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"Costuma dizer-se que se canta muito o amor, mas eu acho que é o contrário: canta-se muito o desamor. A maior parte das canções que dizemos que são que são de amor são canções de um amor que não correu bem"
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"Costuma dizer-se que se canta muito o amor, mas eu acho que é o contrário: canta-se muito o desamor. A maior parte das canções que dizemos que são que são de amor são canções de um amor que não correu bem"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

"Costuma dizer-se que se canta muito o amor, mas eu acho que é o contrário: canta-se muito o desamor. A maior parte das canções que dizemos que são que são de amor são canções de um amor que não correu bem"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

António Zambujo: "Ninguém ouve uma canção só por causa da voz bonita do artista"

Confinado em Porto Covo, gravou sozinho e sem filtros um novo álbum. Em entrevista, fala da má relação com a fama, critica a pressão sobre as mulheres e confessa que é à tertúlia que regressa sempre.

A conversa começa em torno da ideia de “camadas”, do desejo de simplicidade e despojamento de que este António Voz e Violão será exemplo. Um homem e a sua guitarra. Sem filtros. Sem mais. A referência é João Voz e Violão, do brasileiro João Gilberto, produzido por outra referência, Caetano Veloso, em 1999. “Foi um disco muito marcante para mim”, explica António Zambujo, 45 anos, jeans e camisa de ganga, isqueiro dourado tipo zippo mas nenhum cigarro para fumar, num dos camarins do Cineteatro Capitólio, no Parque Mayer, em Lisboa. “É um disco de versões, mas tão bem feitas que acaba por ser um disco quase de originais.”

O crooner alentejano está por fim de volta a Lisboa, depois de um ano confinado em Porto Covo, onde gravou este último álbum, num estúdio improvisado, não muito longe do mar. Prepara-se para voltar aos palcos, ele que se tornou conhecido por esgotar coliseus dezenas de noites a fio e que, de repente, tal como tantos outros, se viu sem poder atuar e, frisa, dar trabalho. Ao todo, são 13 faixas gravadas durante o primeiro confinamento. De versões pessoalíssimas de clássicos como “Monalisa”, “Tu Me Acostumbraste” e “Rosinha dos Limões” a originais com letras dos parceiros do costume, incluindo Miguel Araújo, Pedro da Silva Martins, Maria do Rosário Pedreira e uma estreia, a do filho Diogo.

Por baixo da voz doce e do modo delicado de cantar, por trás do controlo, da ginga e da facilidade aparente de tudo aquilo, traz melancolia, desencontro e algum desamor. Influência da pandemia, diz, mas não só. António Voz e Violão, resume, “nasce de uma necessidade de apagar tudo e voltar ao princípio.”

A capa do novo álbum de António Zambujo, com edição da Universal

Por que razão é “o princípio” este formato a solo? Isto dito por um homem que fala tanto da importância de estar com os amigos, da família, do convívio.
Sempre gostei muito de discos a solo. Também me inspirou aquela coleção do Johnny Cash [“American Recordings”] e que é uma coisa que hei-de fazer a seguir, uma coleção toda a solo. Este é um disco praticamente sem produção, gravado live on tape. Por causa do disco do João Gilberto e também por causa do tipo de relação que tenho com o estar em estúdio. Sempre gostei de fazer o mínimo de takes possível. Sinto que o primeiro é o que sai melhor. Claro que isto só é possível porque há um grande trabalho de preparação. A música que eu faço vive muito do que sinto no momento.

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Há, portanto, um lado de improviso neste António Voz e Violão?
Completamente. Uma música é um projeto inacabado, em construção. O disco reflete o momento em que foram tocadas. À medida que vão sendo interpretadas vão surgindo ideias novas. Quando se chega aos concertos ao vivo, então, dificilmente as pessoas ouvem as mesmas músicas.

Começámos por falar na gravação do disco. E andando para trás, porquê estes temas?
Há um processo de composição contínuo. Todas as músicas deste disco, mesmo as que não são originais, já estavam prontas para ser tocadas. Depois é só fazer a seleção. Aquilo que faz sentido na minha cabeça. Não sei explicar porquê.

Sente-se uma melancolia ao longo de todo o disco. Um certo desamor.
Costuma dizer-se que se canta muito o amor, mas eu acho que é o contrário: canta-se muito o desamor. A maior parte das canções que dizemos que são que são de amor são canções de um amor que não correu bem. Esse tom tem um bocadinho a ver com isso. Depois, tem também a ver com o facto de terem sido escolhidas em pleno confinamento.

