreita, os comboios que são metros quando entram em Paris estão normais. Não se vê futebol a respirar o ar quente e abafado nas carruagens. Vivalma está com uma camisola vestida, um cachecol pendurado ao pescoço, um adorno com cores francesas ou romenas, que são as equipas que inauguram o Europeu. Na estação de Palaiseau-Massy, nos arredores da confusão de Paris, o primeiro sinal é sonoro. Francês, inglês e alemão, por esta ordem se ouvem os alertas que puxam pela prudência: comprem bilhete de ida e volta e evitem chegar em cima da hora de jogo. D’accord, entendido. Toca a ir para o Stade de France.

São quase 14h, suposta hora de reboliço, mas a estação está tranquila. À saída estão lá as placas que apontam a direção rumo ao estádio, dizem que fica a uma caminhada de 15 minutos. No pequeno maralhal de gente que por ali desagua lá se veem adeptos a rigor. Uma ou outra camisola amarela mistura-se com umas quantas azuis. É preciso a andar. Uns 150 metros à frente o improviso nota-se em árvores, postes de eletricidade e paredes de prédios, onde estão coladas várias folhas de papel A4, brancas, com “STADE” escrito a preto. Ok, é para cortar à esquerda antes de uma curva à direita.

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Tudo parece tranquilo. Pelo meio surge um campo de futebol. É pequeno e pintado a azul, o tamanho é para um cinco para cinco e, lá dentro, apenas estão dois rapazes. Jogam um baliza à baliza, bola para lá, bola para lá, chutas tu e agora chuto eu. Mesmo ao lado do campo estão uns valentes metros quadrados de relva, espaço onde dezenas de pessoas confraternizam, apanham sol e comem farnéis trazidos de casa. Polícia não se vê, nem um agente. Da estação até ali há edifícios empresarias, com linhas modernas, nota-se que é um sítio para se trabalhar e não para se viver. Nem parece que estamos quase a dois quilómetros de Saint-Denis.

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Foi aí, nesse bairro, que a 13 de novembro aconteceram três explosões dos atentados de Paris, que mataram 137 pessoas e feriram mais de 300. Uns meses passaram, é verdade, mas a segurança é tema desde aí. E sobretudo agora, que um Europeu vai começar, uma multidão vai chegar a França e os cuidados, pelo que se passou, são redobrados. É polícias nos locais mais apetecíveis para os turistas (Torre Eiffel, claro está), é revistas a quem quer que entre em lojas com malas ou mochilas, é governos estrangeiros a alertarem os seus cidadãos para as cautelas a ter em conta. Mas ali, no pedaço verde entre empresas que é vizinho do estádio onde arrancará o Europeu, nada se nota.

O pedaço de relva encolhido no meio dos edifícios de empresas que acolhe vários intervalos de almoço, a menos de 10 minutos do Stade de France

Diogo Pombo/Observador

Céline é uma das pessoas que está sentada em volta da relva, num degrau de pedra. Está sozinha. Tem auriculares nos ouvidos e vai centrando o olhar no telemóvel esperto que tem no colo. A roupa que veste é clara, estilo empresarial, dá a pista que está no intervalo de almoço. Aproximo-me, interrompo-lhe o tempo de lazer. Pergunto se é costume a tranquilidade do sítio e sim, ela confirma-o, misturando o ar despreocupado com uma quase surpresa pela pergunta que lhe chega. “Estou tranquila. Aqui há muitas empresas, muitos escritórios, não se tem visto muitos polícias por aqui. Estamos bem, na verdade”, diz, quando faltam pouco menos de seis horas para o França-Roménia.

Tem 33 anos e já trabalha por ali “há algum tempo”. Vivia em Paris durante os atentados, partilhava casa com um namorado que já não o é: “Aí estava preocupada, claro. Queria sair e estava sempre a pensar no que podia acontecer no metro, na rua, nos restaurantes, nos bares. Mas pronto, às tantas tens que viver”. O fim da relação puxou-a para Champigny, nos arredores da capital onde vivem os pais. Mas continua com a mesma sensação. “Nos últimos tempos nem falámos tanto sobre atentados ou segurança. Como podes ver, as pessoas aqui estão relaxadas”, atira, enquanto a cabeça olha à volta.

Tem ar moderno e de construção fresca. O campo é público, entra ali quem quiser e está mesmo ao lado do pequeno jardim, entre a estação de metro e o estádio

Diogo Pombo/Observador

Nada de anormal nota com a chegada do Europeu, competição que lhe é mais indiferente do que motivo de interesse. “Não ligo muito. Sou capaz de ver um ou dois jogos pela televisão. De França e de Portugal, porque sou de origem portuguesa”, revela, no fim da conversa, antes de prolongar a gargalhada que não contém quando troco o francês aos solavancos pelo português em velocidade cruzeiro. Céline é Céline Oliveira, nasceu em França e tem os pais portugueses. É mesmo fácil encontrá-los por aqui. Como é ver adeptos já a passearem à volta do Stade de France, uns 10 minutos de caminhada depois.

Ainda não são muitos. Os que ali estão passam o tempo, tentam queimar horas até ao jogo. Os polícias e seguranças já se aparecem com fartura. Há carros e carrinhas parados nas esquinas, todos os cantos a serem controlados. Na pista que circunda o estádio veem-se tripés de câmaras de filmar, jornalistas a darem conta do que rola antes de a bola começar a rolar. Com meia-volta dada ao recinto aparece Alex Iosif, a palminhar cimento sozinho. A altura que tem — quase 1,90m — e a camisola amarela que veste chamam a atenção. Pergunto-lhe se fala inglês, responde que não muito. É o suficiente para nunca encravar no que diz.

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Chegou na quinta-feira a Paris e aproveitou para dar o passeio de turista. Assustou-se “um bocadinho” quando chegou à Torre Eiffel. “Estava cheia de polícias. Tento não pensar muito na segurança e evitar sítios com muitas pessoas, mas aqui é difícil, claro”, resume, com um ligeiro sorriso, enquanto segura o bilhete para o jogo, numa das mãos. Parece ter receio de o perder. “Vim sozinho, vou assistir aos jogos contra a França e a Suíça. Depois de ganhar o direito de comprar o bilhete, porque isto é uma espécie de lotaria, não tive escolha. Comprei o bilhete, comprei o voo e esperei que tudo corresse bem, basicamente”, retrata, lamentando o emprego que, aos 33 anos, não o deixou tirar mais dias de folga para assistir à terceira partida, contra a Albânia.

Para quem estava inseguro quanto ao inglês, Alex fala bastante. Antes de receber nova pergunta quer alongar-se numa resposta, porque tem “outra teoria” quando o assunto é a segurança durante o Europeu. “Eles não vão atacar em Paris ou em França, porque é o que toda a gente espera. Vão a outros sítios, talvez a Alemanha. Mas espero que não aconteça de todo!”, argumenta. Esperamos mesmo que não, reforço. Alex Iosif confessa estar assustado, duplamente. Também o apoquentam os franceses, que “têm uma grande equipa” e um “ataque perigoso”, embora suspeite que “a pressão dos adeptos” os possa empurrar para o ataque e abrir oportunidade para a Roménia “aproveitar”. Isso é outro jogo.

Ver ou não ver os jogos do Europeu nas esplanadas de um bar? Na quinta-feira ficou incerto se tal, sequer, seria permitido. Thierry Braillard, secretário de Estado do Desporto francês, chegou a dizer que seria proibido por as autoridades “não possuírem meios para defender essas áreas”. Horas depois, contudo, o Ministério do Interior gaulês emitiu um comunicado a informar que tal decisão ficará a cargo das autoridades municipais.

Por enquanto, este joga-se cá fora, em redor do Stade de France. Perto da entrada principal, onde a romaria de adeptos se intensifica perto das 16h, uma camisola destoa. É antiga no padrão de azul, nas riscas que tem à frente, no galo que tem estampado ao peito — é velho e já ultrapassado, de outros tempos da Federação Francesa de Futebol. A camisola traz logo à cabeça Michel Platini, é a que o craque tinha vestida quando, em 1984, eliminou Portugal com um golo no prolongamento, nas meias-finais. Philippe Humann tem saudades desses momentos.

Já ganhou muitos cabelos brancos, e perdeu-os, às custas da seleção. Adora-a. Tem o rosto queimado pelo sol, o que lhe acentuou as rugas de 65 anos. Está sorridente, até um cachecol da seleção tem amarrado ao braço esquerdo. A boa-disposição acentua-se quando percebe que está a falar com um português e não com um espanhol. “Ah, boa, gosto muito de vocês e sei que também não gostam muito de espanhóis”, dispara, sem aviso. A memória não o deixa esquecer que foi a Espanha a discutir com a sua França a final do Europeu de há 32 anos. Mas não o faz pensar em ataques, atentados ou segurança. “Só me lembrei agora porque me perguntou, de outra forma não pensaria nisso”, assegura, sem tremer.

A meio da tarde, a umas quatro horas do jogo, o Stade de France estava assim

Diogo Pombo/Observador

Philipp justifica-o com as “muitas vezes” em que já foi ao Stade de France, atrás da seleção gaulesa. Era uma das cerca de 81 mil pessoas que lá estavam dentro “no dia dos atentados”. Voltará a sê-lo no encontro de abertura e “em todos os que a França jogar até à final”. Garante-o porque faz parte dos Les Irresistibles, um “grupo de adeptos da seleção francesa” para quem “os bilhetes não são carros”, graças a uma ajudinha da federação. Espera que a equipa de Didier Deschamps, o treinador que em jogador levantou um Mundial (1998) e um Europeu (2000) vença a Roménia, mas por poucos: “Não podemos ficar em forma muito cedo, depois vão exigir muito à equipa”.

Está otimista, o entusiasmo abana-lhe o corpo enquanto fala, irrequieto. Acha que os franceses só vão parar a 10 de julho e suspeita que decidam o Europeu contra a Bélgica. Não fala em Cristiano Ronaldo e companhia por estar desconfiado e suspeitar do 7-0 à Estónia. “Portugal marcou muitos golos no último particular e isso nunca é bom. Chegam aqui muito confiantes”, avisa. Isso é que é perigoso, ou dangereux, no seu francês, diz ele. Com a segurança não se preocupa como se preocupam os polícias que, está este texto a ser escrito, irrompem pela sala de imprensa do Stade de France para revistarem o espaço. Com cães e tudo. Toda gente para fora.

Vou à bancada, espreito o interior do estádio e aguento uns 10 minutos. Volto e penso que sim, a segurança é assunto sério — mais cá dentro do que lá fora, pelos vistos.

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