Não em Lisboa, onde mora, mas em Porto Covo, num estúdio improvisado. Porquê?
Optei por ir para Porto Covo assim que fecharam as escolas. Gosto, tenho lá uma casa, e estava isolado, mas perto do mar, com espaço exterior. Não sei se passou para o disco. Talvez, de forma inconsciente. Faz-se tudo com mais calma.

"Detesto que a arte tenha de ser catalogada. É redutor. Por exemplo, o Tom Waits tem muita influência da música country, mas não é música country. O Caetano Veloso será só música popular brasileira? Eu faço a música de que gosto."

Voltando à magia das versões, como é que se dá uma vida nova a uma canção que toda a gente conhece? Por exemplo, “Rosinha dos Limões”, popularizada pelo Max, e que aqui está irreconhecível.
O processo acaba por ser simples, mas tem uma longa história por trás. Aquilo que mais forma um artista é a arte. Não a sua, mas a dos outros. A capacidade de escutar, de interpretar. Tudo isso se reflecte no seu trabalho. Depois sai por impulso. Este “Rosinha dos Limões” é como seria a música se tivesse sido eu a compô-la.

Neste álbum vai do fado ao Alentejo, da música popular brasileira aos standards americanos, como o “Monalisa”, que o Nat King Cole popularizou. Porquê a diversidade?
Porque me apeteceu. São os géneros que me influenciam. Há músicas que já sabemos há tanto tempo que já não sabemos que as sabemos. De vez em quando vêm ao de cimo, como um peixe que mete a cabeça fora de água. O “Monalisa” nem sequer era para fazer parte do disco. Sempre gostei muito de standards de jazz, mas nunca os toquei em público. Na digressão anterior, tocava muito o “Monalisa” depois dos ensaios de som, com o Filipe Melo, o João Moreira e o Diogo Alexis. Alguns teatros têm pianos no camarim e ficávamos por lá. Sem pensar muito, fui fazendo uns arranjos, tentando perceber a harmonia. Já em estúdio, num intervalo entre músicas, comecei a tocar e o engenheiro de som, o Nána, o Fernando Nunes, disse, “Porque é que não gravas essa música. Está tão bonito.” Nunca tinha cantado em inglês, nem é uma língua de que eu goste muito, mas ficou.

[“Lote B”, o primeiro single do novo álbum de António Zambujo:]

E gostou de ouvir?
Gostei, mas o inglês… É como o Nat King Cole a cantar em espanhol.

Também não é um teste de línguas.
E eu adoro aqueles discos!

No meio destes géneros todos, existe uma gaveta para o António Zambujo? É classificável?
Nunca quis saber disso.

É uma coisa que o atrai, essa liberdade de poder ir para qualquer lado?
É uma coisa que me é natural. Detesto que a arte tenha de ser catalogada. As pessoas fazem isso um bocadinho por comodismo. Para já, é redutor. Por exemplo, o Tom Waits tem muita influência da música country, mas não é música country. O Caetano Veloso será só música popular brasileira? Eu faço a música de que gosto.

Essas referências em particular, o Tom Waits, o Caetano Veloso, têm vozes muito particulares.
Não é pelas vozes, é pela arte.

Em que sentido?
É pela capacidade de reinventar, a liberdade de criar coisas novas, surpreender. No Tom Waits, o mais incrível é a capacidade de, por trás daquela voz cavernosa, haver passarinhos e violinos. E depois aquilo tudo faz sentido. Porque é que faz sentido? Não sei. Tem de se ser um génio. Se fosse eu, talvez não fizesse sentido. Com o Caetano é a mesma coisa.

E por falar em “voz”, como foi a experiência de fazer o concurso televisivo The Voice, já por duas temporadas?
Eu não sou um tipo mainstream. Em relação ao programa em si, estamos a ouvir miúdos a cantar, muitas vezes coisas recentes que eu nem conheço, obviamente por ignorância. Depois, é escolher e trabalhar.

"A última coisa em que penso é no lado profissional. Assusta-me é ver tanta gente a morrer, a falta de união no mundo, a incompetência política"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Sente a pressão da escolha? Usando as suas palavras, estão ali “miúdos”.
E não só. Mas aquilo é uma ótima rampa de lançamento. Há muitos concorrentes que já têm música própria. O mais importante é eles perceberem que aquilo lhes dá exposição, mas não lhes dá uma carreira. Ninguém os vai contratar para um concerto de covers por ganharem o The Voice. Para mim, é um programa em que se fala de música, mas de entretenimento. E a exposição pública é impressionante.

Notou diferença?
Muito. Muito.

E foi bom? Gosta de ser famoso?
Odeio. Calma, não é bem “odeio”. É bom o reconhecimento. As pessoas gostarem de me ouvir cantar. Por outro lado, pode tornar-se um bocadinho… Às vezes oiço notícias de malta maltratada nas redes sociais. Como não tenho ligação nenhuma às redes sociais…

Porque é que não tem redes sociais?
Sinto que é perder tempo. Tenho amigos que nem são viciados mas estão sempre ali agarrados ao telemóvel. A minha mãe se tem um tempinho morto vai para o Facebook. É um bocadinho preocupante porque, se um dia acontecer o mundo resumir-se a isso, eu não estou lá. No outro dia estive a ver um documentário da HBO chamado “Fake Famous” que mostra como se pode pegar em pessoas anónimas e manipular a coisa para se tornarem influencers. É um sítio onde eu não quero estar.

Embora exista a ideia de que, hoje, não se pode ter sucesso sem estar nas redes sociais.
Mas eu estou nas redes sociais. Há uma pessoa da minha equipa que gere esse instrumento de comunicação. Anunciamos concertos, às vezes fazemos uns vídeos, mas não é uma iniciativa minha nem perco tempo com isso.

"Estou a escrever com o [letrista] João Monge um álbum em que todas as músicas são sobre mulheres e as pressões exercidas sobre elas: trabalham mais, ganham menos, sofrem mais assédio sexual. A questão da escravatura da imagem que depois vai dar numa coisa muito triste que é a uniformização."

A sua mãe passou parte do confinamento consigo em Porto Covo e fala muito da sua avó como uma influência, também a nível musical, ao partilhar consigo o cancioneiro tradicional alentejano. Foi muito influenciado pelas mulheres da sua vida?
Passava muito tempo com a minha avó materna porque os meus pais trabalhavam, mas também fui muito influenciado por alguns tios do lado da minha mãe. O meu avô paterno era um homem muito carismático, muito respeitado. O meu pai também tinha um bocadinho isso. Uma das coisas de que me lembro do funeral do meu pai foi as pessoas virem ter comigo dizer que era um homem reto, com quem se podia sempre contar. É obviamente um orgulho. Sou muito ligado à minha família.

Perguntava-lhe pela influência das mulheres na sua vida porque neste álbum há uma canção chamada “Sinais”, em que veste a pele de uma mulher de meia-idade. Como surge esta ideia?
Vem também a propósito dessa pressão exercida pelas redes sociais. A questão dos filtros. Desde aqueles que os usam aos que acham que aquilo é que é o normal.

E de onde vem o desejo de falar sobre isso, de cantar como se fosse uma mulher, que é uma coisa menos usual?
Vem do facto de estar aqui. De respirar. Estou a escrever com o [letrista] João Monge um álbum em que todas as músicas são sobre mulheres e as pressões exercidas sobre elas: trabalham mais, ganham menos, sofrem mais assédio sexual. A questão da escravatura da imagem que depois vai dar numa coisa muito triste que é a uniformização. As pessoas qualquer dia têm todas as mesmas bocas, os mesmos olhos, as mesmas mamas, os mesmos rabos. Que graça é que isso tem? Ainda é um projeto em construção, sem data de lançamento. Quase música de intervenção.

[ouça “Voz e Violão” na íntegra através do Spotify:]

Por falar em problemas do mundo, no final de 2019, quando num programa da SIC Notícias chamado “Verdade ou Consequência” lhe perguntaram quais eram os desejos para 2020, respondeu qualquer coisa como, “se pudesse fazer mais de 100 concertos como no ano passado.”
Grande galo!

Como tem vivido esta pandemia uma pessoa que passava a vida em palco?
A última coisa em que penso é no lado profissional. Assusta-me é ver tanta gente a morrer, a falta de união no mundo, a incompetência política, que é também a principal culpada por esta atração pelos extremos na Europa.

Ainda assim, mesmo tendo essa capacidade de empatia e por mais privilegiados que nos sintamos, esta pandemia também nos afeta a nós. Como é que uma pessoa que passava a vida em palco gere esta paragem?
Nos últimos cinco anos, entre 2014 e 2019, dei uma média de 120 concertos por ano. Claro que uma paragem, ainda por cima tão abrupta, mexe connosco. Na digressão anterior andava com uma banda grande. Quando se percebe que nem todos têm as mesmas condições. Que há pessoas com famílias numerosas em que ficaram os dois sem trabalho. A frustração de não poder ajudar. Isso acaba por nos afetar. Passei um tempo sem dormir. Tive sintomas altamente depressivos. Tive de procurar ajuda, fazer medicação.

"Fazia um desconfinamento semanal com o meu vizinho do lado. Vivíamos numa bolha, sem contactos, e então uma vez por semana fazíamos uma almoçarada e ficávamos a beber copos até não haver mais"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Conseguia sequer pensar em fazer música?
Zero. Se dependesse para fazer um disco da minha capacidade em confinamento, não tinha feito nada. Fiz duas músicas para anúncios. Duas encomendas. Coisa que nunca tinha feito antes.

E a que é que se agarrou? O que é que lhe deu força?
Aos livros e aos filhos, de 10 e 22 anos, que passaram o confinamento comigo. Já lia muito; passei a ler mais. Assim de memória, a biografia do Bruce Springsteen [Born to Run, editada pela Elsinore], a biografia do John Cleese [Ora, como eu Dizia, editada pela Planeta]. Gosto muito de Pedro Paixão, José Eduardo Agualusa, Valter Hugo Mãe, Dostoievski. Uma grande salganhada. Li um livro fantástico que se chama Sempre o Diabo, de um americano chamado Donald Ray Pollock, que retrata aquela América profunda e rural. Estou a ler um livro de crónicas de uma brasileira que adoro, que é a Clarice Lispector, Todas as Crónicas.

Filhos e livros. Mais alguma coisa?
Um desconfinamento semanal com o meu vizinho do lado. Vivíamos numa bolha, sem contactos, e então uma vez por semana fazíamos uma almoçarada e ficávamos a beber copos até não haver mais.

Sempre o convívio. Uma coisa importante para si.
A tertúlia. Gosto muito. Logo quando vim [de Beja] para Lisboa, em 2000, foi assim que fui conhecendo o ambiente mais ligado ao fado, os outros fadistas, os poetas populares. O José Luís Gordo, o Mário Raínho, o Jorge Fernando: ainda me lembro de os ver escrever poemas nas toalhas de papel. Íamos principalmente a uma casa de fados de Alfama chamada Bacalhau de Molho. Também foi assim que comecei a desenvolver a minha relação com a guitarra. Antes disso tocava muito mal.

Voltando ao álbum, como é cantar uma canção escrita por um filho [“Escutando o Universo”, de Diogo Zambujo]?
Sempre soube que ele tinha uma relação próxima com a música. Começou a tocar guitarra sozinho. Quando chega lá a casa, senta-se ao piano e começa a sacar coisas. Ouve muita música brasileira nova que eu também oiço: o Tim Bernardes, o Rodrigo Amarante, o Marcelo Camelo. Depois também me mostra coisas. É mais alternativo que eu. No verão, vai sempre para [o festival] Paredes de Coura. Mas a parte da composição foi uma surpresa.

Isso quer dizer que está no disco porque é seu filho? Foi cunha?
Não, não! Gostei muito da música. Numa dessas tertúlias lá em casa, mostrou-ma. Pensei logo que gostaria de a gravar, mas não lhe disse nada porque ele é super reservado. Lá ganhei coragem. Ele disse que ia pensar. No fim, ainda lhe disse que gostava muito que ele participasse.

"Tenho saudades de tocar em sítios pequenos. Acho que a malta deixou de me convidar porque acha que não vou aceitar. Agora o meu desafio é transformar o Coliseu num espaço desses, em que as pessoas se sintam em casa. Se pudesse ter público no palco, ainda melhor. Vamos ver."

De alguma forma será simbólico, é o único convidado.
É o meu filho. Aí já entra a parte do pai babado. É um orgulho grande. Mas está lá sobretudo por causa da música.

E em relação ao pai: quando é que o António Zambujo percebeu que tinha um dom?
Eu tenho um dom?

Posto de outra forma e agora sem rir: é uma coisa que a dada altura se percebe?
Não é sentir que se tem um dom; sentia que a música tinha um papel muito importante na minha vida. Desde miúdo. Tinha imensa facilidade em aprender os instrumentos. Sentia que nisso não era igual aos meus amigos. Pegava num acordeão, numa harmónica, num piano.

Era um prazer.
Dava-me imenso gozo. Ouvia uma música na rádio e sacava as melodias de imediato. Muito poucas pessoas sabiam que eu cantava. Era muito tímido. Estudei clarinete no conservatório. Tocava em bandas filarmónicas. Sempre sem cantar.

Só com a avó.
Com a minha avó cantava.

E ela não dizia, ‘Cantas tão bem. Devias cantar mais’?
Para a minha avó eu fazia tudo bem. Comecei a cantar quando ia sair com amigos, aí aos 15, 16 anos: músicas tradicionais, fados, muito Zeca Afonso. E aí a reação já me dava a entender que as pessoas gostavam. Mas quantas pessoas não há por aí que cantam bem? Isso não basta para ter uma carreira. E eu sabia que queria ser músico. Nunca me vi a fazer outra coisa.

Isso leva-nos de novo ao The Voice…
Mas eu a concursos nunca iria. Uma vez inscreveram-me num concurso de fados amador. Esses tais amigos, que aí foram amigos da onça. Ganhei o primeiro lugar, mas nunca senti grande interesse naquilo. E mesmo o interesse do The Voice é outro. O programa tem uma estrutura muito interessante: uma banda inacreditável; o Fernando Martins, que só na altura das provas cegas faz arranjos para mais de 100 músicas; aquilo a que a produção chama “vocal coaches”, a Isabel Campelo e o Tó Cruz, que fazem um trabalho impressionante com os miúdos. Depois é tudo tocado ao vivo, sem truques. E isso é que é o importante naquele programa. É usufruir do privilégio de ter pessoas tão boas ali à disposição.

Então e o António Zambujo o que é que sente quando sobe a um palco de mais um coliseu esgotado?
O que é que imagina que se sente?

Não faço ideia.
Uma alegria imensa. Deixei de sentir medo com o musical “Amália” [durante quatro anos interpretou o papel de Francisco Cruz, primeiro marido de Amália]. Muito graças ao Felipe la Féria, que para além de encenador e produtor é, na minha opinião, um excelente diretor de atores. Até de canastrões como eu consegue sacar alguma coisa. Guardo coisas importantes que ele me disse, incluindo essa, sobre a confiança que é preciso sentir quando se pisa um palco. Passando isso para a música, pensei, “o nervoso estraga-me isto”. E estar em cima de um palco de uma sala esgotada é um privilégio. Então, a partir do “Amália” passou a ser puro prazer. Acrescido de sentirmos que há pessoas que gostam de nos ouvir. O processo criativo de um artista é muito egoísta. Faço coisas de que gosto, que na minha cabeça funcionam. Não há uma visão comercial; há uma esperança, um desejo de que as pessoas gostem daquilo que faço. O mais importante é o que se canta. A mensagem.

"Muito poucas pessoas sabiam que eu cantava. Era muito tímido. Estudei clarinete no conservatório. Tocava em bandas filarmónicas. Sempre sem cantar"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Mas não escreve.
O meu núcleo duro de parceiros – o João Monge, a Maria do Rosário Pedreira, o Miguel Araújo, o Pedro da Silva Martins, a Luísa Sobral – escreve exatamente aquilo que tenho imaginado. Acabei por me acomodar um bocadinho. Também por incapacidade. Mas continuo a achar que é a parte mais importante. Ninguém ouve uma canção só por causa da voz bonita do artista.

Então e a melodia, a emoção, a intenção, as coisas que vão para além das palavras…
Óbvio. Mas o poema, sem dúvida, é o mais importante.

O primeiro concerto da digressão deste álbum é já dia 30, em Ovar. Seguem-se concertos no Campo Pequeno, em Lisboa, e na Super Bock Arena, no Porto. Ansioso por voltar?
Não ansioso, mas com muita vontade. Sinal de que estamos a conseguir resolver os problemas e – um pensamento mais egoísta – que vou poder voltar à vida que eu quero.

Tem cinco datas seguidas no Coliseu de Lisboa em Janeiro de 2022. Na pesquisa para esta entrevista, encontrei uma referência a um concerto na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, em 2013, um espaço pequeno e totalmente alternativo…
Foi tão giro esse concerto.

Imaginava-se na altura a encher coliseus de seguida?
Nunca imaginei nada. Tenho tido sempre surpresas boas. Espero continuar a ser surpreendido. Também tenho saudades de tocar em sítios pequenos. Acho que a malta deixou de me convidar porque acha que não vou aceitar. Agora o meu desafio é transformar o Coliseu num espaço desses, em que as pessoas se sintam em casa. Se pudesse ter público no palco, ainda melhor. Vamos ver.

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